17 de setembro de 2009

Lobito, Angola





Estas fotos foram tiradas por mim numa rua central do Lobito.
Uma das fotos, com a árvore pequenina na caleira foi tirada em Novembro de 1999. A outra foi tirada no mesmo local em Maio de 2009.
Parece que ao fotografar da primeira vez fui premonitório no que iria a acontecer!
A primeira foto ainda foi com máquina de rolo, a segunda já digital...


Fernando Pereira

O que interessa é a Associação! / Ágora / Novo Jornal/ Luanda/ 17-09-09



Quando titubeantemente, a então Republica Popular de Angola, dava os seus primeiros passos de uma independência sofrida, um grupo de portugueses cooperantes fundou no fim dos anos setenta, em Luanda a Associação 25 de Abril.
Eram portugueses progressistas, solidários e que partilhavam com os angolanos as dificuldades de um quotidiano de uma Luanda onde nada era fácil, e a frugalidade e a escassez andavam de braço dado.
Cadete Leite, Vasco Grandão Ramos, António Sousa Santos, Augusto Nelson Batista, Campos da Lito-Tipo e tantos outros, constituíram as bases de um projecto de intervenção cívica na comunidade luandense, e reconstruíram um espaço em ruínas, que se tem perpetuado, em frente ao portão da polícia nas traseiras da vetusta Lello.
Num bonito edifício de traça colonial do século XIX, com um pátio interior, entre paredes de pedra grossas, colunatas e madeiras exóticas, surgiu um local de encontro, um lugar de partilha e sobretudo um espaço de entusiasmo colectivo, pelos avanços de um País que teimosamente queria ser novo.
Era um local de boas tertúlias, em frente ao bilhar ou numa mesa com uma chávena de um descolorado café à frente, nas noites quentinhas de uma Luanda, que esperava calmamente o pôr do recolher obrigatório, que envolvia a cidade num manto de silencio.
Festas, folias, exposições, apresentações de livros ou só mesmo uma conversa, tudo se “apretextava” para nos deslocarmos à associação, onde os angolanos se sentiam em casa.
Eram tempos interessantes, e ainda hoje gosto de por lá passar, ver gente, comer e beber, e sentir que ali foi tudo construído com enorme voluntariado, quiçá mesmo militância em torno de valores de solidariedade e respeito entre comunidades que se estimavam.
Era para falar nesses tempos em que se importava pouco e importávamo-nos muito já que hoje, curiosamente importamos muito e importamo-nos pouco! Quando olhamos para uma blogosfera, para alguns locais em Luanda, em aviões, ou para os comentários quotidianamente feitos em praias e festas sobre Angola por parte de alguns portugueses e brasileiros, ficamos atónitos, tal a forma despudorada e soes como alguns escrevem, falam e publicitam Angola.
Tem total liberdade para o fazer, algo que se esquecem de referenciar, mas realmente acaba até por ser execrável ler e ouvir certa gente a falar do País que lhes mitiga a fome (desculpem o excessivo da expressão mas estou exasperado!).
Aos portugueses em Angola, não se lhes pede o que muitos portugueses fizeram pelo País, porque provavelmente tem uma formatação em que valores como a solidariedade e a militância, já não fazem parte sequer de um léxico quanto mais de uma prática quotidiana, mas pede-se-lhes algum comedimento, pois não é bonito insultar-se a casa de acolhimento, ainda que temporária.
Estão em Angola porque são precisos, e necessitam também de estar, por isso limitem-se a trabalhar já que são pagos para isso! Os cubanos, os chineses, os franceses, os russos e outras comunidades, trabalham tanto ou mais que os estrangeiros de língua veicular portuguesa, e não andam a inundar a blogosfera de que tudo que em Angola se passa é corrupção, miséria, nepotismo ou fartar vilanagem.
Este artigo é direccionado a um pequeno grupo de cidadãos lusófonos, não devendo tomar-se a nuvem por Juno, pois a crescente comunidade que fala português que escolheu Angola como País de trabalho, nada tem a ver com desvarios de alguns dos seus membros.
Vão até à Associação 25 de Abril, ali na baixa de Luanda e vejam que há coisas interessantes em Luanda, e esta sim, muito dignifica a lusofonia.

Fernando Pereira
14/09/09

11 de setembro de 2009

Os “Ficheiros” não são fixes!/ Ágora/ Novo Jornal/ Luanda 11-09-09



Na esteira do que tem acontecido com alguma frequência, acabou por dar à estampa um novo livro, sobre um tema estafado, e que é nem mais nem menos que uma obra menor, com um título pomposo: “Ficheiros secretos da descolonização de Angola”.
A autora, Leonor Figueiredo, inicialmente jornalista do sensacionalista “Correio da Manhã”, e depois do asséptico ” Diário de Notícias”, resolveu fazer um livro, onde ao contrário do que sugere o título, poucos “ficheiros secretos” aparecem, numa de muita benevolência nesta avaliação.
Avultam no livro depoimentos, a maioria dos quais já reproduzidas noutras obras de igual jaez, e alguns relatos de “pesquisas”, que em nada tem a ver com a realidade nalgumas circunstancias, fazendo nalguns casos lembrar o 007, feito pelo inimitável Sean Connery, indiscutivelmente o melhor James Bond de todos.
Há alguns depoimentos interessantes do general Heitor Almendra, esse sim actor importante, de uma determinada fase, da conturbada história de Angola de 1974/75, e a quem se pede, que publique um documento circunstanciado do que se passou nesses tempos, para acabar de vez com algumas hipóteses, que se tem transformado rapidamente em teses, tantas vezes hiperbolizadas.
As razões do aparecimento deste livro, surgem num depoimento da autora a um jornal: “Nunca tinha pensado em pegar no assunto, até que, há uns anos, começaram a ser publicados livros de fotografias de Angola e Moçambique. Eu fiz essa reportagem, e nessa altura, em conversa com a Zita Seabra [editora da Alêtheia], que procurava material sobre as ex-colónias, disse-lhe a brincar: ‘se eu algum dia contasse a história da minha família...’. Diz-me ela: “escreva que eu publico”. E esta pequena conversa veio abrir um cofre que estava fechado a sete chaves, há muitos anos. Nós não mandamos na nossa cabeça, não é? Saltou qualquer coisa e decidi: ‘vou escrever a história do meu pai.’ Eu sempre achei que nós, retornados, e eu odiamos esta palavra , fomos mal compreendidos cá. “. A realidade é que sobre o pai ao longo do livro, os depoimentos são poucos, e do que nos apercebemos é que o leitmotiv vai-se desvanecendo, à medida que o livro vai decorrendo, com partes que não sendo totalmente plagiadas de outras obras já lidas e referenciadas, acabam por ser mais do mesmo.
Um livro para esquecer, e só a grandiloquência do título pode levar algum incauto a adquiri-lo, pois de ficheiros tem muito pouco e de secretos absolutamente nada.
Já que faz afirmações sobre certas pessoas, desprovida de uma enorme sensatez, e nalguns casos até extraordinariamente lesiva do seu bom nome e probidade intelectual e cívica, pois conheço-as bem e há muito tempo, acho que não devo ser condescendente para com a autora.
Para quem leu o livro do Botelho, dos generais Gonçalves Ribeiro, Silva Cardoso e Amaro Bernardo, escusa de ler este, pois é uma síntese francamente má de todos esses.
Já que o assunto é presumivelmente livros, aconteceu-me recentemente passar num alfarrabista e comprei um policial da “Regra do Jogo”, editado em 1984, “A Morte do Artista”, de Artur Cortez, pseudónimo do escritor Modesto Navarro. Este policial tem a particularidade de ter no seu enredo, a versão romanceada do processo instrutório do “processo Kamanga”, que marcou a justiça angolana na primeira metade da década de 80.
Ainda no mesmo alfarrabista, adquiri um verdadeiro romance, com ficheiros secretos e morte à mistura, que pelos vistos tem escapado a tanto escriba, que de um momento para o outro apareceram qual cogumelos em caules de árvores. O livro chama-se Secret Mission: Angola, da autoria de um tal Don Smith, e foi publicado no longínquo 1970, editado simultaneamente pela Award Books em New York, e Tandem Books em Londres. Uma pérola sobre a “guerra fria” em África nos anos 60.
Houve alguém que disse, que só a abundância de livros maus, é que valoriza os poucos livros bons!
Fernando Pereira
7/9/09

