10 de julho de 2011

UMA VOLTA PELO BAFIO! / Ágora / Novo Jornal 181/ Luanda 8-7-2011






Às vezes empoleiro-me na estante, arriscando os meus volumosos e mal distribuídos 94kg também os 1, 87m de altura e talento e reencontro verdadeiras obras e desgraças do Espírito Santo, de quem não sou adepto nem tampouco temente.
Voltei a pegar no livro de Mugur Valahu, “Angola – Chave de África”, editado pela P.A. M. Pereira em Lisboa 1968.
Peço que desculpem o termo, mas o livro é uma verdadeira náusea no que às relações humanas e raciais respeitam.
Vamos por partes. Este Mugur Valahu nasceu em Bucareste em 1920 e faleceu no sul de França em 2003. Aos vinte anos, como membro da organização fascista romena da “Guarda de Ferro” , a "Orastie Libertatea", participa e é ferido na “Operação Barbarrosa”, nome de código da intervenção militar nazi na URSS durante a segunda guerra mundial, integrado como voluntário no exército de Hitler.
Em 1946, algum tempo depois da queda do pró-nazi Ion Antonescu, Mugur foge para em Paris onde começa um percurso de jornalista na Rádio Free Europe, BBC, Fígaro e France-Press, tendo conseguido a nacionalidade americana graças aos bons ofícios de uns quantos romenos exilados nos EUA, acolitados pelo arcebispo da Igreja Ortodoxa, Valeria Trifa, presidente da National Union of Romanian Christian Students, organização de legionários do regime romeno, e serventuário das “potencias do Eixo”
Mugur Valahu começa a descobrir uma vocação africana, emoldurada com muito dinheiro à mistura, e em 1961 ei-lo no Congo, mais propriamente no Katanga posteriormente Shaba, onde escreve um livro: “Aqui jaz o Katanga” (The Katanga Circus 1964). O livro eivado de racismo primário é sintetizado no comentário do “Pantera Cor-de-rosa”, o general colonialista Kaulza de Arriaga:”Os povos negros são, de todos os povos do mundo, os menos inteligentes”… “O perigo da civilização colonial vem dos negros evoluídos, mas graças a Deus nós não temos possibilidade de fazer evoluir todos os negros”. Já nem me preocupo em reproduzir as recomendações do K. “na necessidade de crescimento da população branca e na limitação da população negra através da limitação científica da natalidade”.
Mugur Valahu, um mercenário da caneta, do tipo Cascudo ( que foi assessor de imprensa da FNLA, depois de muitos trabalhos laudatórios para o CITA , de Alves Cardos, conhecido entre os jornalistas em Angola em meados dos anos sessenta pelo “Major Cabaça” (polido por fora e oco por dentro).
Ler este livro ou discursos, publicações ou opúsculos de Henrique Paiva Couceiro, Norton de Matos, Mousinho de Albuquerque é exactamente o mesmo no conceito que tem do africano, e no caso do angolano.
“O contacto com o branco mudou naturalmente os hábitos dos negros, que muitas vezes tiveram que trabalhar a chicote. Há pessoas que perguntam certamente por que motivo os portugueses recorreram no passado ao trabalho obrigatório, e hoje ainda recorrem á disciplina dos contratos. É que se os deixassem viver à sua moda frugal, sem nada fazer, a maioria do tempo, os Negros de Angola, e também dos outros países, viveriam na ociosidade”…”Foi pois o branco que, com as suas tentações, os veio tirar do seu torpor” (SIC).
Outra pérola sobre a actividade psico-social do exército colonial numa determinada fase da guerra em Angola: “ Se o negro nos rouba qualquer coisa, é preciso censurá-lo abertamente e reclamar a restituição do objecto; nem ele se sente atrapalhado se for apanhado com a mão dentro da algibeira do próximo. Se, pelo contrário aceitamos as suas negativas, as suas mentiras, não hesitará em falar de nós como de imbecis que se deixam facilmente intrujar”(SIC).
Este livro, hoje uma raridade não é uma obra para se esquecer, é acima de tudo só e apenas mais um documento do que foi um passado em Angola há quarenta anos e qual era a ideologia prevalecente, no contexto de um tempo que muitos não se coíbem de dizer com total desfaçatez que nem foi mau de todo!
Parece descabido neste arrazoado de mentalidades bafientas falar de Ernest Hemingway, mas relembramos que fez cinquenta anos se suicidou na sua casa de Ketchum no Idaho (2 de Julho de 1961). Terá sido um dos melhores de sempre, e que no Velho e o Mar deixa esta frase: «o homem não foi feito para a derrota», «um homem pode ser destruído mas não derrotado.».

Fernando Pereira
30/6/2011
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