21 de setembro de 2012
LUANDA AO PERTO / Ágora / Novo Jornal 244/ Luanda 21/9/2012
A cidade não pode ser considerada como uma obra do homem, se negar as leis da Natureza pois só estas permitem vida.
A humanidade nunca se poderá libertar dos condicionalismos físicos impostos por determinados princípios já reconhecidos pela Ciência.
Constitui, portanto, um falso cientismo entender o progresso como ilimitado, capaz de destruir e substituir as leis da Natureza. Um lápis cairá sempre que o largarmos no ar, um rio correrá sempre, da serra para o mar, no âmbito da energia e da matéria, tudo se vai transformar e nada se irá criar.
A cidade está sujeita as mesmas leis, que governam o espaço físico em que está inserida. Os seus habitantes nunca poderão fugir ao ritmo, aos contrastes, à dinâmica própria dos seres vivos.
Assim, como numa cultura agrícola o teatro biológico e físico em que ela se processa limita a produção, mesmo que se continue a introduzir cada vez mais energia exterior ao sistema, também numa cidade há limites ao crescimento que não podem ser ultrapassados sem que se verifique a diminuição da qualidade de vida e a perda da dignidade dos seus habitantes.
O crescimento urbano não é apenas um problema de demografia e concentração de pessoas mas é, também caracterizado pelo aumento da área geográfica da cidade, ou pelo maior volume dos seus edifícios e pela maior extensão das infraestruturas. Estão, portanto, em jogo aspetos diferentes intimamente relacionados mas que, por vezes, poderá, cada um, por si só justificar o crescimento. É o caso da cidade que se destrói para se reconstrói tendo em mira apenas o crescimento do sector industrial da construção civil.
Tudo isto vem a propósito da maneira como em Luanda se está a processar o crescimento urbano.
A cidade “espiga”, parecendo que colocam nos alicerces Cialis ou Viagra, surgindo inúmeros edifícios de grande altura, destacando-se da casaria existente, e destruindo a “leitura” do perfil característico de muitas delas.
Esta febre de construir em altura, utilizando materiais e equipamentos sofisticados de elevado custo, de difícil e cara manutenção, substituindo os rebocos exteriores por incríveis vidros espelhados, complicando com varandas e saliências a limpeza das fachadas só para que, de facto, resulte um ar moderno e atual, constitui por um lado, um índice de mediocridade cultural e, por outro, um grave prejuízo social, económico e ecológico.
Luanda tem um passado, possui uma forma, é fruto da atividade de muitas gerações e constitui a expressão mais acabada de toda uma “ruralidade” envolvente.
Não são apenas meia dúzia de monumentos que são dignos de proteção por serem os únicos marcos históricos e culturais que vale a pena conservar, também as ruas, os largos, os bairros e os jardins fazem parte da “alma” da cidade e constituem no seu conjunto um valor histórico e artístico inestimável.
Os que nasceram na cidade ou vivem há muito integrados numa vida urbana consistente conhecem bem esses valores e sofrem quando as imagens da sua infância, a harmonia das formas dos diferentes conjuntos, a escala dos volumes e dos espaços livres que são o seu quotidiano são destruídos.
Esta destruição tanto pode ser a simples supressão de casas, árvores, e espaços característicos como a introdução de corpos estranhos no tecido urbano. Corpos com estranhas formas e volume monstruoso como são esses edifícios colossais que surgem todos os dias na nossa cidade.
Como qualquer eco sistema a cidade servirá tanto melhor o homem quanto mais diversificada for nas suas funções e completa nas suas estruturas. Será na diversidade, na complexidade e no contraste entre muitos dos seus componentes, mesmo que a “ideia” que preside à sua permanente géneses seja clara e simples, que se perpetua a sua permanência e se garanta maior segurança e melhor qualidade de vida aos seus habitantes.
A escala, a proporção e a harmonia da cidade têm como único padrão ecológico possível o homem. Os monstros estão condenados.
Fernando Pereira
17/9/2012
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1 comentário:
Talvez não regresse pessoalmente à Luanda moderna, mas em espírito estou sempre na Luanda colonial.
E, hoje atravez da internet e televisão observa-se Luanda por dentro e por fora.
E o que achava um erro e um exagero, hoje já vejo com naturalidade esses "quimbos" modernos, que são os condomínios fechados, quer na vertical, quer na horizontal que destroem aquela imagem que havia da Luanda colonial.
Tenho duas razões onde encontro lógica nessa transfotmação da capital de Angola.
A primeira razão é aquela que confirma o que certos angolanos queriam, era que fariam uma nova Nova York se fossem eles e não o
colono "atrasado"a governar.
Essa mania das grandezas já vem de longe.
A segunda razão, que me deixa aliviado, é que já há tantos documentos, relatos e filmes sobre a capital colonial, que ficará para a história como uma das cidades africanas onde houve mais alegria de viver em todos os seus habitantes, da Ilha a Viana, do Cacuaco à Samba.
Tudo sem condomínios fechados, com quintais abertos à rua, e apenas 52 farras familiares e públicas por ano, porque de 2ª a 6ª feira era preciso trabalhar.
Cumprimentos
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