30 de janeiro de 2009

Ganhar para o tabaco!/ Ágora / Novo Jornal / Luanda 30-01-09



A industria do tabaco foi a primeira de todas as industrias regulares de Angola.
Desembarca em Luanda José Jacinto Ferreira da Cruz , que já tinha enriquecido no Brasil na industria tabaqueira, tendo investido na primeira fábrica de tabacos de Angola, importando máquinas de Inglaterra, algum picado de Havana, e instalando-se numa casa alugada perto da Igreja dos Remédios.
Paralelamente a tudo isto, José Cruz, sabendo que na região de Golungo Alto havia uma excelente qualidade de Nicociana, planta do tabaco que se dá bem em todo o País, decidiu fazer aí uma plantação e simultaneamente estabelecer contactos com “fornecedores” locais, que consumiam um charuto artesanal de excelente qualidade, segundo relatos da época.
Consta-se também que no Bumbo, a 28 léguas do Namibe, para o interior havia uma extraordinária qualidade de tabaco, o que terá levado Henk Rink, mais tarde a fundar a Empresa de Tabacos da Huíla de efémera existência, por problemas com as autoridades coloniais.
Ainda sobre a qualidade do tabaco do Golungo Alto, há uma antiga referencia a uma “fábrica” em 1833, propriedade do soba local, Bango Aquitamba.
Um pouco lateralmente ao que aqui tem sido dito, o tabaco foi provavelmente dos mais cobiçados produtos ao longo de séculos, e causas de disputas acesas pelo seu fabrico e comercialização, tendo em conta que desde que passou a ser comercializado na Europa, qualquer poder político viu nele uma excelente forma de conseguir recursos financeiros regulares, à custa de impostos e resultados de concessões por períodos de tempo determinados.
Foi motivo de discussão na Revolução Francesa e levou à queda de alguns governos, pois a solução de “régie” que se impôs, era permeável a muitas influencias e subornos. Foi assim um pouco por toda a Europa e foi também de grande importância na queda da 1ª Republica portuguesa, já que Alfredo da Silva, dono da imperial CUF, tinha então sido preterido num contrato de concessão, tendo-lhe a ditadura atribuído a concessão, pelos serviços prestados a favor do golpe militar de 28 de Maio de 1926, nascendo então a “Tabaqueira”, depois ligada à SUT.
Voltando a Angola, assistimos em 1884 à compra por José Jacinto Cruz de um prédio virado para a Baía, actualmente em degradação acentuada, onde se instala uma fábrica a sério, onde trabalhavam trinta pessoas, com máquinas inovadoras de pique do tabaco, embaladoras, prensas, estufas e até uma tipografia para confeccionar as suas próprias embalagens.
Na enfadonha e provinciana Luanda desse tempo, este activo industrial não deixou de impressionar os comerciantes da urbe, que o destacaram para Presidente da Câmara, tendo sido ele a figurar no acto da inauguração dos trabalhos do Caminho de Ferro de Luanda e Ambaca (31 de Outubro de 1886), de que foi um dos promotores e entusiastas.
“Flor do Dande”, Picado “Holandez”, “Meio Forte”, “Repicado”, os charutos “Jacinto”, e uns cigarros sem nome vendidos em maços de 600g. Mais tarde apareceram o “Francês nº1”, “Estrella”, “São Rafael” e os “Hermínios” de boa memória.
A sua morte levou a uma situação de instabilidade, e o BNU exerceu uma hipoteca na fábrica, que depois de reaberta nas mãos de empresários da então Metrópole, deu origem à Sociedade Colonial de Tabacos (16 de Maio de 1916) e depois à FTU, que virou SUT até hoje, embora a “tabaquear “já noutro lugar.
Para além da FTU e da efémera empresa da Huíla, constituíram-se e continuaram a laborar a fábrica SITAL em Benguela, dos famosos Java, Baía e SL, e a ETA, empresa do industrial Ricardo Pires, conhecida pelo Coimbra e Senador.
A FTU, tinha o Swing, o universal AC, o Luanda e o Belmar, entre os famosos Francesinhos.
Para finalizar há uma história interessantemente do BELMAR, que quando apareceu, nos fins dos anos 60, foi-lhe logo colado a uma frase: Bairros Em Lisboa Mostram Angola Roubada!


