Pavilhão de Angola e numa das fotos a visita de Amizade, Partido e Estado do cidadão Fernando Pereira
26 de junho de 2008
Angola e também Fernando Pereira na EXPO 2008/ Zaragoza
Pavilhão de Angola e numa das fotos a visita de Amizade, Partido e Estado do cidadão Fernando Pereira
21 de junho de 2008
Desconversas/Novo Jornal/ Ágora/ Luanda 20/6/08

Hoje quando estava a ler um matutino qualquer, em que o assunto era uma invariável cruenta análise sobre a situação na África do Sul, lembrei-me do saudoso João Martins.
Poderá parecer paradoxal lembrar-me do João Martins, muitos anos depois da sua prematura morte, mas de facto veio-me à lembrança uma das suas tiradas, num dia qualquer do distante ano de 1980. Perante a onda crescente de cooperantes, que entretanto chegavam a Angola, ele dizia com uma certa piada:”Temos de libertar a Namíbia e a África do Sul, já que é a única oportunidade de sermos cooperantes.
O João Martins, foi director da Casa do Desportista na ilha de Luanda, onde vivi durante cerca de um ano, nos tempos da “gastronomia criativa”. Era uma excelente pessoa, do Ambriz, com uma pasta tipo Bond, feita na Onil, que abria com um fósforo ( IFA) e onde estavam dezenas de requisições ao Ministério do Comércio Interno, que fazia gáudio em mostrar-nos, quando quotidianamente reclamávamos a constante repetição da comida e a falta de qualidade da mesma.
“Malandros”, era uma frase recorrente no léxico do João, perante as queixas dos comensais regulares, onde me incluía, e as equipas nacionais que por lá estagiavam para provas internacionais.
Tinha por ele estima e consideração, mas isso não evitou um ou outro episódio mais “delicado”, que hoje apenas lamento não estar cá o João, para se rir comigo e com os muitos que conhecem a história.
Num desses períodos de RAL (recursos alimentares limitados), começou a aparecer na dieta alimentar da Casa do Desportista um prato que seguramente não se encontra em qualquer cardápio no mundo:” O Churrasco de ovo”.
Esforçava-se por ser uma omoleta, mas o ovo assim como a cebola eram liofilizados e o alho era em pó. Era uma omoleta que comi invariavelmente, durante uma semana, ao almoço e ao jantar, e nunca conseguiu ter a mesma cor, pois era amarelamente esbranquiçada ou amarelecidamente preta, pois o óleo era de uma cor esquisitíssima, assim do tipo manteiga rançosa que lhe dava um verdadeiro desgosto às primeiras trincadelas. Rendia a tarde toda, porque era tipo borracha e colava-se a todas as paredes do tubo digestivo por onde passava.. Estoicamente, fui aguentando até que um dia pedi ao empregado que me servia, que me desse um envelope e uma caneta, ao que ele prontamente acedeu, porque também era uma vítima do atentado ao fígado que todos éramos diariamente submetidos.
Ficou surpreendido quando coloquei o “churrasco de ovo” dentro do envelope e mandei colocar em cima da secretária do director, com a refencia que lhe oferecia o almoço!
Quando o João Martins vê aquilo, roga-me as pragas possíveis e impossíveis e ei-lo no seu 127 amarelo a caminho da então Secretaria de Estado dos Desportos, onde pede uma audiência urgente ao Rui Mingas, que admitiu quando me chamou para me “repreender”, que não lhe foi fácil manter uma pose com alguma dignidade perante o que lhe estava a ser contado.
Sinceramente, hoje acho que em iguais circunstancias ainda hoje o faria, pois um dos filmes da minha play-list é “Oh! Amigos Meus”, em que um conjunto de amigos sessentões, estabilizados social, familiar e financeiramente na vida, se organizam de quando em vez para pregarem partidas, como faziam há quarenta anos atrás, e uma das cenas marcantes do filme é passada numa estação de caminho de ferro, e com um comboio a iniciar a marcha, e as pessoas debruçadas nas janelas a acenarem, quando os seis arrancam dum lado e do outro do comboio a zunir chapadas a quem tinha a cabeça de fora. Bem colocados na vida e bem dispostos sempre!
12 de junho de 2008
"JANGO Jornal para ler e guardar"/Ágora/Novo Jornal /Luanda