4 de setembro de 2009

Trinca-Fortes (II) /Ágora/ Novo Jornal/ Luanda /4-9-09



Lembro-me como Camões foi ignobilmente tratado, pelas autoridades coloniais de Luanda no início da década de 70, e só corroboro o que António Lobo Antunes escreveu sobre as “horríveis estátuas de Luanda”, pelos vistos má tradição que se mantém, tendo em consideração a estatuária da Luanda actual.
Ao colocar no meio de uma miserável rotundazinha, numa peanha de 80cm, um Camões com 2,10m, muito magro, com uma bunda algo saliente, e com uma pena numa mão, umas folhas tamanho A4 na outra e uma coroa de folhas de oliveira na cabeça, que vista ao longe mais parecia um gorro de dormir, foi só gozar com o poeta maior da Lusofonia. Escusado será dizer que no olho uma “curitas”, sempre lhe daria mais dignidade que a pala que lhe puseram.
Este monumento, que era motivo da hilaridade geral da população, era conhecido em Luanda, pelo "Sinaleiro", e de facto foi de longe a pior homenagem que lhe poderiam ter feito, pois fizeram ali um "mix" entre um jogador da NBA, um bailarino do Bolshoi, um eunuco de um qualquer imperador e uma sacerdotisa vestal de Delfos. Hoje está num jardim no meio da fortaleza de Luanda, onde está o Diogo Cão à porta por não ter cabimento lá dentro, e com o rabo voltado para a cidade, numa atitude de embirração por o terem tirado defronte do Palácio de Vidro, ou o “palácio das mil virgens”como era conhecido no tempo colonial, o actual ministério do Comércio e Turismo, pelo inusitado número de mulheres que então por lá trabalhavam.
Voltando a falar de Camões, que segundo reza a história está sepultado no mosteiro dos Jerónimos, ao pé do notável absintista Fernando Pessoa. Ora Camões não "tinha dinheiro para mandar tocar um cego", frase que nunca foi tão oportuna, quanto mais para ir parar a um cemitério, e que anos mais tarde o fossem lá buscar para ir acabar nos Jerónimos! Duvidosa a versão, mas corrente e recorrente!
Consta a história que o rapaz era danado para as curvas, e um pouco por todo o lado foi semeando rivalidades e batendo-se por amores. Alguém achava que ele se iria meter em Macau a escrever numa gruta lúgubre? Obviamente, que para ele aquilo era a Gruta Garbo, pois era por lá que ele ia conhecendo e criando íntimos com ninfas, que eram parecidas com a Gretha Garbo, menos no Garbo. Ir para uma gruta, sem luz, um “semiótico” escrever com uma pena, era pedir para se acreditar demais!
Camões devia ser um gajo fixe, pois segundo se sabe das suas vidas paralelas gostava muito de vinhaça, e apesar de ser herdeiro de fidalgo, ele afinfava umas bebedeiras e inebriava-se com vapores carnais, um pouco tipo "vai a todas". E o maganão tinha jeito para o engate, como se prova o verso que fazia a todas, que lhe dava acrescidos favores nos seus engates.
Verdadeira referência para todos os lusófonos, pois escrevia, bebia, engatava, andava á cacetada e cantava. A imagem que perdura é muito diferente de tantas anedotas que a história pariu. Actualmente era considerado um devasso, um escritor marginal, um "terror" dos bons costumes, enfim um tipo, que só quando morresse, teria direito a que dissessem que tinha "morrido um homem bom"! O homem foi o verdadeiro "Corto Maltese", mas mais refinado que a personagem notável do Hugo Pratt, e só não foi o Fernão Mendes Pinto, porque o outro era a mitomania no seu máximo esplendor.
Sei que Luis Vaz de Camões foi sendo sucessivamente aproveitado ao longo dos séculos, pelos poderes ou pelos que contestatários, mas ninguém deixará de admitir que o que fez fê-lo magistralmente, e não deixa de ser o António Carlos Jobim do século XVI, século primeiro da globalização!

Fernando Pereira
22/08/09

2 de setembro de 2009

Trinca Fortes (I)/ Ágora/ Novo Jornal / Luanda/ 29/8/09



A Lusofonia tem as suas vacas sagradas, e admitamos sem rebuço que Luís de Camões é uma delas, já que é um dos símbolos maiores da escrita em língua portuguesa!
Não vou escrever sobre Luís Vaz de Camões, da forma hermética que o discurso oficial e oficioso da Lusofonia nos habituou, mas sim do verdadeiro "Trinca Fortes", com as características inerentes ao português suave de Fernão Mendes Pinto miscigenado com o Fado Tropical de Chico Buarque.
Da linguagem da filosofia, tentou-se criar uma ciência independente: "A Semiótica"! Realmente a primeira proeminente figura da Semiótica mundial foi Luís de Camões, ombreando com o Capitão Gancho e mais recentemente com o ex- ministro da defesa Israelita Moshe Dyan. O comum destes tipos era só terem um olho, ou apropriadamente dizerem, trazer tudo debaixo de olho!
Mas falando de Luís Vaz de Camões, que tem para aí dez terras a assumirem que nasceu por lá! Lisboa (os lisboetas só ainda não assumiram que o Pinto da Costa nasceu lá, porque ainda é vivo, e inevitavelmente daqui a 500 anos irão, de certeza fazer-lhe uma estátua e colocarem uma lápide numa casa a dizer:”Aqui presumivelmente nasceu Jorge Nuno de Lima Pinto da Costa, homem sério, vencedor como nenhum outro, incompreendido no seu tempo!”) Santarém, Coimbra, Constança, Porto, Linhares da Beira, outras e paradoxalmente no meio de todas Olhão, que presumo por um devaneio humorístico, pois só faltaria, terem dito, que o homem teria nascido no demolido bairro da Boavista em Luanda.
O Luís de Camões fascina-me em muitos aspectos! Começando pelo seu fim, ele personifica algum pechisbeckismo dos portugueses. Estar na miséria, e ter um escravo com nome económico, Jau, para mendigar por ele. Tinha uma tença, que revela bem que o problema das reformas é já um problema antigo, que não lhe dava para sobreviver, e vai daí arranja um escravo para cobrir alguma zona da cidade; Será que o Jau limpava as crinas dos cavalos com escovas quando paravam num sinaleiro, já que ao tempo semáforos só alimentados a carbureto ou a azeite? Esta de ter um escravo para pedir esmola é coisa grande!
Outra coisa que me fascina, é o facto de ele ter atravessado o mar da China, com os Lusíadas numa mão no meio da tempestade. Sinceramente era demais, sem um olho e só com um braço, o homem merecia uma toalha da GANT á chegada, um chá e uns scones quentinhos! Como ainda não havia a indústria da petroquímica, nem os derivados do petróleo, não se pensava sequer nos sacos de polietileno, para embrulhar o notável canto IX dos Lusíadas, que no Salvador Correia só um professor de português numa de clandestinidade ousou mencionar. Houve alguém que insistiu presumir, que todo esse episódio terá acontecido entre Tombwa e a Costa dos Esqueletos, provavelmente na foz do Cunene.
Já vem de longe, as faltas de apoio aos criadores e à cultura!
Outra coisa que me fascina é ele andar sempre metido com o olho pelas casadas, o que o obrigou a "ser olho por olho, dente por dente", prevalecendo no caso dele o “olho por olho”!
Deixo o “olho por olho” pois não faltaria muito para ser acusado de revelar alguma homofobia no que estou a escrever, fruto de leituras enviesadas que alguns fazem destes escritos.