Fernando Pereira
18/01/09

23 de janeiro de 2009

Efemerizando!!! / Ágora / Novo Jornal / Luanda 23-01-09



Em 15 de Janeiro de 1975, foi assinado entre o MPLA, UNITA e FNLA e Portugal o famigerado “Acordo do Alvor”, que Agostinho Neto sempre recordou como “Acordos da Penina”.
Gustavo Costa numa crónica recente neste hebdomadário, mostra alguma indignação por não terem sido chamadas “outras gentes” à partilha do poder na independência de 11 de Novembro de 1975.
È desnecessário estar aqui a refutar algumas das afirmações do Gustavo Costa, relativamente ao assunto, mas esqueceu-se do chamado “factor português” nas conversações, e a pressa de se resolver um problema que já vinha durando catorze anos, sem solução política e militar à vista.
As colónias sempre foram um factor de discussão abafada no quotidiano de Portugal e nos territórios por si ocupados, e procurava-se de todo, que toda a gente se fosse esquecendo delas, ou melhor que apenas uns quantos pudessem beneficiar.
Em 1931, no “Jornal” escreveu-se: “Para o futuro que antevejo para Portugal, as colónias não só não são precisas para nada como são um fardo”. Não foi preso o colunista porque era um beberrão, que as pessoas não davam grande crédito. Era Fernando Pessoa, provavelmente um dos maiores poetas da língua portuguesa.
Voltando a outros temas mais brandos, lembrei-me que Popeye fez oitenta anos. E. C. Segar criou este marinheiro, herói da BD e da “espinafrocracia americana”, que conseguiu que as mães americanas fizessem os seus filhos comer espinafres, aumentando o seu consumo, na ordem dos 30% na dieta alimentar dos estadunidenses.
A anoréctica Olívia Palito, sua eterna namorada, sempre disputada com o Brutus, um musculado de corpo e mente, de mau aspecto, que exigia a Popeye o recurso à dopagem: os espinafres.
As campanhas anti-tabágicas que já tinham obrigado o Lucky-Luke a alterar a sua imagem, obrigaram Popeye a largar o seu cachimbo, o que lhe terá retirado alguma piada, bem como refrear alguma da sua força, já que houve contestação por parte de pedopsiquiatras, sobre a violência de algumas das suas manifestações na tela.
Já que se fala em efemérides na BD, comemorou-se também recentemente os oitenta anos do primeiro aparecimento do famoso e controverso repórter “Tintin”.
O belga Hergé (Georges Prosper Remi (22 de maio 1907 - 3 de março 1983), o seu criador é um dos mais reputados da BD europeia, numa Bélgica de grande tradição na Banda Desenhada.
Independentemente da misoginia de Tintin, ou as sua discutida homosexualidade, uma das situações que me confunde é a sua extraordinária popularidade no Congo, pois a sua obra “Tintin no Congo” é eivada de um racismo, que de facto pode e deve ser considerado um dos livros de referencia no racismo, rivalizando num patamar de igualdade, com os filmes interpretados por Johnny Weissmuller, ou aquela versão esquisita da Agencia Portuguesa de Revistas do “Fantasma”, uma lusa criação do tipo “Homem Aranha” em plena selva equatorial, conhecido pelo “Duende que caminha”!!!
Já que hoje falei de tanta coisa diferente, porque não encerrar com algo que nada que tenha ver com o que já se escreveu: «Deixa-me falar-te sobre os muito ricos», disse um dia F. Scott Fitzgerald. «Eles são diferentes de ti e de mim.» Ao que Ernest Hemingway replicou: «Sim… Têm mais dinheiro.»!

