4 de maio de 2012

QUEM VÊ CARAS NÃO ESCUTA VOZES.../ Ágora / Novo Jornal 224 / Luanda 4-5-2012


A geofinança esmaga a geoeconomia, e a comunidade internacional chama geopolítica à antipolítica, que tanto mata repúblicas como não deixa renascer a república universal. Por outras palavras, há uma inversão de valores. É na Europa e no mundo.
Esperemos que a legitimidade regresse. A estrela do norte da política sempre foi a justiça e, sem esta medidas, não há democracia, porque não há liberdade sem igualdade e ambas, sem fraternidade. É urgente repolitizar o Estado e os Estados, em síntese, o mundo. De outra maneira, virão os despotismos. Sobretudo os privados, aqueles que já clandestinamente nos condicionam e proíbem.
Há dias, o Gustavo Costa indignou-se, e justificadamente, com a utilização abusiva de uma parte da Escola Nzinga Mbandi para casamentos, batizados e outras farras. Acho que as escolas têm que ser preservadas, e não devem recorrer a expedientes deste tipo para conseguir recursos destinados a preservar e remodelar instalações e material pedagógico. Em 1961, o espaço que foi o Liceu Guiomar de Lencastre (que não sei quem foi) e que é o Liceu Nzinga Mbandi (que sei quem foi) foi o local que alojou os primeiros militares em Abril de 1961, quando chegaram a Angola e se começou a construir o Grafanil. Na altura estavam em curso obras terminais para a instalação da escola, que só abriu como liceu feminino no ano letivo de 1962/63. Aqueles corredores, salas e ginásio continuam a acompanhar a “história”.
Recupera-se periodicamente a história da Ilha de Páscoa, território chileno com cinco mil habitantes, a maior parte deles idos do continente. A ilha de Páscoa é famosa pelas suas inúteis estátuas. Num filme, Rapa Nui, contava-se a história dos Moai, povo que, vindo da Polinésia,se tinha instalado na ilha, onde desenvolveu uma civilização. As gigantescas estátuas de pedra, património da Humanidade certificado pela UNESCO, eram construídas como oferendas a divindades e, naturalmente, para serem transportadas até ao seu destino final onde estão esculpidas, houve necessidade de abater árvores para as arrastar desde a pedreira. Esse foi o princípio do fim dos Moai, segundo o filme que afinal corrobora a opinião da maior parte dos investigadores. Em determinada altura começaram algumas tribos a digladiar-se com o objetivo de atingir a supremacia de uns sobre os outros, e cada um dos vencedores ia fazendo estátuas maiores para oferecer às divindades. A guerra acabou, provavelmente por falta de guerreiros, míngua de árvores e de Moai em número suficiente para obter os favores ou aplacar as fúrias dos sempre silenciosos deuses. As árvores eram mais necessárias que os Moai, mais férteis, e ofereciam sombra e abrigo contra os ventos oceânicos. Sem elas, depressa os solos se degradaram e a ilha ficou desértica. O ecossistema da ilha foi destruído e acabou para se revelar insuficiente para alimentar a população de dezenas de milhares de pessoas. Quando os primeiros europeus ali aportaram, num qualquer domingo de Páscoa, encontraram pouco mais de dois mil habitantes, depauperados fisicamente, sem a grandeza dos Moai, que acabaram por legar ao futuro uma ilha deserta, inóspita e habitada por continentais que vivem do turismo, a sua única fonte de receita. As doenças que os europeus trouxeram acabaram com o que restava dos Moai, porque os habitantes não tinham defesas para elas.
Esta história estava para ser contada quando se comemoraram os dez anos de paz em Angola, mas houve outras de maior atualidade, e esta só hoje aqui coloco.
Tambien, como la tierra yo pertenezco a todos.
no hay una sola gota de odio en mi pecho.
Abiertas van mis manos esparciendo las uvas en el viento
Pablo Neruda

Fernando Pereira 1/5/2012
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