(CONTINUA)

21 de agosto de 2009

Drogas, Sexo e Rock Roll/ Ágora / Novo Jornal / Luanda 21-08-09



Comemoraram-se neste início de semana, quarenta anos sobre a realização do festival de Woodstock, acontecimento musical marcante de uma geração que determinou que a partir daquele momento nada deveria passar a ser como antes!
Por obra e graça de um conjunto de cinco “candidatos” a empresários, que publicaram no New York Times e no Wall Street Journal, um anuncio que dizia literalmente isto: "Jovens com capital ilimitado buscam oportunidades de investimento legítimas, interessantes, e propostas de negócios". Montaram um esquema que proporcionasse a venda de bilhetes, em lojas de venda de discos em Nova York e pelo correio, para os três dias de festival.
Inicialmente as contas estavam feitas para 200.000 pessoas, o que já começava a ser demasiado para o pequeno espaço da cidade de [Bethel, onde se realizou o festival, que acabou por ser declarada “zona de calamidade publica”, pois acorreram 500.000 pessoas que derrubaram as cercas, e criaram embaraços enormes para a logística e apoio médico nos dias em que o festival foi decorrendo.
O festival inevitavelmente passou a gratuito, pois foi impossível cobrar o que quer que fosse, e acabou por ser o ponto culminante da contestação à guerra do Vietname, para além de ter constituído o maior marco referencial do movimento hippy, que acabou por marcar a alteração dos costumes dos anos setenta, e que não anteviam que pudessem ter surgido uns anos 80 tão cinzentos e conformistas.
Joan Baez, Arlo Guthrie, filho de Woody Guthrie, Ravi Shankar, Richie Heavens, Santana, Creedence Clearwater Revivel, Janis Joplin, The Who, Jefferson Airplane, Joe Cocker, Crosby, Still § Nash, Neil Young, Jimi Hendrix, Blood Sweet and Tears, foram só alguns das muitas bandas e músicos que desfilaram em 15, 16 e 17 de Agosto de 1969, naquela minúscula cidade que quase entupias as estradas do estado de Nova York, e que terá abanado as bases do conservadorismo cínico em que assentava a sociedade americana dos anos 60, herança de um maccarthysmo e da perseguição torpe a qualquer projecto liberalizante, de tendências vagamente conotadas com alguma esquerda, ainda que ideologicamente difusa.
Nada antevia que da geração de Woodstock viessem a sair alguns dos “jovens turcos” do Reaganismo, período marcadamente conservador, que terá sido uma resposta ao “desvario dos anos 60” como disse em determinado momento um conselheiro de segurança de Reagan, Oliver North, depois implicado numa obscura troca de armas em que envolvia o Irão e as forças que tentavam derrubar os Sandinistas na Nicarágua.
A propósito do falecido ex-presidente Ronald Reagan, lembro uma anedota interessante que era muito contada no epílogo da “Guerra Fria”, talvez actual q.b., tendo em conta a globalização e a circulação desregulada de capitais num capitalismo globalizado, que por acaso já teve outro nome mais em voga noutros tempos ainda não muito recuados: Imperialismo.
Reagan nunca perdeu o cabotinismo que sempre o caracterizou, como actor de filmes de segunda série, e volta e meia pegava no telefone vermelho e ligava a Brejnev, então todo-poderoso de uma União Soviética, que tentava afinar estrofes para os amanhãs que deveriam cantar, e que emudeceram ao primeiro safanão.
A conversa telefónica de Reagan era que estava a ter um sono em que o Kremlin, estava pintado de azul vermelho e branco, e onde estava hasteada a bandeira vermelha da foice, martelo e estrela, estava uma bandeira americana com 51 Estados ( a bandeira norte americana tem actualmente 50 estrelas). Brejnev não gostou da piada e no dia seguinte “ vingou-se” e telefonou a Reagan, dizendo que também tinha tido um sonho e que na Casa Branca estava definitivamente hasteada a bandeira vermelha com a foice, o martelo e a estrela. Reagan, porque tinha alguma fibra de cowboy, resolveu ligar na noite seguinte e disse a Brejnev, que concordava com o sonho dele no dia anterior, mas que ele também tinha sonhado que uma bandeira igual estava no alto da cúpula principal uma bandeira vermelha, com a foice, o martelo e a estrela, e Brejnev terá dito que não achava nada de extraordinário, pois era a bandeira que lá flutuava desde 1917, mas Reagan disse que em baixo estava escrito em caracteres chineses: Bem vindo à Republica Popular da China!
Desculpar-me-ão este devaneio, mas há dias em que as crónicas que temos que ir fazendo não saem assim tão bem, como comemorar quarenta anos de Woodstock mereceriam!
Fernando Pereira
17/08/09

16 de agosto de 2009

Passadeiras/ Ágora / Novo Jornal 14-08-09 / Luanda



Até há poucos dias nunca tinha ouvido falar de Iain Macmillon (1938-2006), mas quando no pretérito 8 de Agosto, uma imensidão de fãs, se deslocou à famosa passadeira de Abbey Road, para comemorar o quadragésimo aniversário do lançamento do último LP dos Beatles, fiquei a saber que a foto perene foi sua.
Em Londres, em frente ao estúdio de gravação, a passadeira de Abbey Road transformou-se na “zebra” mais conhecida do mundo, cenário simples da capa do último LP gravado pelos quatro de Liverpool.
Já que se fala de musica, por se “efermizar” quadragésimos aniversários, lembro ter tido a oportunidade de “telever” um dos programas de ruptura, no espaço televisivo português nos anos sessenta, o efémero mas sempre lembrado Zip-Zip.
Vivia circunstancialmente em Lisboa, e partilhava o entusiasmo possível de uma significativa fatia de telespectadores, que invariavelmente todas as segundas feiras de Abril a Outubro desse cada vez mais distante 1969, se juntavam aos magotes para ver um programa, que destoava claramente do cinzentismo criptofascista da cultura então prevalecente.
Eu era um adolescente, que gostava de música, e que tinha o privilégio de ter um hábito ganho precocemente, o da leitura, pelo que comecei a ver o Zip-Zip com um interesse enorme.
Neste programa, que o meu professor de português no Liceu Camões, o escritor Vergílio Ferreira, nos incentivou a ver com detalhe, comecei a conhecer muita gente que nem sonhava que existia, e cantores de que nunca ouvira falar e que nada tinha a ver com o nacional-cançonetismo, que animava o Portugal do Minho a Timor.
José Afonso que a 2 de Agosto faria 80 anos, já conhecia, pois tinha sido colega da minha mãe em Coimbra, embora o que cantou no Zip-Zip foi uma surpresa, e todo o conjunto dos chamados “baladeiros”, foram motivadores para passar a entrar noutros conceitos musicais.
Francisco Naia, Fanhais, Hugo Maia de Loureiro, Filarmónica Fraude, Duarte e Círiaco, Carlos Moniz, Manuel Freire, José Jorge Letria, Carlos Bastos, Julio Pereira, José Barata Moura e tantos outros que anos mais tarde deram tons e palavras a um libertador 25 de Abril de 1974.
Nesse programa de Fialho Gouveia, Raul Solnado, já falecidos, Carlos Cruz e José Nuno Martins surge um “baladeiro” de trinta anos, angolano, atleta do Benfica e do Belenenses, que faz a sua aparição no mundo da musica, e passou a ser a voz de Angola com maior notoriedade em Portugal. Rui Mingas, com uma camisola de malha clara, cantou Ixi Ami – Minha Terra, e o Teatro Villaret quase vinha abaixo, perante a estupefacção dos espectadores pela voz que acabava de ser revelada.
Foi a primeira vez que vi o Rui Mingas, e apesar da diferença dos anos se manterem, numa verdade do senhor de La Palice, continuo a admirá-lo como intérprete de excelência, para além de uma amizade e respeito que me habituei a aumentar a cada momento, lastimando apenas que a musica de Angola só o consiga ter a espaços muito prolongados no tempo.
Tanta vez trauteei a “Cantiga por Luciana”, entusiasmado pela versão de Rui Mingas, que é indiscutivelmente melhor que a de Evinha, vencedora do quarto Festival Internacional da Canção do Rio de Janeiro em 1969.
Rui Mingas, que há quarenta anos estava provavelmente longe de pensar que seis anos depois, iria partilhar com Manuel Rui Monteiro tanta coisa bonita, principalmente o hino que acompanhou a subida da vermelha, negra e amarela roda dentada, catana e estrela do Novembro de todo o nosso contentamento.
Atrasados, aqui ficam os parabéns para o Rui Mingas, que este ano comemorou quarenta anos do dia 12 de Maio de 1969, dia em que fez trinta anos!

