14 de janeiro de 2011
Palha vã vais ter / Interior / 14-1-2011
Dessei se a maioria de uma minoria que me vai lendo conhece a anedota do comboio parado?
Numa estação de caminho de ferro, onde tinham ficado acidentalmente uns carris que escaparam à socapa da sucata, estavam os três últimos primeiros-ministros de Portugal e Ilhas num compartimento de uma carruagem de comboio completamente imobilizado.
O Duarte, desculpem Durão Barroso, farto de ver passar as horas e o comboio parado, resolve levantar-se e sair. Volta com um ar ufano e diz que prometeu ao maquinista que o iria acompanhar para a Comissão Europeia, onde “sabia que iria chegar, não sabia quando”. O comboio manteve-se parado. Santana Lopes, com aquele ar gingão, um misto de “Maximo Dutti”e “Desigual” levanta-se num ápice e regressa com um sorriso jactancioso afirmando peremptoriamente que o comboio ia andar pois garantiu ao maquinista uma presença na capa da Caras, para além de aumento de honorários. O comboio permaneceu parado. Manifestando algum enfado José Sócrates levanta-se, fecha as cortinas deixando o compartimento numa escuridão total e diz com um ar cândido: “Meus senhores, o comboio está a andar”.
Esta adaptação livre de uma anedota dos tempos da guerra fria tem muito a ver com a realidade do que tem sido Portugal e Ilhas nestes últimos anos. Mia Couto, provavelmente um dos mais virtuosos escritores da Lusofonia, a par de Pepetela, escreveu na sua crónica regular publicada num semanário moçambicano isto: “O nosso país não produz riqueza, produz ricos”. Dirão logo uns quantos que lá vem este tipo a querer comparar Portugal com países de pretos, mas a realidade é que esta frase do Mia sobre a realidade moçambicana assenta que nem uma luva na realidade serôdia da baixa política e do chico-espertismo, em que se foi transformando a economia de mercado onde vamos andando, cantando e quase rindo.
Augura-se um ano de 2011 muito mau para o cidadão comum, mas sei que sabem que há quem saiba que já há gente a viver mal há muito tempo com reformas ao nível da indigência e outras situações do tipo, que para alguns são instrumentos de retórica em determinadas e oportunas circunstancias e para outros são a realidade de um quotidiano triste.
Por causa de tudo que vai acontecendo, e aqui lembro um outro Fernando de apelido Pessoa que dizia “Sim, está tudo certo. Está tudo perfeitamente certo. O pior é que está tudo errado”e hoje ao olhar para um mariscário, lembrei-me da parábola das lagostas. Quando estavam naquela água diziam mal da vida porque tinham saído do mar; Quando foram para a panela detestaram a água e queriam voltar para o mariscário; Quando a temperatura passou para os 40º já pediam os 20º, quando passou para os 50º pediam os 40º e por aí fora até soçobrarem definitivamente nalgum dente com melhor poder de compra e imune à crise.
Parecenças q.b. com o quotidiano da malta, que vamos sentindo que o dia de hoje é sempre melhor que o de amanhã.
Um Bom Ano de 2011, apesar de tudo!
Fernando Pereira
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