26 de junho de 2009

O LIVRO DO LICEU ESTÁ AÍ!

Diagnósticos/ Ágora/ Novo Jornal/ Luanda 26-06-09






Em Londres até à chegada de Murdoch à imprensa, a maior parte dos jornais estavam na Fleet Street, que marca o inicio da City londrina, o lugar mais importante da finança internacional. Foram entretanto deslocalizados para a periferia de Londres, e Fleet Street perdeu a aura doutros tempos, em que os jornais ainda se mantinham por amor à camisola por parte dos seus proprietários, jornalistas e tipógrafos. Não vou aqui perder muito tempo com isto, mas de facto em Luanda a rua rainha Nzinga, a partir do edifício da Bolsa, marca o inicio da Fleet Street angolana, pois acaba por ser o local onde se encontra a imprensa escrita de referência em Angola.
Tudo isto vem a propósito, de eu ter visto numa revista de um jornal que sai no mesmo dia do Novo Jornal, algo que me deixou completamente desconcertado. “Realizado por 3XU produções e por LS-republicano, o concurso que vai eleger a Garota Nacional Bumbum Dourado já teve três eliminatórias Benguela, Namibe e Huila”. Com algumas fotos, a maior parte delas de “traseira”, mostra a grande vencedora, também fotografada por “trás”, uma tal Iracema Bernardo, de Benguela que recebeu um cheque de 10.000 dólares. Desculpem mesmo qualquer coisinha, mas há aqui algo que não bate a bota com a perdigota, pois é degradante demais este espectáculo e acima de tudo que seja publicitado, ainda que de uma forma envergonhada. Tudo que é mesmo degradante e mau começa sempre de forma envergonhada, mas quando nada se opõe, o inverso é que passa a ser envergonhado. No tempo da independência, na sequência da luta de libertação, uma das causas mais caras a todos, passava pela emancipação e dignificação da mulher, mas como se foram perdendo alguns valores pelo caminho, desapetece-me alinhar com os que promovem até à saciedade os “bombons nas bumbuneiras de ouro”!
Passeando pelo ex-Bairro do Cruzeiro, hoje Bairro das colónias, ou das ex-colónias(??), continuando sem perceber muito bem porque mudaram o nome ao bairro, vejo com perplexidade numa esquina com a Rua da Guiné, uma placa que mostra a forma amadora, quiçá mesmo displicente, como se tem revisto a toponímia da cidade. Há uma placa recente, portanto a estafada desculpa pelo facto de se terem esquecido da placa da toponímia colonial, que diz textualmente Rua da Índia e entre parênteses a singularidade de Estado da Índia Portuguesa.
Socorrendo-me do Novo Roteiro de Luanda de 1964, sobre essa rua diz o seguinte: “Liga a Rua de Massangano à Rua de Moçambique” (2 colónias!!!). “Em homenagem à nossa Índia Portuguesa, descoberta por Vasco da Gama, em 20 de Maio de 1948 e campo de façanhas épicas praticadas por destemidos heróis, como D. Francisco de Almeida, D. Afonso de Albuquerque, Nuno da Cunha, António da Silveira, D. João de Mascarenhas, D. João de Castro, etc. Em Dezembro de 1961, foi-nos arrebatada pelo feroz e estúpido chacal da União Indiana. Não tardará porém o dia em que esta parcela da Pátria, tão regada com o sangue lusitano, volte ao redil nacional”
Por tudo isto, continuo a achar que a toponímia da nossa cidade capital mereceria mesmo uma discussão, e talvez fosse mesmo um tema que permitisse afirmarem-se sinergias que mobilizassem pessoas para os desafios que se colocam ao futuro de uma cidade com um identitário próprio, desejavelmente diferente do actual, mas com a necessidade de fazer prevalecer a simultaneidade de uma matriz africana e crioula de Luanda.
Desculpem hoje estar algo irascível, e colocar aqui alguns detalhes que podem ser de temas fracturantes, mas a realidade é que estou com tanta auto-estima que não sei se aguento.
Fernando Pereira
14/6/09