Fernando Pereira
11/08/09

10 de agosto de 2009

Divagando/ Ágora / Novo Jornal/ Luanda / 7-08-09




Luanda nos anos cinquenta era uma cidade calma, mas com a estratificação social bem demarcada em todos os locais de trabalho, ócio, cultura e habitação.
A cidade tinha começado a desenvolver-se, com as receitas provenientes das súbitas subidas das cotações do café no mercado internacional, e começava a ganhar algum movimento, e a importar, ainda que de uma forma algo pacóvia algumas “modas”, assumindo a xenofilia dos costumes, hábito transversal à sociedade angolana desde há décadas.
No Largo ex-D. Fernando, hoje Rainha Jinga, em frente ao “megatéreo” que é a sede da Sonangol na Baixa de Luanda, em meados dos anos 50, era colocado um pano branco na Casa da Palmeira, como era conhecido o edifício da Lello, e à noite passavam desenhos animados, anúncios diversos e algumas revistas de actualidades. Foi a primeira experiencia de cinema ao ar livre na cidade, para a população, mas com uma duração efémera.
A Casa da Palmeira, ou o Palácio da Palmeira, como também era chamado esse imóvel magnífico que ainda se vai perpetuando na baixa de Luanda, por causa da palmeira de ferro que serve para tapar o saguão das escadas para os andares superiores, onde inicialmente houve uma pequena pensão de má qualidade. Tinha no telhado um reclame à pasta medicinal Couto e ao óleo Bardhall; Mais tarde veio a Pelikan e a Kodak!
Já que estamos por este Largo, neste passeio pela Luanda de gerações e olhando para o prédio onde funciona o Millenium (Angola), lembro-me de ter sido antes, o DOI do BNA, a Escola de Formação Bancária e antes de 1975, a sede do Banco de Crédito Comercial e Industrial, pertença do grupo Quina, a firma Martins e Macedo, representante em Angola de várias marcas de automóveis, lubrificantes, baterias e correlativos. Até aqui, ainda me lembro, mas já não sou suficiente velho para me lembrar da existência do Hotel Colonial, que foi demolido entretanto.
O edifício dos Correios lá se vai mantendo em recuperação, o que deixa alguma esperança no ar que o desvario camarteleiro ainda não tem rédea livre, e que o omnipresente valor de mercado, ainda esbarra com a assertiva disponibilidade para deixar intactos alguns edifícios que fazem parte da memória colectiva da cidade.
A Igreja dos Remédios, que de vez em quando vai levando uma lavagem, foi “despromovida” de Sé Catedral, mas ainda se vai mantendo como um espaço agradável no meio de tanto frenesim destruitório e construtório, que vai imperando à volta. Por acaso fui baptizado nessa Igreja, nos idos anos cinquenta, e convenhamos que só me lembro disso quando lá tenho que passar e esperar vinte minutos que o trânsito vá fluindo.
Se o imóvel onde tem funcionado a Sonangol, tem alguma dignidade e mostra um período marcante do desenvolvimento da cidade, a mastodôntica sede actual, não consegue fazer esquecer uma das mais bonitas montras de Luanda, que era a da Farmácia Dantas Valladas. No tempo colonial a pastelaria Gelo, deu lugar a um banco, o que prova que a indiferença pelo património não é causa de agora; Era um espaço muito bonito e com personalidade, e hoje, mesmo o Banco, que acabou com o Gelo, foi engolido por um dos prédios espelhado do centro da cidade.
Não consigo perceber, por mais que tentem, porque é que Angola, sendo uma terra de desafogo em território, tem que estar tudo concentradinho no município das Ingombotas. A bem dizer todos os ministérios lá estão, excepto o das Pescas.
Desculpem-me qualquer coisa, mas às vezes acho que em certos detalhes importantes não se consegue ultrapassar para além das Ingombotas!
Fernando Pereira
2/08/09

31 de julho de 2009

Tempo do Frias/ Ágora/ Novo Jornal / Luanda / 31-7-09



Como é o tempo do fresquinho, e como muita gente está de férias, nada melhor que um tema aligeirado, aguardando calmamente que “atrás dos tempos vem tempos e outros tempos hão-de vir”, como canta o Fausto, um homem do Huambo.
Numa recente viagem a Benguela, e depois de comer no “Olho”(!!!), um lúgubre restaurante junto à praia de Porto Amboim, e subindo em direcção ao morro Cambiri, veio-me à lembrança, uma discussão acalorada com o meu amigo Tchaveka, sobre a eventual importância desta baia no decurso da 2ª Guerra Mundial.
Tchaveka argumentava, mais com o argumento do pulmão, que teria havido um acordo secreto entre Roosevelt e Salazar, para que Porto Amboim fosse local de acolhimento da 7ª Esquadra naval americana, pois era a única baia no Atlântico com capacidade para albergar tamanha força. Admito que seja verdade que tenha havido este acordo, mas foi tão secreto que até hoje nunca ouvi falar dele a não ser pelo Tchaveka, não colocando em causa a sua verosimilhança. Mas não foi tão secreto assim, porque o Tchaveka tem-no divulgado insistentemente.
Este “acordo” traz-me à lembrança as histórias do Engenheiro António Frias, jogador de futebol da Académica de Coimbra na década de 40, que acompanhei nas tertúlias coimbrãs nos anos 70. O Frias era uma figura imponente, um autêntico cilindro de 2m3 de volume, onde acumulava entre gordura e órgãos um peso de 125Kg, a exigir continuadamente alimento e bebida a uma voracidade invulgar, a qualquer hora do dia ou da noite!
O Frias, contava histórias perfeitamente inacreditáveis, do tipo de certa vez jogar ao Campo do Lima no Porto, contra o Académico do Porto, com um sol azul, sem uma nuvem; Às páginas tantas, vem uma nuvem, em perfeito estilo de Hitchcok, com muitas gaivotas à volta, e mesmo por cima do centro do campo cai uma chuvada que interrompe o jogo, já que a chuva era de peixes, desde tainhas, douradas, carapau, pescada, corvina, enfim um verdadeiro “arrastão”! Contradizer o Frias não era fácil, já que o argumento físico era de peso e o mau feitio era um aliado conhecido.
O Frias, porque era um teimoso recorrente, resolve deixar a engenharia electrotécnica e passa para a engenharia militar, e ei-lo mobilizado em Angola para a tropa colonial.
Uma vez falava-se de Angola, e o Frias diz-me: “Você não percebe nada de Angola, sabe que Angola é tão rica que as solas dos sapatos se gastam numa semana, e os pneus dos carros em menos tempo?” Eu fiquei surpreendido e disse-lhe que nunca me tinha acontecido nada disso, e o Frias aos berros a dizer que em Angola a massa asfáltica misturava-se com pedras dos rios, que eram diamantes, que eram muito duros e nada resistia nas estradas e ruas asfaltadas recentemente! “ E sabe que o Rio Zaire é tão caudaloso, que até quarenta metros no oceano a água é doce?” “Sabe onde é que eu em Angola estrelava os ovos? No capot do Jeep!” “Uma vez em Angola estava a jogar a bola num aquartelamento, e rematei com tanta força que matei uma pacaça que estava a beber numa charca perto!” “Em Angola passávamos de carro em picadas, e ficávamos cinco minutos sem ver nada, e com o corpo cheio de pó de talco, que nalguns casos era perfumado!” País muito rico mesmo, que não se podia beber água porque sabia a petróleo”.
O Engº Frias era impagável, e certa vez pediu-me para lhe levar gindungo, e assim fiz; Mal abriu o saco pegou numa mão cheia, e valentão como julgava ser, pôs na boca, e o rosto ruboresceu, sem conseguir abri-la, nem dizer palavra em dez minutos, com todo a gente a gozar, já que era uma oportunidade única de nos rirmos do Frias à sua frente.
Desculpem este devaneio, mas não me apetecia escrever sobre outra coisa qualquer!

