Na semana passada, comemoraram-se cinquenta anos da criação de uma série de culto da TV e do cinema de animação.
Os Flinstones, com os casais Wilma e Fred, Betty e Barney, mantiveram-se até 1996, como um dos tops da Hanna Barbera, e foi o primeiro contacto com a idade da pedra, com que muitos de nós nos confrontávamos em criança. A BD em livro, era o prolongamento de todas aquelas geringonças que víamos no nosso quotidiano, adaptadas a materiais tão simples e tão apelativos à nossa fértil imaginação de criança. O carro, o ferro de engomar, a TV, os diálogos, as cumplicidades entre Fred e Barney, entre Wilma e Betty, fizeram-nos sonhar, o que tinha sido viver com apetrechos tão modernos no paleolítico superior.
Não apareceu um PC de pedra, com um Windows, Mac, Linux ou Opera, adaptado à linguagem “pouco empedernida” destas famílias.
Também se comemoraram os cem anos da implantação da Republica em Portugal, com mudanças importantes no quotidiano político em Portugal, alteração expectável desde o Regícidio de 1908, onde pereceu o príncipe Luis Filipe, que foi o primeiro alto dignitário português a visitar Angola (1907). Foi em sua homenagem, o nome dado à ponte de ferro da Catumbela, que serviu ininterruptamente a ligação entre Lobito e Benguela durante cem anos.
A monarquia portuguesa deixou Angola entregue à voracidade de gente indesejável em Portugal, o que não é o mesmo que dizer que eram bandoleiros ou saqueadores, já que havia muitos condenados por delito de opinião. Só o Ultimatum, e a Conferencia de Berlim, obrigaram os governantes da monarquia a darem mais atenção à colónia, pois até então não tinha grande expressão no Paço.
Sem querer entrar muito em pormenores, o que se sabe é que o 5 de Outubro de 1910, foi recebido com algum entusiasmo, entre os deserdados portugueses que viviam na colónia, mas com enorme indiferença entre a maioria dos angolanos, principalmente nos dois centros urbanos com alguma importância: Luanda e Benguela.
O que aconteceu depois é sabido; Angolanos, de algumas famílias tradicionais, com um peso social importante, algum poder económico, viram coarctados direitos que possuíam em favor de políticas de implantação de colonos, na esteira do que faziam ingleses e alemães no século XVIII. A Republica foi mesmo quem mais prejudicou, de forma desprestigiante a maioria dos antecessores da oligarquia que hoje governa o País. A Republica utilizou sátrapas em Angola, por isso o Estado Novo teve caminho aberto para fazer o que queria.
Pode parecer paradoxal, mas este tema tem algo a ver, com a recente movimentação em torno da preservação do pouco património edificado que vai restando em Luanda. Vi recentemente uma entrevista com a arquitecta Angela Mingas e E. Freire, em que este ultimo, que foi um dos dinamizadores do ICOMOS (Comité Internacional de Monumentos e Sítios), com Samuel Aço e outros entusiastas, tentaram que algum património histórico, arquitectónico e paisagístico permanecesse incólume e disponibilizado para que todos pudessem dar futuro a vários passados.
A realidade é que muito desse património foi edificado por famílias crioulas tradicionais de Luanda, onde avultavam os célebres sobrados, proprietários de que há uns tempos estiveram em destaque numa animada troca de pontos de vista com o engenheiro Aires Menezes Assis, neste jornal, e que a Republica implantada em Portugal tratou de menorizar e subalternizar em relação aos colonos, até os conseguir desalojar.
É confrangedor assistir-se ao assassínio da cidade, à sua identidade arquitectónica, e histórica, alinhando-se na construção de uns megatéreos, numa tentativa de imitar o Dubai, essa Disneylandia para adultos, onde os nossos empresários e alguns dirigentes vão buscar a inspiração.
Começamos angustiosamente, a pedir que o argumento inicial, “O desejo de Kianda”, romance de Pepetela de 1995, não aconteça na realidade, embora já haja um ou outro indício, que nos permita acreditar que o que foi ficcionado pode ser uma realidade pungente.
Como estamos em tempos de recordar, lembro-me de um certo pregão dos ardinas de Lisboa na década de 50 e 60, que perdurou anos, e que deixava em polvorosa os apaniguados e servidores do regime ditatorial de Salazar. Com o título dos jornais:”Lisboa, Capital, Republica, Popular”. Com o “Diário de Lisboa”,” Capital”, “Republica” e “Diário Popular”, tudo vespertinos, conseguiram dar um grito de resistência!
Esta foi a parte que nada tinha a ver com as histórias, mas precisava de adornar um título!
Fernando Pereira
3/10/2010
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