12 de fevereiro de 2013

Nada se passa enquanto nada se passar / O Interior / 13-2-2013 / Guarda




Num destes dias, no decurso de umas imagens do Portugal a seguir ao 25 de Abril de 1974, dei comigo a refletir no que se alterou nestes quase quarenta anos de democracia cada vez menos plena e cada vez mais desparticipada.
O poder foi partilhado invariavelmente pelos três partidos do chamado “arco da governação”, que ideologicamente pouco diferem uns dos outros, permitindo-me até afirmar perentoriamente que, no essencial, são iguais e as ténues diferenças acabam por aparecer no que é residual, e onde efetivamente fazem o espetáculo da polítiquice para gáudio das TVs e da extensa comunidade de achólogos, tudólogos que inundam painéis de comentadeirice.
Não vou entrar em pormenores ou fulanizar o que quer que seja, que é um hábito adquirido para criar cortinas de fumo para que não haja a veleidade de se discutir o essencial, que tem a ver sobretudo com o modelo económico, a degradação do sistema produtivo do País e, acima de tudo, as sucessivas crises do capitalismo que cada vez tem os seus ciclos de recessão com mais frequência e por períodos mais longos. As consequências são bem visíveis num País que mergulhou num perigoso estado de ansiedade política e descrença, permeável a que, neste constante nevoeiro, emerja um Sebastião qualquer providencial a quem teremos que agradecer por nos dar pancada e pôr na ordem.
Para avaliar as diferenças entre as manifestações de há trinta anos e as de hoje, o que podemos comparar é que, nas do PREC e anos seguintes, quem aparecia com evidência eram os operários da Lisnave, Sorefame, Siderurgia, Setenave, Quimigal, do sector dos têxteis, do sector mineiro, acompanhados por camponeses e rendeiros, gente do comércio e de alguns serviços, estudantes, etc. que não era mais um conjunto de centenas de milhares de pessoas enquadradas em diferentes sectores e com ideias bem definidas de solidariedade, justiça e desenvolvimento económico. Estes representantes dos sectores de atividade eram o que se chamava a estrutura produtiva do País, e este conjunto de pessoas trabalhava numa economia com debilidades estruturais, mas que representava muito no tecido social e económico português.
Passados trinta e muitos anos, as manifestações passaram a ter funcionários públicos, reformados e desempregados de longa duração e as reivindicações deixaram de ser pela estabilidade das empresas, pela participação dos trabalhadores nos sectores determinantes da sociedade portuguesa, e assistimos, impávidos e serenos, ao estertor final do magro tecido empresarial português porque a Europa assim o quis e sempre teve por cá quem se prestasse a esse papel sem abjurar o que quer que fosse. Revelado está aqui nas manifestações que há cada vez menos produção nacional e cada vez mais gente dependente de um Estado insuportávelmente obeso.
Portugal tem mais recursos que a maioria dos países europeus, mas também tem a subserviência, para não ousar dizer venalidade, em aceitar sempre tudo que é imposto de forma a manter as pessoas quietinhas e submissas, a olhar para um PSI que em tempos se utilizava para chamar um táxi no meio de uma rua, e que hoje regula uma coisa que se chama pomposamente de “mercado”, onde apenas se vêem empresas prestadoras de serviços ou os sacrossantos bancos .
«A moeda única é um projeto ao serviço de um diretório de grandes potências e de consolidação do poder das grandes transnacionais, na guerra com as transnacionais e as economias americanas e asiáticas, por uma nova divisão internacional do trabalho e pela partilha dos mercados mundiais.
A moeda única é um projeto político que conduzirá a choques e a pressões a favor da construção de uma Europa federal, ao congelamento de salários, à liquidação de direitos, ao desmantelamento da segurança social e à desresponsabilização crescente das funções sociais do Estado.»
Resolvi, propositadamente, colocar primeiro a citação com que grande maioria das pessoas concorda, mas quem a fez em 1997 foi chamado de radical por dizer o que hoje é racional, e sectário por dizer o que hoje é consensual.
O enorme respeito que lhe tenho pela sua probidade intelectual e seriedade política, obriga-me a citar Carlos Carvalhas, ao tempo SG do PCP, numa “interpelação do PCP na Assembleia da República sobre a moeda única”.
Fernando Pereira
7/2/2012
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