1 de maio de 2010

Eyjafallajokull /Ágora/ Novo Jornal / Luanda 30-4-2010



Os Islandeses, que vivem num território com intenso cheiro a enxofre, empanturram-se de peixe e cordeiro, Inverno de Janeiro a Janeiro, e com uma língua imperceptível a quase todos os estrangeiros, devem neste momento rir-se que nem os perdidos, da partida que fizeram às economias mundiais.
A Islândia foi praticamente relegada para a insolvência, resultado da crise internacional dos mercados financeiros há um ano e meio atrás. O vulcão, que invariavelmente os atormenta de tempos a tempos, o serviu para fazer parar durante cinco dias a maior parte do tráfego aéreo europeu, com péssimas consequências para a economia de países, companhias aéreas, hotelaria, comércio, indústria, em suma, um pouco em todos os sectores de actividade neste imenso mercado mundial. Foi a vingança dos Islandeses, que até resolveram dar um nome impronunciável ao vulcão, e conseguiram parar as fortes economias, que lhes ditaram uma espartana forma de vida.
Desígnios do vulcão Eyjafallajokull!
No meio disto tudo, é bom recordar “Under the Volcano” (1984), um filme notável de John Huston, com a interpretação soberba de Albert Finney e Jacqueline Bisset.
Já que se fala em filmes, e porque se falou em destruição, quero fazer menção a um livro recente de arquitetura, em que a capa é o quase esqueleto do que foi no tempo colonial o orgulho dos lobitangas, o cinema “Flamingo”(1963), projectado pelo enorme arquiteto do Lobito, Francisco Castro Rodrigues.
O “Moderno Tropical”,arquitetura em Angola e Moçambique 1945-1978, é trabalho interessantíssimo da arquiteta Ana Magalhães(1965), partilhada com a fotógrafa Inês Gonçalves (1964), que fazem um levantamento muito exaustivo do acervo arquitetónico moderno de Luanda, Lobito, Lourenço Marques (Maputo) e Beira.
No que a Angola diz respeito, é feita uma recolha muito pormenorizada do património edificado, os detalhes da sua construção e materiais utilizados, sua funcionalidade ao tempo e na actualidade e a marca do arquitecto. Esta geração de arquitetos, deixou em Angola,património edificado de inegável valor, que só a estultícia permite a sua continuada degradação e desaparecimento, servindo os “nobres” interesses da iniquidade imobiliária, disfarçada pelo chavão do progresso.
Entre texto de investigação e imagens, ficamos a conhecer o belíssimo trabalho de oito arquitectos portugueses, que no contexto colonial africano puderam aproximar-se da vanguarda da arquitectura moderna, enquadrada no que ficou conhecido como Movimento Moderno.
No prefácio, Ana Tostões sinaliza algumas das razões que levaram dezenas de arquitectos portugueses (sobretudo os da Escola do Porto) a emigrar para aquelas duas Colónias: «É justamente essa geração de arquitectos, politicamente amadurecida como nunca o fora a geração dos anos 30 modernistas, que vai fazer a diferença e mergulhar na contemporaneidade. Cheios de força e com a audácia da juventude vão fazer a ‘utopia moderna em África’.»
Uma das facetas interessantes do livro, feito por duas jovens que nada tem a ver com África, é o facto de não terem um olhar nostálgico, o que dá um valor acrescido ao trabalho. Vasco Vieira da Costa (1911-1982), Francisco Castro Rodrigues (1920) e Simões de Carvalho (1929) são alguns dos escolhidos pelas autoras, de um livro encomendável e rigorosamente recomendável.
Em jeito de remate final fica o depoimento sobre o “Flamingo”, pelo facto de hoje estar transformado numa escola, onde as crianças se sentam para ouvir a aula, com o anfiteatro vazio, e o ecrã reflecte as sombras que o sol vai deslocando ao longo do dia. Diz Ana Magalhães: “Claro que associamos estes cinemas ao glamour dos anos 50 e 60, e gostamos de imaginar como seriam na altura. Mas a arquitectura e as cidades são coisas evolutivas e é, de certa forma, um privilégio para estes miúdos estarem aqui. É um recreio natural, entre os mangais e o mar. Não está abandonado. Está degradado mas tem vida”.
Uma excelente publicação editada pela Tinta da China, que irá merecer novos comentários.

Fernando Pereira
27/4/2010

1 comentário:

Joca disse...

Só uma correcção meu caro amigo Karipândego.
Acabei de regressar do Lobito, e lamento dizer que o "Flamingo" não é uma escola nem tem crianças a ouvir aula. Isso é treta. Uma das melhores salas de cimena de Angola está completamente degradado. Lá continua entre o Mar e os Mangais dos flamingos, mas em ruínas e sem aproveitamento algum.... Eu fui lá ver caro amigo! E tu? Podes lá ir ver?
Um abraço do Joca

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