19 de junho de 2009

Diagnóstico/Ágora/ Novo Jornal/ Luanda 19/06/09



Com o advento do cacimbo, Luanda deixa de ir a banhos, e uns poucos vão procurando noutras latitudes encontros com outros banhistas, ou a verem se não levam banhos de alguns putativos investidores no País.
Desculpem este “intempestivo” intróito, mas vi um anúncio de umas casas numa urbanização a construir em Talatona, por sinal com publicidade aqui no jornal, que é só um exemplo entre muitos, que a massa crítica se começa a perder a um ritmo galopante, e que se aceita tudo mesmo, o que até já nos vai aviltando.
Esse anúncio promove uma casa “Estilo Europeu”, devendo nós considerar que só há duas alternativas na construção: o “Estilo Europeu” e o “Estilo Africano”, este ultimo cingindo-se a uma casa de pau a pique com paredes de adobe. Continuando o anúncio da empresa, com preços escandalosos, mesmo na escandalosamente cara Luanda, vemos umas fotos com muita verdura, riachos, lagos e piscinas, e nem sombra da terra vermelha de Luanda, e equipamento social por perto, pelo que é fácil prever, que também a terra das culturas do “tipo Europeu” serão importadas. Para rematar tudo isto apresentam-nos uma sala, do tipo mansão do sul esclavagista nos EUA, com uma lareira, algo que me parece indispensável na Luanda de hoje, quer pela agressividade do clima, quer pelo estatuto que um objecto destes dá ao seu proprietário.
Confesso que fiquei perplexo com a publicidade ao empreendimento, que me recuso a divulgar, mas que comparo em mau gosto, ao anúncio da UNITEL na TPA, em que um trajado de JEEP (Jovem Empresário de Elevado Potencial), numa secretária com poucos papéis, “viaja sonhando” em volta de um telemóvel, enquanto uma zelosa e fardada empregada, vai limpando com um espanador todo o escritório; Mau demais, mas talvez por isso a mensagem seja mais facilmente apreendida, que era o objectivo!
Como me dizia um bem instalado na vida conhecido meu, os fins justificam os meios, ou afinal ainda não estão tão longe os tempos, em que na TPA, uma jovem locutora dizia: “ Esta planta tem propriedades afro-asiáticas”, em vez de ter dito afrodisíacas.
Por falar em afrodisíacas, comprei no que vai restando da livraria Mensagem, um livro que tem sido passado de mão em mão, e motivador de conversas e leituras de pequenos trechos em tertúlias que frequento, que é nem mais nem menos que “Cartas para maridos temerários” de Dya Kasembe, e editado pela Nzila. Um dos grandes livros da “literatura de cordel” angolana, e que me parece um guia indispensável para todos que enfrentam ou venham a enfrentar situações difíceis. Simplesmente delicioso!
(Continua)

17 de junho de 2009

O Blog Realmente Aberto

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DomiNGO, 16 DE MARÇO DE 2008

Mon'Ami (Filho Meu), por Lourdes Van-Dunem


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Uma relíquia musical angolana, Mon'Ami, por Lourdes van Dunem e o conjunto Ngola Ritmos. Encontrada nesta página de athena.pallas.


A letra da canção, escrita em quimbundo, parece ser a seguinte:

Talenu ngó! O kituxi ki ngabange?
Talenu ngó! Maka mami ma jingongo!
Ngexile kyá ni an'ami kiyadi.
Nzambi k'andalê. Ngaxala ni umoxi.

Ngibanga kyebyê?! Ngaxala ngoê ni umoxi!
Ngibanga kyebi? O kituxi ki ngabangyê?!
Mona wambote wajimbirila.
Ngidila ngoê! Ngibanza ngoê! Ay, mon'ami!



Traduzida para português, ela diz mais ou menos o seguinte:

Vede só! Que pecado cometi?
Vede só! As minhas palavras de dor!
Já tive dois filhos meus.
Deus não quis. Fiquei com um.

O que faço?! Fiquei só com um!
O que faço? Que pecado cometi?!
Um filho lindo se perdeu.
Só choro! Só penso! Ai, filho meu!


(Transcrição e tentativa de tradução por Denudado)

Posted by Toke

15 de junho de 2009

O Canto Livre de Angola

ÁGUA FRESCA... PARA IDEIAS COM SEDE...

O Canto Livre de Angola, uma relíquia


Xê minino, posso morrer
Já vi Angola independente!

Tive a felicidade de poder assistir, em São Paulo, ao espectáculo da embaixada de músicos angolanos que se deslocou ao Brasil em 1983, e cuja apresentação no Rio de Janeiro deu origem ao disco O Canto Livre de Angola, que em boa hora o Toke nos permite ouvir.
                                                                                              Por Ana B.

