30 de dezembro de 2009

Tchiweka / Ágora / Novo Jornal/ Luanda 30-12-09



Tchiweka

“Há homens que lutam um dia, e são bons;
Há outros que lutam um ano, e são melhores;
Há aqueles que lutam muitos anos, e são muito bons;
Porém há os que lutam toda a vida
Estes são os imprescindíveis”
Bertold Brecht

Fui presenteado, por um bom amigo, com o livro “Lúcio Lara, imagens de um percurso”, editado pela “Associação Tchiweka de documentação”.
Este livro, graficamente excelente, é a fotobiografia do homem que trilhou toda a luta de libertação de Angola, do seu nascimento enquanto País, e a sua tumultuosa existência nestes quase trinta e cinco anos de independência.
Há uns tempos, passei a pé na casa branca, a 124, da Rua Comandante Stona, e reparei que era a única casa de Luanda que tinha visto sem grades, sem arame farpado, sem segurança sentado numa cadeira à porta, sem muros altos e com o jardim cuidadosamente arranjado. Comentei esse facto com alguns amigos, e realmente foi generalizada a opinião que essa situação era imposta pelo respeito, só possível pela probidade e estatura moral do proprietário da casa: Lúcio Lara.
Lúcio Lara dedicou toda a sua vida à luta pela independência do povo angolano, sacrificando-se, sacrificando a sua família, e nunca nada pediu em troca, rejeitando demasiadas vezes cargos, lugares, em suma todo um conjunto de “prebendas”, que o violentassem no seu carácter de homem impoluto, de grande maturidade ideológica e profundamente arreigado a valores, que se para alguns são dispensáveis, para ele foi a razão de luta de uma vida vivida, dura e materializada nalguns dos seus lídimos objectivos.
Esta fotobiografia, bem como os outros três livros de documentos, já publicados pela ATD, revela uma pessoa de combate, mas também alguém que dava e retribuía com facilidade doses elevadas de afectividade. O MPLA foi a razão da sua vida, ele que é um dos poucos sobreviventes, de um projecto que criou e desenvolveu, onde tantos tem entrado, e que merece do seu País tudo que se deve dar a um dos seus melhores, que são tão poucos..
Lúcio Lara funcionou para mim e para muitos da minha geração, quase que como um alter-ego, com a sua luta continuada pela libertação do País, a defesa obstinada do seu projecto de sociedade igualitária em Angola, o tenaz combate ao racismo e tribalismo, pasto fértil para a penetração de formas de liberalismo niilista, em que o lucro a qualquer preço é o mote da sociedade, e em que o homem passa a mercadoria ou estatística.
Este livro, é provavelmente do melhor que se fez em Angola, nos últimos trinta e cinco anos, e mostra fotos de paixão, de amizades perpetuadas, de reuniões aturadas, de situações complicadas, de momentos de tensão, de permanente trabalho político, de cumplicidades forjadas em propósitos comuns de afirmação de vontades de transformação de sociedade, enfim mostra o trajecto dos quase cinquenta e cinco anos do MPLA, que só tem um denominador comum: Lúcio Lara.
O livro abre a sua casa, mostra a sua dedicada família, expõe a simplicidade dos seus hábitos e partilha com todos o que gosta de fazer, os seus amigos, e os anos vividos com a sua companheira Ruth, falecida em 2000, e que seguramente foi um enorme choque, tal a cumplicidade de quase cinquenta anos de vida em comum, e de partilha de ideias, sentimentos e convicções.
Este livro é o verdadeiro livro de Angola, obrigatório para todas as gerações, principalmente para a juventude, para perceberem se o que hoje é fácil ou facilitado., foi feito com luta por pessoas imprescindíveis, e que felizmente ainda vivem entre nós.
Lúcio Lara, agradecemos-te porque não deitaste os papéis fora, e teres sido sempre um rato de papeis! Talvez assim se tivesse evitado, que em Angola, ou noutro lugar, se escrevesse ou reescrevesse a história segundo as conveniências do mercado e das circunstâncias adaptadas a determinados momentos.
Á Associação Tchiweka de Documentação, saúdo o mérito de todo o trabalho que aí está ao alcance de todos os angolanos, sem peias nem meias!

Fernando Pereira
24/12/09

1 comentário:

septuagenário disse...

Palavras de Lucio Lara ouvidas na rádio em 1974: VAMOS FAZER UMA ANGOLA À NOSSA MANEIRA.

Disse estas palavras em português, não disse em bailundo, ou quicongo, nem em cuanhama ou quioco...será que os angolanos queriam a Angola de Lúcio Lara?

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