Fernando Pereira
26/7/09

Jornalismo de Angola de luto!/ Novo Jornal/ Luanda 31-07-09



Morreu aos 75 anos a jornalista Edite Soeiro.
Começou a sua actividade em 1950 num jornal de Benguela, “ O Intransigente”, tendo depois embarcado para Lisboa onde começa a trabalhar na Flama.
Da Flama, transita para a revista angolana Notícia, onde se torna a primeira mulher a embrenhar-se na mata e a acompanhar os soldados portugueses na guerra colonial, normalmente acompanhada pelo fotógrafo Fernando Farinha.
Quando falece abruptamente João Charrula de Azevedo, a Neográfica, empresa proprietária da Notícia é adquirida, ainda que com alguns contornos de mecenato, pelo industrial Manoel Vinhas, que decide renovar o parque gráfico e passar a publicar em simultâneo uma edição em Luanda, Lisboa e Lourenço Marques (Maputo).
A delegação de Lisboa vai ser chefiada por Edite Soeiro, tornando-se das primeiras mulheres a assumir lugares de chefia na imprensa portuguesa.
Corajosa, coerente e profundamente exigente consigo, e também com quem trabalhava, aparece na fundação da primeira empresa colectiva de jornalistas, a Projornal, proprietário do semanário “ O Jornal”, que depois deu origem à revista “Visão”, tendo sempre pertencido aos seus quadros e trabalhando com grande rigor, que lhe permitiu receber muitos prémios e louvores, o ultimo dos quais, o Prémio Gazeta em 2006, já então algo debilitada fisicamente.
Edite Soeiro entrevistou a poetisa Natália Correia para a Notícia, curiosamente uma entrevista que a censura deixou passar na íntegra em Luanda, mas que sofreu cortes na edição de Lisboa.
Luis Pacheco, cáustico com tudo e quase todos, teve em Edite Soeiro uma boa amiga e que lhe desculpou muito atraso e ausências nas crónicas do Notícia, sendo o único cronista que recebia adiantado.
A sua morte, como a do Júlio Guerra, do Acácio Barradas, deixam Angola mais pobre, porque deram muito a um jornalismo de causas e de rigor, num tempo em que fazer jornalismo em Angola obrigava a compromissos, algo que eles nunca aceitaram.
Não podíamos deixar de evocar esta triste notícia, que nos caiu num 27 de Julho de 2009.

Fernando Pereira 28/07/09

24 de julho de 2009

O Mato e o Morro /Ágora/ Novo Jornal / Luanda 24-7-09



Na Luanda colonial, ali para os lados do Prenda, havia um conjunto de ruas com uma toponímia no mínimo curiosa. Era a rua dos Funantes, que entrelaçava com a rua dos Sertanejos, e que por sua vez acabava na rua dos Empacaceiros (caçadores de pacaças).
O Funante, o Pombeiro (Pumbeiro ou Pumbuelo) e o Aviado faziam parte de uma estratificação “corporativa”, no contexto de determinado patamar da economia colonial até ao dealbar do século XX.
Conde de Ficalho sobre as relações entre o Pombeiro, o chefe de mercadores e o seu subalterno, o “Funante” dizia o seguinte: “…Outras relações mais sérias e úteis se começaram desde Noronha Montanha, montado em boi cavalo, acompanhado de intérprete, guia e carregadores logo a desenvolver… Negociantes portugueses, chamados Funantes, penetravam e penetram até ao coração de África, ou mandam ali emissários, denominados, na África Ocidental Portuguesa, aviados e Pombeiros e na oriental Moçambazes”.
O Funante estava sempre na mão do dono da feitoria, pois não tendo capital próprio, obrigava-se a aceitar as condições do dono da mercadoria, que impunha percentagens altíssimas, nada muito diferente das instituições de referência do capitalismo moderno, os Bancos.
Segundo António de Oliveira Cadornega, para “disciplinar” um comércio, que liberalizado não dava impostos ao reino de Portugal, em 1761, o governador António de Vasconcelos, obrigou-se a fazer alterações, limitando o negócio a cinco capitanias mores: Muxima, Massangano, Cambambe, Pedras de Mapungo e Ambaca.
Cresceu assim um tentacular comércio de mato, que muitos já conhecemos, e que foi a teia da perpetuação colonial em Angola, mas também foi o factor decisivo para a delimitação das actuais fronteiras do País, no âmbito da Conferencia de Berlim de !885, recomendando para o efeito uma leitura de um livro interessante, muito documentado, e com o rigor judrídico indispensável: “Aspectos da delimitação das fronteiras de Angola”, do professor da faculdade de direito da Universidade Agostinho Neto, Joaquim Dias Marques de Oliveira, editado pela Coimbra Editora, à venda em Luanda e no Lobito, onde aliás há uma belíssima livraria, a ocupar uma parte da estação do CFB.
Nesta passagem pelas figuras do tempo colonial, que andavam pela mata, havia um elemento fundamental, o Kambulador, um quase ilusionista, indivíduo de” insuspeita” oratória, hábil tocador de instrumentos musicais, e muito loquaz na procura de agradar ao chefe tribal. Hoje, podemos denominá-lo o que diz em gíria de forma depreciativa, o “grande artista”!
Associado a tudo isto surgem alguns termos adaptados ao negócio, e o que mais se tem perpetuado e passou a ser transversal a toda a língua portuguesa, é indiscutivelmente a Kandonga, que segundo a Enciclopédia Ilustrada Portuguesa de 1899 é “um contrabando de comestíveis, para os subtrair aos direitos de consumo”, sendo naturalmente um candongueiro, “homem que se emprega na candonga”, segundo o dicionário Lello de 1986.
Este artigo dá para muita coisa, e poderemos começar por aqui e escrever o que foi o comércio, os malabarismos, agentes, dependências, mixordices e por aí fora, não hesitando em pegar nalguns testemunhos de livros ou outros, principalmente do Dr. José Carlos de Oliveira, “ O comerciante do mato”, ou recorrer ao tributo do saudosos Raul David, Domingos Van Dunem e a Uanhenga Xitu, entre vários.
Quanto ao título, um devaneio brejeiro, que a tropa colonial usava sobre um mote de uma companhia qualquer: “Mato ou Morro”, que queria dizer que quando o inimigo estava no mato, eles iam para o morro, quando o inimigo ia para o morro, eles iam para o mato”
Havemos de trocar mais algumas ideias sobre o assunto!