13 de junho de 2009

Foi assim, foi muito mais do que assim ! (II parte)/ Ágora/ Novo Jornal/ Luanda 12-06-09



Lembro na Académica o hoje insigne causídico, Diógenes Assis Boavida, que jogou entre 1950 a 1952, antigo ministro da justiça da Republica Popular de Angola, num longo período.
Com o eclodir da greve académica de 1962 em Coimbra, na esteira da contestação aos efeitos do célebre decreto 40900, que andava em bolandas desde 1956, que limitava os direitos associativos dos estudantes, a Académica tem pela frente mais um desafio, num apelo à solidariedade com a luta contra a proibição da comemoração do Dia do Estudante, e à perseguição, destituição e prisão de estudantes presos.
Os jogadores da Académica deixam de treinar, algo que acontece duas semanas, um jogo é adiado “à força”, e o estádio é ocupado pela polícia. O ministro adia o jogo entre a Académica e o Beira-Mar, mas começava a ser um braço de ferro difícil de manter pois a intransigência dos jogadores era grande, na defesa dos seus eleitos, entretanto substituídos por uma comissão administrativa nomeada de contornos políticos claros de alinhamento com a extrema-direita salazarista.
O jogo seguinte era contra o Sporting, e a dimensão de um adiamento iria naturalmente ter outras proporções, pelo que o capitão Mário Wilson é chamado à comissão administrativa, onde se lhe pede para que a Académica jogue dois dias depois desse 18 de Maio de 1962. Ele diz que tem que falar com os colegas, que aceitam jogar, embora mantendo o protesto. Nessa noite, Daniel Chipenda (que tinha vindo do Benfica), França (que tinha vindo do Sporting), e o moçambicano José Julio, fogem de Coimbra já com a PIDE no seu encalço, levando também Araujo a seguir o mesmo caminho uns dias mais tarde.
Todos conhecemos os seus percursos enquanto cidadãos e militantes anti-colonialistas. José Araujo( jogou de 1958 a 1962), doutorou-se em geologia na Universidade de Berlim, e depois da independência foi Director Nacional de Geologia e Minas e durante muitos anos presidente do Comité Olímpico de Angola. Daniel Chipenda (jogou de1958 a 1962), com todo um percurso militar e político conhecido, acabou por falecer em 1996, depois de ter desbaratado um capital político enorme, conseguido numa luta armada onde foi brilhante comandante. António França (jogou de 1960 a 1962), hoje general Ndalu, foi membro do bureau político do MPLA, e é hoje um bem sucedido homem com um capital político assinalável, e boas relações no mundo dos negócios. Ndalu ainda representou a selecção cubana de futebol em jogos internacionais.
Para este artigo, que terá algumas omissões e quiçá mesmo algumas pequenas inverosimilhanças, é uma pequena homenagem e a lembrança de que foram gente com carácter e de posições políticas coerentes “dos pés à cabeça”.
Já agora a título de curiosidade, foi a Académica que venceu a 1ª Taça de Portugal, ao vencer o Benfica, em 25-6-1939, com vitória por 4-3.
Este artigo foi feito com recurso a testemunhos de várias pessoas que fui conhecendo, a histórias ouvidas e repetidas, e a ajuda preciosa do magnífico livro do meu saudoso amigo João Mesquita, jornalista que nos deixou há meio ano, que em colaboração com o professor João Santana, fizeram um livro de título “Académica, a História do Futebol”, editado pela Almedina.

