9 de fevereiro de 2012

"“Memórias de Adriano” só mesmo da Marguerite Yourcenar!" / O Interior-9-2-2012




Começo a ter a convicção que devem ter virado o mundo ao contrário, ou estarei a assistir a exercícios de expiação tardios de certa gente que foi qualquer coisa de inapreciável politicamente noutras fases de longas vidas.
Esta semana ouvi o professor Adriano Moreira, numa entrevista na SIC ao António José Teixeira, e a determinada altura belisquei-me para saber se estava a ouvir e a ver a mesma pessoa que foi ministro de Salazar e que reabriu o Campo prisional do Tarrafal em 1961, depois de encerrado em 1954, por pressões internacionais e contestação interna, pelas condições degradantes que lhe trouxeram o aviltante nome de “Campo da morte lenta”.
Qualquer alienígena que tivesse aterrado neste planeta esta semana ficava completamente banzado com as críticas assertivas que o Prof. Adriano Moreira faz às medidas draconianas do governo do PSD /CDS, na esteira do que fez o governo liderado por José Sócrates.
Com noventas, putativo delfim de Salazar, ministro do Ultramar num momento particularmente sensível nas colónias, Moreira defendeu posições que basicamente a esquerda, que nunca esteve no poder, defende coerentemente há muitos anos, como questões tão comezinhas como a estabilidade no emprego, uma saúde e uma educação em que todos os cidadãos tivessem iguais direitos, num Estado Social que desse oportunidades a todos na defesa de um bem-estar, e mais alguns lugares comuns, que são do agrado dos muitos que o ouvem e admiram com alguma reverência, talvez pelo seu ar professoral e a sua provecta idade.
Ficaria estarrecido se não soubesse do seu percurso nos últimos sessenta anos, ou foram um embuste perfeito ou então está a reinar com todos que o ouvem. Desculpe professor, mas para este peditório já dei!
Também ouvi esta semana o Dr. Mário Soares a falar sobre os períodos da sua intervenção política a seguir ao 25 de Abril de 1974, e confesso que a minha indiferença é praticamente igual à que senti quando ouvi o Professor Adriano Moreira. Não quero ter nada a ver com este filme:”Aos costumes disse nada”.
Acho que estes programas deviam ir para a RTP Memória, pois tem já por lá o “reprise” Hermano Saraiva a destilar a sua verve ultra-direitista, e assim juntava-se por lá tudo que hoje se anda a recolher no baú da política.
Na Rádio Altitude, também ouvi partes do “Recordar o passado na Guarda”, mas desaguentei e mudei de registo pois sinceramente desapetece-me de todo permanecer continuadamente a ouvir alijar responsabilidades para outros, um pouco na esteira do Prof. Moreira ou do Dr. Soares, que afinal nunca tiveram a ver com nada!
Começo a perceber porque é que “O Artista” foi nomeado para dez Óscares. Estamos no tempo de mudez, e só aos gerontos lhe é dada palavra.
Aguardem pela Páscoa, quarenta dias depois de um Entrudo que já era, para que eu faça uma crónica adocicada.
Fernando Pereira
5/2/2012
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