13 de outubro de 2017

Outro regresso do Conde de Abranhos / O Interior 13-10-2017



Outro regresso do Conde de Abranhos

“A ideia também muda a pele, como a serpente”
            Guerra Junqueiro

            Finda a efervescência eleitoral, amansados os egos e guardados os pregos, repõem-se a modorra em que cai a politica local nos tempos seguintes ao pleito eleiçoeiro.
            Eça de Queiroz, na sua verve imorredoira, deixou-nos figuras picarescas que se vão perpetuando no tempo e no quotidiano político do País.
            Uma das facetas, sem dúvida das mais curiosas, da ironia de Eça, é a que se refere ao nosso país, quer ridicularizando a megalomania histórica de alguns portugueses, quer pondo em evidência a imbecilidade e incompetência dos homens públicos, quer ainda criticando a mesquinha vida portuguesa, como a politiquice, a falta de organização, a tacanhez de pensamento, etc., tudo isto consequência direta da malformação educacional cívica da população.
            Do “Teodoro Raposo” da “Relíquia”, ao “Castanheiro” da “Casa de Ramires”, ao “Pacheco” de “Fradique Mendes” ou ao “Conde de Abranhos” da homónima obra  e outros, todos são ridicularizados e transformados em picarescas personagens pela verve corrosiva de Eça de Queiroz.
            Vou-me reter no traçado caricatural do Conde de Abranhos, que singrou admiravelmente, mesmo nas marés mais encapeladas, mercê duma forte dose de manha e espantosa facilidade de adaptação.
 Com efeito desde a adolescência, Alipio Abranhos manifestara abertamente a tendência para aquilo que se define por “não olhar a meios para conseguir os fins”.
            Trabalhava como advogado no escritório do Dr. Vaz Correia, amigo do “Desembargador Amado”, homem tão tacanho de inteligência quanto era desmedido em nutrição e fortuna, que vivia com permanente apreensão perante as ofensivas de Alipio a sua filha, e assim pudesse deitar mão à rica herdeira de seus milhões.
            Ultrapassada essa fase através de um hilariante episódio descrito na obra, em que a manhosice de Abranhos vingou, levando a noiva e o seu dote ao altar, o Conde atirou-se a novos “empreendimentos” e ei-lo destravado numa Lisboa onde o País sempre foi o centro, o interior, o litoral e tudo o resto.
            O seu comportamento na vida política foi uma sucessão de expedientes melífluos, traindo infamemente os partidos a que pertenciam adotando toda a sorte de sofismas, acobardando-se nos momentos precisos, procurando enfim, explorar os primores das suas falsas qualidades de grande génio.
            O certo é, porém que chegou a ser deputado e, mais tarde, como remate de tão brilhante carreira política, ministro da Marinha.
                Sic transit gloria mundi
            Uma homenagem singela aos Abranhos  portugueses!
                        Fernando Pereira
                        7/10/2017
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