Fernando Pereira30/05/09

5 de junho de 2009

Foi assim, foi muito mais do que assim! (I) Ágora / Novo Jornal / Luanda 5-6-09




Houve final da taça de Portugal, e o “meu” Futebol Clube do Porto ganhou!
Não é por causa da vitória do Porto que hoje vou escrever, porque se o fizesse cada vez que os “Dragões” ganhassem era crónica sim, crónica sim, e a coisa monotonizava-se.
Há quarenta anos, houve talvez a final mais importante de todo o desporto português, e como dizia o saudoso Carlos Pinhão, a final de 1969 foi transformado “num dos maiores comícios de sempre contra a ditadura”. “No topo do Jamor, as bandeiras da Briosa e os cartazes de incentivo a esta, alternam com dísticos onde se pode ler: 'Ensino para todos'; 'Melhor ensino, menos polícias', 'Universidade livre'”, e na tribuna do estádio, nem sinal do Chefe de Estado, nem do então ministro da educação, o historiador José Hermano Saraiva, entidades que era habitual comparecerem por motivos protocolares.
Os jogadores da Académica, entraram em campo com as capas descaídas sobre os ombros, solidários com a luta que se desenvolvia em Coimbra, e no topo sul do estádio um imenso pano negro, com o emblema da Associação Académica e uma tarja branca por cima, claros sinais de luto académico.
Como toda a gente dizia antes do jogo, o resultado era o que menos interessava, mas o golo do Eusébio que deu a vitória ao Benfica, permitiu mais uma vez que o regime respirasse de alívio, pois a vitória da Académica teria aumentado a contestação.
Eusébio não percebeu o que se passava nesse jogo, que até à última da hora esteve com o espectro da falta de comparência dos “estudantes de Coimbra”, estando o Sporting de prevenção, numa clara demonstração do alinhamento dos clubes de Lisboa para com o regime do Estado Novo. Não houve transmissão televisiva, de forma a não ampliar a dimensão da manifestação. “Sabíamos que transportávamos o futuro nas camisolas e tínhamos a consciência que estávamos a dar visibilidade à crise”, disse José Belo, então defesa da Académica.
Citando o incontornável jornalista Batista Bastos, “foi assim, foi muito mais do que assim”, podemos dizer que de facto o jogo não interessava mesmo nada.
Já que se fala da Associação Académica de Coimbra, e da sua secção de futebol, devo aproveitar o ensejo para falar de outros conterrâneos nossos que por lá passaram, e que participaram também noutras lutas, que a nós angolanos nos dizem mais respeito.
Apesar de na Académica terem jogado muitos angolanos, ao longo de anos e em períodos diferentes desde o antigo director do “Jornal do Congo”, Borja Santos, Serra Coelho, Couceiro, o meu amigo Manuel de Faria Vieira Lopes (Manecas), estes já falecidos, Torres (obstetra reformado em Coimbra), Camilo, Raul Águas, Garnacho, Alberto Cruz, Prado, Manuel Maria Inácio, Óscar Almeida , Akwá, e outros, há um conjunto de uns quantos, que se notabilizaram na libertação de Angola e no seu dealbar organizativo enquanto país independente.
Dizia o Dr. Eduardo Macedo dos Santos, falecido em 2001, que “tinha ganho o curso de medicina com estes” enquanto apontava para os dois pés. Obviamente que nunca o vi jogar, já que ele entrou na 1ª equipa da Académica em 1946/ 47, e deixou o clube no fim da época de 1952/53, com o curso de medicina concluído, e deixando uma saudade enorme entre os seus colegas de equipa.
O Dr. Eduardo Macedo dos Santos, que tive o gosto de acompanhar nas lides desportivas, enquanto ele ocupou o cargo de presidente da FAF, aliás primeiro presidente, tinha detalhes deliciosos, como o de rejeitar liminarmente qualquer antigo guarda-redes para treinador de uma equipa de futebol, com o argumento que “enquanto jogador só percebia de táctica até aos quatro jogadores que estão à sua frente, os defesas, porque o resto do campo não via” ou que “ festejava um golo sozinho” ou ainda que “para ele o zero zero era um resultado perfeito, pois tinha cumprido a sua parte do trabalho”.
Era uma pessoa aguerrida, loquaz, de convicções fortes, extraordinariamente fiel aos seus princípios, um dos primeiros do MPLA, fundador com Hugo de Menezes o CVAAR- Centro Voluntário de Assistência aos Angolanos Refugiados, onde integra outros médicos angolanos, como Manuel Videira e Edmundo Rocha.
Homem de roturas, quando ele as julgava necessárias, sem andar a escolher os momentos “politicamente mais apropriados”, acabou por integrar a “Revolta Activa”, o que lhe valeu alguns amargos de boca, em momentos em que o radicalismo era quotidiano político de um MPLA, numa busca obstinada de uma matriz de referência política e ideológica, ainda hoje pouco afirmativa. Médico pessoal de Agostinho Neto, primeiro director da faculdade de medicina da Universidade de Angola (depois Agostinho Neto), cardiologista emérito, foi embaixador de Angola na fase final de” uma vida sempre em luta contra as defesas contrárias”, como já acontecia nos seus tempos da “Académica”.

(CONTINUA)
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