Fernando Pereira
19/7/09

17 de julho de 2009

OBSERVATÒRIO DA MULEMBA / Ágora/ Novo Jornal / Luanda 18-7-09



“Este é um pequeno passo para o homem, mas um enorme salto para a humanidade”
Frase lapidar proferida em 20 de Julho de 1969, por Neil Armstrong,o primeiro homem a colocar o pé na lua.
Quarenta anos depois, a Terra e a Lua continuam à mesma distância, e as interrogações sobre o entusiasmo inicial do projecto e o seu crescente esmorecimento, vão permanecendo fora dos interesses quotidianos dos terráqueos. Por cá muito mudou, mas a realidade é que na Lua tudo parece estar calmo, a aguardar novas visitas e um renovado entusiasmo, pelo menos igual ao da Apolo XI, nave que levou os astronautas para a primeira abordagem ao “ mar da tranquilidade”.
Na Luanda serôdia desse final dos anos sessenta, sem emissões de televisão, o acompanhamento em directo desse acontecimento, só foi possível pela tenacidade de duas saudosas figuras: Sebastião Coelho e Bettencourt Faria.
Cúmplices durante muitos anos no programa de boa memória “Café da Noite”, onde Carlos Mar Bettencourt Faria tinha a rubrica “ O Cosmos em sua casa”( 1164 edições, até 25 de Fevereiro de 1975, fim do programa, por circunstancias conhecidas). O programa era emitido dos “Estúdios Norte”, num prédio hoje “premeditadamente” arruinado na Travessa da Sé.
Tive o privilégio de ter conhecido Bettencourt Faria, com ele ter convivido, e acima de tudo por me ter sempre fascinado e permitir-me toda uma série de sonhos e viagens exploratórias por um imaginário fértil de criança e adolescente. Era amigo do meu pai, e no cacimbo depois de um almoço domingueiro no Cacuaco a visita ao “Observatório da Mulemba” era uma quase rotina, a 13 km de Luanda, num tempo em que o controle da cidade era em frente à prisão.
A loquacidade e o entusiasmo de Bettencourt Faria eram extraordinários, e o que fascinava ainda mais era a forma como nos explicava tudo, quer no domínio da astronomia, astrofísica, mecânica, oceanografia, mineralogia, fazendo da “Mulemba” uma experiencia irrepetível. Tudo que era para mim entediante nas carteiras do Salvador Correia, era tão simples nas explicações do “cientista autodidacta”.
No cada vez mais longínquo 1969, Bettencourt Faria falou com Armstrong e Aldrin, nesse feito imperecível, que os luandenses tiveram o privilégio de acompanhar através de imagens sonoras, fruto da colaboração de B. Faria com a NASA.
Com uma enorme dimensão humana, despojado de todo o tipo de interesses materiais, avançadíssimo para a época, Bettencourt Faria aporta a Luanda aos 24 anos para trabalhar na Diamang. O seu “autodidatismo”, é motivo de ostracização por parte de alguns poucos “cientistas” da terra, o que não obstou que colaborasse com a NASA e simultaneamente com alguns astrofísicos da ex-URSS, e prova disso foi as experiencias partilhadas com o projecto Apolo e Sputnik, tendo neste caso, sido a Mulemba o único observatório africano a fotografar os sinais emitidos pelo satélite soviético.
Com muitas dificuldades económicas, B. Faria só recebeu uma vez o apoio de 500 contos da Gulbenkian, fruto do conhecimento que Mário António de Oliveira, ao tempo director da Fundação, que já o conhecia do Observatório João Capelo, onde o “ Wernher von Braun” angolano ia com frequência buscar livros, “que nalguns casos ninguém se tinha dado ao trabalho de abrir”.
Apesar de instado a dormir num local mais seguro, nos conturbados tempos do dealbar da independência de Angola, teimou em permanecer na Mulemba onde foi barbaramente assassinado em 4 de Julho de 1976, levantando-se no exterior um coro de comentários, em que o MPLA teria instigado o crime. Pura estultícia, já que o móbil do assassínio, foi comprovadamente motivado para assaltar um homem bom, de parcos haveres, mas de muitos saberes.
A comunidade científica angolana era muito pobre, e a morte de Bettencourt Faria fez que ela passasse a ser paupérrima, e neste quadragésimo aniversário da 1ª viagem do homem à Lua, fez-me bem relembrar o homem do “Observatório da Mulemba”, o lugar de todos os sonhos.
Angola devia recordá-lo mais vezes!

Fernando Pereira 11/07/09

12 de julho de 2009

Mas o pormenor mais suBreal…

Artigo retirado do blogue “subreal” de nome Aerograma
e de autor expatriado, além de “abuamado”  com a
versatilidade dos “dicúlos” da “banda” que o acolhe
e recolhe sem complexos nos amplexos dos kandandos.
 
Posted by Toke
Toke_Seixas_anim
 
 
 
 
 
 
 
Início de citação:
 
 
3 11 2008

Afonso Loureiro

Angola é um país de contrastes a todos os níveis. No meio da miséria vemos sorrisos abertos e crianças a dançar, ouvimos música e risadas. Por entre as valas, onde escorre o que já ninguém aproveita, há quem retire o seu sustento. No meio dos candongueiros ferrugentos surge um carro de vidros fumados e muitos cromados, pago a pronto em dólares. Na anarquia que é o trânsito, os semáforos são obedecidos e as passadeiras, largamente ignoradas, passam a ser respeitadas sempre que alguém estende a mão de fora da janela – crianças a atravessar!

Mas o pormenor mais surreal que encontrei até agora, é um programa de rádio inesperado. Na rádio Luanda Antena Comercial, há sete anos que é emitido um programa de uma hora semanal dedicado, imagine-se, aos Beatles! Um programa com sete anos é uma raridade em qualquer parte do mundo, especialmente com um tema tão específico. O certo é que, mesmo depois de esgotarem o reportório do quarteto várias vezes, agora passam gravações pouco conhecidas, concertos ao vivo e reportagem acerca dos Beatles todos os Sábados, das 18h às 19h.

O indicativo do programa é um excerto do Yellow Submarine e o programa tem o curioso nome de O Submarino Angolano.

Esta terra, definitivamente, não pára de me surpreender.

   Fim de citação.

;)

O Dia dos Prodígios (II)/ Ágora/ Novo Jornal/ Luanda 10-7-09




Na madrugada de 6 de Junho de 1944, por cima das nuvens ouviam-se o roncar de centenas de aviões, que levavam a primeira leva de pára-quedistas, e ao raiar do dia começam a encher-se os batelões que iam colocar os soldados nas praias.
Dos navios divisava-se mal a linha de costa, e só quando os primeiros batelões chegaram à praia, é que o ribombar da artilharia pesada alemã e as sirenes se começaram a sentir. A um ritmo frenético desembarcava-se gente, e veículos na praia de Omaha, onde se afigurava ser o local mais difícil, pois era uma praia escarpada, com falésias altas e defendida com uma bateria de canhões, e muito dependente de um bom trabalho de sapadores, que tinham de se aproximar perigosamente das trincheiras alemãs.
Eduardo, que há oito dias deixara de sentir as pernas, e com a cabeça à roda, chega à praia numa das últimas levas, com a praia já pejada de corpos, e numa altura em que a resistência alemã começava a fraquejar. Como não se aguentava muito nas pernas, agarrou-se a uns toros de madeira no areal, que acabaram por servir de resguardo perante o conjunto de explosões que se iam sucedendo ao longo da praia, onde um tenente de forma temerária, berrava para que só os “feridos e os mortos” ficassem na areia.
No dia anterior, Ed e alguns dos seus colegas mais próximos trocaram algumas coisas pessoais, para no caso de algum deles tombar, os outros levassem à sua família, em sinal de “qualquer coisa que nem nós próprios, sabíamos o porquê”, segundo esta sua interessante e imorredoira descrição.
Eduardo foi rendido dois dias depois numa vilazinha que me deslembro o nome, cinquenta Kms depois de Omaha, o verdadeiro cemitério das tropas aliadas, onde faleceram 4.500 soldados, e onde o famoso Patton gritava a plenos pulmões: “Façam das tripas dos alemães óleo para as lagartas dos tanques, com que os iremos derrotar”.
Passado um ano foi desmobilizado, e durante um mês e meio andou pelos EUA a levar pequenas coisas aos familiares de seus três colegas mortos em Omaha Beach, tendo-me dito de forma peremptória que foi a parte mais pungente de toda a guerra.
Quando há quinze anos visitou Omaha, a sua comoção foi tão grande que teve que ser observado num hospital próximo, prometendo nunca mais lá voltar.
Instado por mim a comentar o filme “The Longest Day”, baseado no testemunho do jornalista Cornellius Ryan, Ed disse que só no filme, que contém partes filmadas na própria batalha, se deu conta da imensidão dos meios envolvidos, porque “de facto naquele dia todos se sentiram sozinhos em cada momento do dia em que durou aquele inferno”.
Convém esclarecer que ainda hoje, esta invasão da Normandia é um golpe de enorme audácia militar de Dwight Eisenhower, contrariando o inglês Montgomery e o seu conterrâneo Patton, sobre os locais desembarque, e a estratégia inicial da ofensiva terrestre.
Há uma imensidão de livros, filmes, documentários, depoimentos, e outros documentos sobre a segunda guerra, mas não deixa de ser interessante o livro “A Europa em Guerra” ,1939-1945, de Norman Davies, editado pelas Edições 70, em que o autor descreve de forma descomprometida a guerra, o que pouco ou nada se escreveu sobre a guerra na Europa, pois eram alguns factos que não interessavam a historiografia dos vencedores, ou pelo menos não lhe foi dada grande importância, pois também não os glorificavam. Interessante obra!
Um pouco à margem disto, louva-se aqui mais uma posição corajosa do governo espanhol de Luis Zapatero, ao introduzir na “lei da memória histórica” a possibilidade de todos os sobreviventes da guerra civil que fizeram parte das brigadas internacionais, estrangeiros que combateram ao lado dos republicanos na Guerra Civil de Espanha, tenham direito à nacionalidade espanhola, tendo sido dada ordem para que todos os consulados espanhóis no mundo disponibilizem passaportes espanhóis a todos os que o requeiram.
Uma justíssima homenagem!
Fernando Pereira
7/06/09

