11 de maio de 2013

BULLSHIT- O Interior 9 de Maio de 2013




Talvez por isso seja oportuno recordar as palavras de Ramalho Ortigão em 1873, nas “Farpas”.
«A Imprensa de Lisboa não tem opinião. Aqueles que dos seus membros que por exceção pressentem as ideias próprias, vivas, originais zumbindo-lhes importunamente no cérebro, enxotam-nas como vespas venenosas. É que a missão do jornalismo português não é ter ideias suas, é transmitir a ideia dos outros. Por tal razão em Lisboa o homem que pensa não é o homem que escreve. O jornalista nunca se concentra, nunca se recolhe com o seu problema para o meditar, para o estudar, para o resolver. Nunca procura a verdade. Procura apenas a solução achada pelo público dele, pelo seu partido político, pelos consócios do seu clube, pelos seus amigos, pelos seus protetores (...). O jornal não é uma fonte de crítica, de análise, de investigação (...) O jornalista é o aguadeiro submisso e fiel da opinião. Não dirige, não a corrige, não a modifica, não a têmpera (...). A Imprensa periódica é simplesmente o cano.»
Tenho mesmo que agradecer ao Ramalho Ortigão estas palavras, porque conseguem descrever de uma forma minuciosa e assertiva tudo o que pretendia dizer, e certamente embrulhar-me-ia em tretas (Bullshit) que acabavam por deixar os leitores perplexos, baralhados e a reafirmar que o jornal perde tempo a dar-me uns caracteres.
Porque hoje estou claramente em contramão, e porque faz sessenta anos que Vergílio Ferreira escreveu a “Manhã Submersa”, uma obra imorredoira do romance contemporâneo português, lembrei-me dele enquanto meu professor no Liceu Camões, em Lisboa, no distante 1968.
Como é habitual nestas circunstâncias, podia vir para aqui tecer loas ao homem de Melo, mas, na realidade, fiquei com uma péssima impressão do professor Virgílio enquanto meu professor de português, que tinha uma má relação com muitos colegas, um dos quais o neorrealista Mário Dionísio. Ao tempo um imberbe e um aluno sofrível, dessabia que aquele tipo seco, que eu não entendia, era um razoável brilhante escritor, de que só acabei por dar conta anos mais tarde. Recordo certa vez, na Guarda, termos conversado longamente, quando da sua presença no primeiro dez de Junho de 1977 em que foi instituído o “Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades”, onde a sua intervenção foi ofuscada por um arrebatador “Jorge de Sena”.
A realidade é que, quando se reformou do ensino, deu uma entrevista em que afirmou que nunca gostou de lecionar, fazia-o para sobreviver, e “sentiu sempre que nunca foi um bom professor”. Senti-me ressarcido das péssimas notas que me deu e só o desculpei porque me ajudou a ver com outros olhos algumas situações que tão bem descreveu.
Para que conste, falei do Vergílio Ferreira e não de qualquer outro Vergílio, nem tampouco o das “Éclogas” ou “Bucólicas”, que era de Roma e nada tinha a ver com Gouveia.

Fernando Pereira
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