19 de junho de 2015

INSINCERAMENTE / Ágora/ Novo Jornal / Luanda /18_6-2015




“O pessimismo da razão e otimismo do coração” Gramsci (1891-1937)

Não. Definitivamente. As bruxas não existem. Não sou supersticioso. Não acredito em azares. Não me preocupo com a sexta-feira, seja treze ou qualquer outro dia do mês. Não entro com o pé direito, não como passas às badaladas do novo ano e nunca me preocupo com o facto de ter de passar por baixo de escadas. Não me preocupo se derramar sal na mesa e não acredito que virar o copo de vinho à mesa dá sorte. Até acho isso um contrassenso porque, logicamente, uma toalha com nódoas de vinho só serve para o lixo. Definitivamente. Não sou supersticioso, não acredito em bruxas, nem em bruxedos, nem em feitiços e muito menos em pragas e macumbas.
À evolução sempre necessária, e neste momento histórico exigido pela transformação social e pela maturidade da grei, para um mais amplo sistema de direito público, substitui-se tragicamente de uma forma apressada o sistema, levando à quebra de tradições e à divisão dos homens em vencedores e vencidos.
A ausência de cultura, aliada à falta de consciência política global, gera bastardia irremediável do voto, e a organização dos partidos, ou “grupos de status”, não como expressões tendenciais dos grandes rumos de opinião pública, mas sim como simples associações utentes do poder, assentes na importância social da licenciatura e gerando uma nova forma de privilégio parasitário.
Os sistemas políticos nunca são perfeitos e a democracia só o será quando um grau de preparação económica, social e cultural do povo for determinante de uma consciência do direito político individual, e que no momento de ação resulte em vontade coletiva.
Cada novo messianismo na ação política, cada nova ideologia redentora, enche o povo de promessas e mesmo de realizações. Por um momento efémero domina a prole e arrasta os homens na sedução do novo ideal coletivo. Paulatinamente porém, a vida reflexiva e consciente retoma os seus direitos, a inteligência renova as suas perguntas, e os problemas renascem para a diversidade discutível das várias soluções.
E como o homem nesta fase só concebe a política em termos de ideal absoluto e redentor, e existe na forçosa circunstância de vencido ou de vencedor, a ação pública situa-se em coordenadas de “guerra”, de sentido de revolta ou de defesa a todo o custo.
Ser adversário político é sinónimo de inimigo pessoal. O partidário do poder, olha para os adversários como uma raça diferente, uma espécie de monstros capazes de todos os “crimes”. O adversário do poder, pelo seu lado, olha para os outros como uma tribo estranha, que se apoderou do mando ou de desmando nalguns casos.
O sentimento comum da existência coletiva o conceito de solidariedade, o ideal de uma vida comunitária e irmanada numa obra comum a construir em cada hora, são tropos literários, cuja verdade profunda jaz moribunda.
Até quando poderemos resistir à trágica divisão das pessoas, à triste dialética, à partilha do destino humano, na injusta base do vencido e do vencedor?
Apetece-me recordar um texto do “desalinhadíssimo” Alberto Pimenta, o criador desse delicioso poema “discurso sobre o filho da puta” , que não ouso publicar por razões que pelo menos eu julgo óbvias. Alberto Pimenta é um “malquisto” por muitos outros trabalhos de “rotura” no contexto literário da língua portuguesa.
“1948: o meu pai foi às Finanças fazer um requerimento, e como de costume fez questão que eu o acompanhasse. Para “aprender a vida”.
Em casa explicou-me minuciosamente a fórmula e o motivo do requerimento. No fim meteu dentro da folha uma nota de 50 escudos, e disse-me- Esta é a parte mágica da fórmula. Quando tiveres um pedido a fazer, já sabes, o segredo é este.
Passados uns meses enviei a minha primeira declaração de amor e, como 50 escudos era muito para as minhas posses, juntei uma moedinha de 2$50.
Nunca tive resposta, decerto foi por ser tão pouco”
“Os capitalistas têm dinheiro e compram tudo: justiça, polícia, padres, governo, tudo. A gente só tem um capital: os companheiros.
Jorge Amado, in “S. Jorge dos Ilhéus”.
Não faço ideia se estou a escrever pela antiga ortografia, se já ao abrigo do novo acordo! Paciência, saiu assim…
Exatamente assim!

Fernando Pereira
8/5/2012

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