23 de fevereiro de 2008

Fidel ao demitir-se, absolveu a história!/ Novo Jornal/ Luanda










Fidel ao demitir-se, absolveu a história!


Aqui há uns anos, numa entrevista, ouvi o Guillermo Cabrera Infante, que entre uma panóplia vasta de críticas ao regime político cubano, teve a possibilidade de reconhecer algo a Fidel de Castro, que foi dizer apenas isto: “Fidel teve o grande mérito de devolver em 1959 a dignidade ao povo cubano”!
Fidel de Castro, enquanto líder máximo da revolução cubana, foi para muitos da geração que me antecedeu, um verdadeiro símbolo da libertação dos povos, e um pouco por todo o mundo, ele foi aparecendo sempre como a referencia para um mundo mais igualitário, mais justo e acima de tudo mais rebelde, para isso contribuindo a forma ousada, como ele desafiou o gigante americano, a pouco mais de cem milhas marítimas de distancia do norte da ilha de Cuba.
A minha geração herdou alguma desta forma de ver o mundo, embora partilhada com a do malogrado Che Guevara, cuja foto de Alberto Korda, se mantém hoje por todo o mundo, salvaguardando contudo que muitos já o enterraram definitivamente, “abjurando” um tempo que merece ser recordado, como algo do tipo “nostalgia do futuro”.
Para fazer este pequeno texto, resolvi ir aos meus canhenhos, e encontrei a “Novembro “ 4/6 de Fevereiro a Abril de 1977, que acompanha detalhadamente a visita de Fidel de Castro a Angola, de 23 a 30 de Março de 1977. Concomitantemente peguei no trabalho de Gabriel Garcia Marques, sobre a operação “Carlota” (que está disponível na web), e com a vivência do quotidiano de Angola desses tempos, só posso sentir reconhecimento, pela forma como Castro sempre tratou Angola. Sei que provavelmente o que estou a dizer, não colherá grande unanimidade, mas independentemente de opções políticas erradas, ou de resultados próximos desconseguidos, seria injusto não fazer a homenagem devida a alguém que não se ficou apenas pelo perorar, mas que soube dizer presente quando muitos diziam não, e alguns diziam nim!
O recentemente falecido escritor polaco, Ryszard Kapuscinski, no seu livro “Mais um dia de vida -Angola 1975” (provavelmente o melhor livro sobre a descolonização de Angola, reeditado recentemente pelo “Campo das Letras”) faz já uma abordagem à presença de instrutores cubanos em Angola, ainda uns meses antes da independência de Angola, o que revela bem o empenho que havia por parte do governo de Cuba na independência de Angola.
Na retrospectiva política da vida de Fidel, que os seus habituais ou neófitos detractores sistematicamente diabolizam, que apenas largaria o poder quando morresse (o quotidiano dos enganos), o que avulta é o da defesa do povo cubano e a instalação de um socialismo de características muito peculiares. È de se ter em conta que em 1959, 90% das terras aráveis eram pertença de companhias americanas, que 92% da população era analfabeta, que a mortalidade infantil era igual ao Haiti, Republica Dominicana e Salvador e o resto… Os números que hoje dispomos distribuídos por estruturas independentes dão-nos uma realidade diferente, e quando se compara Cuba, com os países da América central ou meridional, a situação dos chamados parâmetros globais de desenvolvimento, colocam-na com próximo de países desenvolvidos, e convenhamos que a comparação deve ser feita com México, Paraguai, Venezuela, Colômbia, Jamaica, no essencial países com um quadro colonial parecido e com desenvolvimento e estrangulamentos económicos e sociais, muito parecidos no ultimo meio século do passado XX.
Obviamente que o percurso de Fidel de Castro Ruz ao longo de sessenta anos de combate político, tem os seus pecadilhos, as suas omissões, os seus erros, mas tem também um histórico de muita convicção, muita habilidade política e muita coerência ideológica, o que lhe permite granjear simpatias e ódios, não concitando indiferença, o que sempre deu a Cuba uma visibilidade pouco compatível, com os números da sua população ou da sua expressão territorial
A revolução cubana foi a ultima revolução romântica da história, assim como a Guerra civil de Espanha foi a ultima guerra romântica! Há um denominador comum para além da língua e afinidades culturais: Talvez o enorme Hemingway, um amigo de Cuba e de Fidel, um voluntário na Espanha dos anos 30.


Fernando Pereira
21/02/08
Related Posts with Thumbnails