Fernando Pereira
17/01/09

11 de janeiro de 2009

Há Livros e Livres!!! / Ágora / Novo Jornal /Luanda 9-01-09




Coincidindo com o fim do ano de 2008, acabei de ler um “tijolo” de perto de mil páginas, editado pela D. Quixote, de Jonatham Littel, “As Benevolentes”, livro que tenho vindo a citar nalgumas das minhas crónicas recentes.
Admito que foi um livro, que não me deixou indiferente, e a espaços criou-me mesmo sentimentos díspares e naturalmente confusos. É o primeiro livro que leio escrito por um dos “vencidos” da IIª guerra, e o que chega a ser pungente é a minúcia das descrições da brutalidade e das belezas nas envolvências, de alguém que passados estes anos todos está suficientemente bem consigo próprio, para nem hoje nem nunca ter pedido desculpa a quem quer que seja.
Em determinadas fases do livro, perplexamente reflectia sobre o que é que me levava a ler, uma descrição simultaneamente fria e também polvilhada de afectos mecânicos pontualmente. A verdade é que sem esforço lia, mas com o assumir, idiotamente diga-se de passagem, de algumas culpas perante os que levaram uma bala na nuca, ou que foram fuzilados perante os seus familiares, como o autor descreve com os pormenores mais sórdidos, mas também sem cupidez, cometendo todas as barbaridades por obrigação fundamentalmente, e na descrição com a convicção, que estava certo.
É também um livro da história do terceiro Reich, a sua esquizofrenia burocrática, que tentava esconder fraquezas, complexos e que servia objectivamente, para que nunca se permitisse que uma parca porção de duvida, pudesse em qualquer circunstancia, macular o discurso oficial fanatizado e com objectivos bem determinados, como tardiamente muitos deram infelizmente conta.
Saio da leitura das “Benevolentes” com mais taquicardia, e numa ou noutra descrição mentalmente nauseado, do que o autor, J. Littel, oficial das SS, que viveu calmamente até hoje para nos contar como foi do lado de Hitler, sem emoções, e com a convicção que era aquilo que tinha que se fazer, e nada havia para se arrepender.
Quem tiver oportunidade, leia o livro, nem que pontualmente chegue à varanda a encher o peito de ar, porque está perante uma obra imorredoira da literatura universal contemporânea.
No Natal, ou melhor no Dia da Família, como prefiro o 25 de Dezembro, recuperando uma designação, dos tempos em que Angola procurava a via para o socialismo científico, recebi um presente. Quem mo deu, fê-lo com o objectivo claro de me provocar, mas azar o seu, pois soube-me bem receber o livro do Jaime Nogueira Pinto, “Jogos Africanos”, editado pela “ Esfera dos Livros”, em Novembro de 2008.
Li-o, com um pouco mais de agrado do que tinha acontecido com outros dele, nomeadamente “A Direita e as Direitas”, editado pela Difel, numa altura em que ele, como eu ainda tinha muitas dioptrias nos óculos, em 1996, embora víssemos claramente que os caminhos que trilhávamos não era igual.
À medida que lia o livro do Nogueira Pinto, que o Ennes Ferreira, na sua ultima crónica do Expresso, compara com alguma piada e também com oportunidade, ao “Tintin no Congo” do belga Hergé, veio-me à memória os livros do Jorge Jardim e do Hugo Seia, para ficar por aqui.
O “Jogos Africanos”, é de facto um livro simpático para com a figura do Jaime Nogueira Pinto, e tenta não ser antipático com ninguém, o que só é uma virtude, por exemplo, para um dono de hotel e não para um politólogo, nova denominação no léxico da comunicação social, de umas pessoas sempre muito “bem informadas”, mas em que as coisas correm invariavelmente de forma contrária ao que comentaram.
Andou por muito lugar a recomendar paz e a apoiar líderes guerreiros para que se encomendasse a paz, sempre muito determinado nas suas convicções de homem de direita, temente a Deus, defensor do Império e grande defensor da paz e da ordem salazarista.
Já li o livro por vocês: Agradeçam-me, pois poupei-vos tempo!

Fernando Pereira
4/1/09
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