4 de julho de 2009

Música angolana em Portugal nos anos 60.

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Sábado, 4 de Julho de 2009

Música angolana em Portugal nos anos 60

Foi um acontecimento histórico a actuação do conjunto angolano Ngola Ritmos (com Lourdes van Dunem na qualidade de vocalista) no único canal de televisão que havia em Portugal no já longínquo ano de 1964. Foi de tal modo histórico, que há em Portugal pessoas que ainda se recordam dessa actuação e do agrado que ela então lhes provocou.

Diversos cantores e grupos musicais angolanos vieram nesse tempo fixar-se em Portugal, com o fim de dar continuação às suas carreiras iniciadas em Angola. Ainda que fosse muito limitado, o meio musical português era, apesar de tudo, mais amplo do que o da Angola colonial de então. Assim, em busca de um maior êxito para as suas vidas, demandaram a capital portuguesa artistas como Sara Chaves, Eleutério Sanches, Trio Ouro Negro (que logo a seguir passou a duo) e outros mais. Quase todos estes artistas trouxeram consigo uma música de raiz angolana, sem dúvida, mas que eles mais ou menos adaptaram aos gostos e convenções então prevalecentes em Portugal e na Europa em geral, a fim de a tornarem aceite pelo seu novo público.

Talvez porque não tencionassem fazer carreira na metrópole colonial, os Ngola Ritmos fizeram precisamente o contrário. Na sua memorável viagem a Portugal, eles procuraram dar a conhecer ao público português a mais genuína música popular angolana, que eles faziam tão próxima quanto possível das suas raízes. Ao mesmo tempo, interpretaram canções portuguesas em jeito de semba, com resultados surprendentemente bons. A canção popular portuguesa "Margarida vai à fonte" foi uma delas.

Portanto, enquanto artistas angolanos radicados em Portugal aportuguesaram e europeizaram a música angolana, os Ngola Ritmos angolanizaram a música portuguesa... Excepção a esta regra foi a cantora Lilly Tchiumba, que sempre interpretou música angolana no pleno respeito pelas raízes desta. Depois que os Ngola Ritmos e Lourdes van Dunem regressaram a Angola, Lilly Tchiumba ficou sendo a voz mais genuína de Angola que se podia ouvir em Portugal. Cantou múltiplas vezes perante as câmaras da RTP, sempre com inteiro agrado do público. Alguns anos mais tarde, outras vozes se juntaram à sua, nomeadamente as de Rui Mingas e Bonga.




Lourdes van Dunem e o conjunto Ngola Ritmos em "Manazinha", uma peça do Carnaval de Luanda




Lourdes van Dunem e o conjunto Ngola Ritmos em "Mon'ami"


Depois do que escrevi sobre Lilly Tchiumba, seria de esperar que aqui aparecesse um video que a mostrasse cantando música angolana. Para minha grande estranheza, porém, não encontrei um tal video! Como escrevi acima, a Lilly cantou múltiplas vezes na televisão portuguesa. Com toda a certeza que haverá nos arquivos da RTP pelo menos uma gravação (uma só que seja!) em que ela interprete música angolana. Será possível que nenhuma delas tenha sido posta na Internet?! Na única gravação que encontrei dela, a Lilly Tchiumba canta uma musiquinha sem qualquer ponta de interesse, e que de angolana não tem absolutamente nada, num festival RTP da canção... Oh, sorte malvada!

Hesitei muito, mas acabei por decidir colocar aqui a referida gravação, apenas para mostrar como eram a cara e a voz da saudosa Lilly Tchiumba. Peço-lhes, por favor, que não se deixem influenciar pela gravação. Apesar do que nela se ouve, a verdade é que Lilly Tchiumba foi mesmo a voz angolana mais autêntica que cantou em Portugal na década de 60, à excepção de Lourdes van Dunem, é claro.



(Colocado por Denudado)




 
 
Posted by Toke

Pensar e Falar Angola

3 de julho de 2009

O DIA DOS PRODÍGIOS (I)/ Ágora/ Novo Jornal/ Luanda 3-7-09




Em 6 de Junho de 2009, Obama, Sarkozy, Gordon Brown, o príncipe Carlos e o primeiro ministro canadiano Harper, foram à Normandia, para comemorar os 65 anos do desembarque das tropas aliadas em França, que terá sido determinante para fazer inflectir a ocidente o desenlace da II guerra mundial e a concomitante derrota do nazismo.
Um parente meu, hoje com a provecta idade de 89 anos, e com a saúde debilitada, contou-me há 15 anos, todas as incidências do desembarque, ele que foi um dos bafejados pela sorte em “Omaha Beach”:” por sorte enjoei de tal forma, que quase não me consegui mexer, nos dias que precederam o desembarque, fiquei para o fim e safei-me”.
Eduardo Almeida tinha esperado e desesperado por uma carta de chamada para S. Tomé ou Angola, no fim dos anos 30 do século passado. Como essa carta não veio, órfão, o mais velho de uma família de uma prole grande demais para os escassos proventos que a casa tinha num Portugal salazarento rural e atrasado, fez-se à vida, e através de um familiar conseguiu visto temporário para os Estados Unidos, numa altura em que a única oportunidade que tinha para conseguir viver, era inscrever-se de imediato no serviço militar, e naturalmente adquirir a cidadania americana.
Assim o fez e foi para um campo de treino em Massachusetts durante um ano, sendo no fim enviado para um quartel algures no Reino Unido, perto de Bristol, integrado numa unidade de infantaria. Aí se manteve, entediado por não saber o que se lhe reservava o futuro naquela guerra, e também pelas circunstâncias daquele “barrete” de nevoeiro tão comum nas ilhas britânicas.
Em Abril, os exercícios intensificaram-se, e o tempo de repouso passou a ser mais curto, o indício claro que algo estaria para acontecer, e de facto em meados de Maio foram deslocados para Portland, um porto no Sudoeste de Inglaterra, onde estavam os barcos que os iriam levar às costas de França.
Nesta descrição minuciosa de Eduardo, ele terá dito que a primeira fase da guerra foi a mais dolorosa, porque nos 15 dias que estiveram nos navios, a maioria dos soldados enjoavam das oscilações, e os outros do nojo que era ver e sentir o permanente vomitado e não ver nada limpo. Barcos de passageiros e de carga transformados em dormitórios flutuantes, onde cada dia que passava era de desespero, para todos que sabiam que iriam para uma batalha decisiva.

(continua)

26 de junho de 2009

O LIVRO DO LICEU ESTÁ AÍ!

