19 de abril de 2008

Dar Asas à Memória I/ Ágora/ Novo Jornal/ 18 Abril 2008




Dar Asas à memória (I)

Este artigo vai ser por episódios, por limitações inerentes à paginação do jornal, e porque resolvi dar uma volta a uma Luanda de outros tempos, que eu não vivi, mas que tento reproduzir de conversas que fui ouvindo ao longo de anos, em muitos lugares onde se passei e fui retendo imagens e sons para “memória futura”, que aqui tento reproduzir.
Começo pelo primeiro “aeroporto” de Luanda .Foi o “Aeródromo Emílio de Carvalho”, que teve inicialmente uma pista de aterragem de 600 metros, em macdame, que segundo diziam os aviadores dos Dakotas do fim dos anos 40, era apenas um lugar de “talvez”, pois eram imprevisíveis os resultados do aterrar ou levantar das aeronaves com segurança. Para além de ser uma pista “liliputeana”, havia o acrescido perigo com os buracos, não porque estivesse permanentemente esburacada, mas porque a pista teria sido construída sobre um antigo cemitério, o que permitia que não raras vezes o avião, ficasse com rodas do trem de aterragem dentro dessas covas com quase 2 metros de profundidade, o que naturalmente levantava problemas gravíssimos para a substituição pronta de peças.
Na “Linha Imperial”, nome que o general Humberto Delgado hiperbolicamente designou a rota aérea, pelas então colónias portuguesas em África, a TAP teve necessidade de passar a operar com o avião Skymaster, e houve necessidade de construir paralelamente á pista existente, uma outra de 1000m, em que este tipo de aviões pudesse operar sem grandes problemas.
Este “Aeródromo”, tinha as suas instalações no local onde hoje está instalada a Unidade Operativa Central dos Bombeiros, onde ainda se pode ver o que resta do hangar. A pista ocupava o terreno onde hoje se encontram alguns edifícios governamentais, escolas, pelo que o espaço aeroportuário era entre a Avenida Comandante Gika e a“Tourada”.
Era a cidade do “Comboio-bébé”, que percorria lentamente a marginal até à Igreja do Cabo, os “maximbombos” do Crista, o “batelão”, a loja do “Simão”, a tresandar a fuba, o “Catonho-Tonho”, vendilhão de anzóis, os gasolinas da “Carolina” nas “portas do mar”, a “Ponta da Mãe Isabel”, hoje Porto de Luanda, o Largo da Mutamba, com o seu caramanchão de buganvílias lilazes, a secular mulembeira, que albergava os táxis do “Costa Leite”, enfim dos tempos de uma cidade de salubridade duvidosa, pequenina, maneirinha e maldizente.
O coreto da Portugália com o Sambo a tocar, a lagoa do Kinaxixe, e a sua mulembeira, onde o velho Carmona tinha a sua máquina “a la minute”, que era nem mais nem menos que um balde, umas molas, um banco, uma corda, bem um equipamento que anos mais tarde foi substituído pela Polaroid, e que a digitalização arrumou em jeito de desforra desses fotógrafos que até fato e gravata tinham para fazer “o boneco”. Era a cidade das barrocas da “Companhia Indígena”, os “poços da Maianga, onde melhor era representada a estratificação social, pois havia o poço do rei, e a Maianga do Povo, mas que em determinada altura ambos esgotaram as suas reservas, dado o crescimento populacional da cidade. Hoje restam as ruínas no meio do casario, uma ali na subida do Catambor e outra na subida do Prenda.
De forma marginal, e aqui nas minhas confabulações com quem me lê, não deixa de ser para mim uma questão que pretendo ver desenvolvida, que é o facto de Luanda ser das poucas cidades capitais em África que não tem um rio no seu perímetro urbano!!!
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