Diagnósticos/ Ágora/ Novo Jornal/ Luanda 26-06-09






Em Londres até à chegada de Murdoch à imprensa, a maior parte dos jornais estavam na Fleet Street, que marca o inicio da City londrina, o lugar mais importante da finança internacional. Foram entretanto deslocalizados para a periferia de Londres, e Fleet Street perdeu a aura doutros tempos, em que os jornais ainda se mantinham por amor à camisola por parte dos seus proprietários, jornalistas e tipógrafos. Não vou aqui perder muito tempo com isto, mas de facto em Luanda a rua rainha Nzinga, a partir do edifício da Bolsa, marca o inicio da Fleet Street angolana, pois acaba por ser o local onde se encontra a imprensa escrita de referência em Angola.
Tudo isto vem a propósito, de eu ter visto numa revista de um jornal que sai no mesmo dia do Novo Jornal, algo que me deixou completamente desconcertado. “Realizado por 3XU produções e por LS-republicano, o concurso que vai eleger a Garota Nacional Bumbum Dourado já teve três eliminatórias Benguela, Namibe e Huila”. Com algumas fotos, a maior parte delas de “traseira”, mostra a grande vencedora, também fotografada por “trás”, uma tal Iracema Bernardo, de Benguela que recebeu um cheque de 10.000 dólares. Desculpem mesmo qualquer coisinha, mas há aqui algo que não bate a bota com a perdigota, pois é degradante demais este espectáculo e acima de tudo que seja publicitado, ainda que de uma forma envergonhada. Tudo que é mesmo degradante e mau começa sempre de forma envergonhada, mas quando nada se opõe, o inverso é que passa a ser envergonhado. No tempo da independência, na sequência da luta de libertação, uma das causas mais caras a todos, passava pela emancipação e dignificação da mulher, mas como se foram perdendo alguns valores pelo caminho, desapetece-me alinhar com os que promovem até à saciedade os “bombons nas bumbuneiras de ouro”!
Passeando pelo ex-Bairro do Cruzeiro, hoje Bairro das colónias, ou das ex-colónias(??), continuando sem perceber muito bem porque mudaram o nome ao bairro, vejo com perplexidade numa esquina com a Rua da Guiné, uma placa que mostra a forma amadora, quiçá mesmo displicente, como se tem revisto a toponímia da cidade. Há uma placa recente, portanto a estafada desculpa pelo facto de se terem esquecido da placa da toponímia colonial, que diz textualmente Rua da Índia e entre parênteses a singularidade de Estado da Índia Portuguesa.
Socorrendo-me do Novo Roteiro de Luanda de 1964, sobre essa rua diz o seguinte: “Liga a Rua de Massangano à Rua de Moçambique” (2 colónias!!!). “Em homenagem à nossa Índia Portuguesa, descoberta por Vasco da Gama, em 20 de Maio de 1948 e campo de façanhas épicas praticadas por destemidos heróis, como D. Francisco de Almeida, D. Afonso de Albuquerque, Nuno da Cunha, António da Silveira, D. João de Mascarenhas, D. João de Castro, etc. Em Dezembro de 1961, foi-nos arrebatada pelo feroz e estúpido chacal da União Indiana. Não tardará porém o dia em que esta parcela da Pátria, tão regada com o sangue lusitano, volte ao redil nacional”
Por tudo isto, continuo a achar que a toponímia da nossa cidade capital mereceria mesmo uma discussão, e talvez fosse mesmo um tema que permitisse afirmarem-se sinergias que mobilizassem pessoas para os desafios que se colocam ao futuro de uma cidade com um identitário próprio, desejavelmente diferente do actual, mas com a necessidade de fazer prevalecer a simultaneidade de uma matriz africana e crioula de Luanda.
Desculpem hoje estar algo irascível, e colocar aqui alguns detalhes que podem ser de temas fracturantes, mas a realidade é que estou com tanta auto-estima que não sei se aguento.
Fernando Pereira
14/6/09

19 de junho de 2009

Diagnóstico/Ágora/ Novo Jornal/ Luanda 19/06/09



Com o advento do cacimbo, Luanda deixa de ir a banhos, e uns poucos vão procurando noutras latitudes encontros com outros banhistas, ou a verem se não levam banhos de alguns putativos investidores no País.
Desculpem este “intempestivo” intróito, mas vi um anúncio de umas casas numa urbanização a construir em Talatona, por sinal com publicidade aqui no jornal, que é só um exemplo entre muitos, que a massa crítica se começa a perder a um ritmo galopante, e que se aceita tudo mesmo, o que até já nos vai aviltando.
Esse anúncio promove uma casa “Estilo Europeu”, devendo nós considerar que só há duas alternativas na construção: o “Estilo Europeu” e o “Estilo Africano”, este ultimo cingindo-se a uma casa de pau a pique com paredes de adobe. Continuando o anúncio da empresa, com preços escandalosos, mesmo na escandalosamente cara Luanda, vemos umas fotos com muita verdura, riachos, lagos e piscinas, e nem sombra da terra vermelha de Luanda, e equipamento social por perto, pelo que é fácil prever, que também a terra das culturas do “tipo Europeu” serão importadas. Para rematar tudo isto apresentam-nos uma sala, do tipo mansão do sul esclavagista nos EUA, com uma lareira, algo que me parece indispensável na Luanda de hoje, quer pela agressividade do clima, quer pelo estatuto que um objecto destes dá ao seu proprietário.
Confesso que fiquei perplexo com a publicidade ao empreendimento, que me recuso a divulgar, mas que comparo em mau gosto, ao anúncio da UNITEL na TPA, em que um trajado de JEEP (Jovem Empresário de Elevado Potencial), numa secretária com poucos papéis, “viaja sonhando” em volta de um telemóvel, enquanto uma zelosa e fardada empregada, vai limpando com um espanador todo o escritório; Mau demais, mas talvez por isso a mensagem seja mais facilmente apreendida, que era o objectivo!
Como me dizia um bem instalado na vida conhecido meu, os fins justificam os meios, ou afinal ainda não estão tão longe os tempos, em que na TPA, uma jovem locutora dizia: “ Esta planta tem propriedades afro-asiáticas”, em vez de ter dito afrodisíacas.
Por falar em afrodisíacas, comprei no que vai restando da livraria Mensagem, um livro que tem sido passado de mão em mão, e motivador de conversas e leituras de pequenos trechos em tertúlias que frequento, que é nem mais nem menos que “Cartas para maridos temerários” de Dya Kasembe, e editado pela Nzila. Um dos grandes livros da “literatura de cordel” angolana, e que me parece um guia indispensável para todos que enfrentam ou venham a enfrentar situações difíceis. Simplesmente delicioso!
(Continua)

17 de junho de 2009

O Blog Realmente Aberto

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DomiNGO, 16 DE MARÇO DE 2008

Mon'Ami (Filho Meu), por Lourdes Van-Dunem


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Uma relíquia musical angolana, Mon'Ami, por Lourdes van Dunem e o conjunto Ngola Ritmos. Encontrada nesta página de athena.pallas.


A letra da canção, escrita em quimbundo, parece ser a seguinte:

Talenu ngó! O kituxi ki ngabange?
Talenu ngó! Maka mami ma jingongo!
Ngexile kyá ni an'ami kiyadi.
Nzambi k'andalê. Ngaxala ni umoxi.

Ngibanga kyebyê?! Ngaxala ngoê ni umoxi!
Ngibanga kyebi? O kituxi ki ngabangyê?!
Mona wambote wajimbirila.
Ngidila ngoê! Ngibanza ngoê! Ay, mon'ami!



Traduzida para português, ela diz mais ou menos o seguinte:

Vede só! Que pecado cometi?
Vede só! As minhas palavras de dor!
Já tive dois filhos meus.
Deus não quis. Fiquei com um.

O que faço?! Fiquei só com um!
O que faço? Que pecado cometi?!
Um filho lindo se perdeu.
Só choro! Só penso! Ai, filho meu!


(Transcrição e tentativa de tradução por Denudado)

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