Estive para fazer uma croniqueta sobre qualquer coisa de actualidade, que não se confunda com utilidade, porque nos tempos que correm, a maior parte das vezes nem uma nem outra são compatíveis, podendo ser competíveis.
Acontece que no meio de milhares de coisas que fui guardando, o que pode ser sintoma de velhice, avareza, caciquismo de cultura, enfim múltiplas coisas, mas o que é efectivamente relevante é que descobri num molho de jornais, uma colecção do Jango.
Quando olhei para aquele jornalzinho de páginas amarelas, que sei que era desta cor para não se confundir com o “Financial Times” (!!!), detenho-me a pensar quanto empenho, quanto voluntarismo e quanta boa vontade o David, a São, o Fernando Marcelino e poucos mais, colocaram na vida de um projecto, que para alguns foi só mais um pequeníssimo motivo para serem objecto de um vil assassinato, perpetrado por protozoários de invisível, mas de torpe catadura.
No numero 0 do Jango, de 28/8/92, saído precisamente no dia anterior ao início da campanha eleitoral das primeiras eleições gerais no País, os fundadores propunham que este amarelo papel, mas jamais amarelecido,”estava aberto a todos que não vem para ferir”. Propunham uma “informação formativa”, e esperavam poder ser um lugar onde se dessem a conhecer “as deficientes condições em que continua a viver a grande maioria do nosso povo”.
O “Jango”, foi um jornal teimosamente criado para defender o mundo rural, já que era afirmativo no “editorial” do seu numero 0, que “ A preocupação constante é a população rural”. O Governo continua a ser uma emanação das cidades, e a cidade é muito mais exploradora da área rural que o seu apoio.”.
Hoje quando peguei no “Jango”, que tinha sede no Huambo e a administração em Luanda, veio-me à lembrança um grupo de gente solidária, de uma enorme vontade de fazer, insensível às ameaças, mas sensível aos problemas dos muitos que os procuravam e do quotidiano de miséria dos que os rodeavam.
Os malsins que os espiavam, os assassinos e os seus mandantes devem hoje passear-se calmamente, numa qualquer rua de uma qualquer cidade de Angola, e só aqui são lembrados, porque abateram gente intelectualmente superior, pessoas ideologicamente formadas com princípios humanistas, e respeitadoras da dignidade dos cidadãos do seu País, que foi feito à custa da sua luta na idade da razão e a sua continuação na sua razão da idade, até que umas balas fizeram perder mais idade, mas ganharam mais razão, sem contudo a poderem partilhar, com tantos entre os quais nós, que os estimávamos.
Do projecto inicial do Jango, há dezasseis anos, alguns já morreram, outros envelheceram, melhor agrisalharam os cabelos, alguns leitores, como eu, acabámos por ter mais idade, mas seria um lapso enorme não fazer aqui uma referencia, ainda que muito modesta a uma edição que embora efémera, foi uma verdadeira síntese de boas vontades, e de uma coerência de princípios afirmativos do País.
Passados quase dezasseis anos desses hediondos crimes a gente livre e liberta, e num momento em que citando Brecht ,” A paz eclodiu de novo”, fica aqui a lembrança e a saudade, e quanto a mim só me resta continuar a cumprir o que dizia nas páginas centrais do Jornal: “Jango, o jornal para ler e guardar”
De vez em quando releio-os como foi o caso, por isso agradeço a recomendação!

Fernando Pereira
África do Sul: Xenofobia a fogo por falta de ferro! /Novo Jornal / Luanda

Os recentes acontecimentos que se verificaram na República da África do Sul, são deveras preocupantes para a instável estabilidade do sul do continente.
A África do Sul é dos países do mundo com um maior crescimento, na ordem dos 5% o que é assinalável, mas não deixa de ser preocupante a sua percentagem de desempregados, na ordem dos 25% da população activa; sem um sistema social que garanta minimamente a sua sobrevivência, num quadro de vida com alguma dignidade.
Muito se tem falado sobre os recentes acontecimentos, que devem ser olhados pelos africanos com alguma cautela, pois o eclodir de uma sublevação interna com razoável significado, pode ser rastilho para os países limítrofes e também para os da SADCC, de que Angola é membro fundador.
Não deixa de ser paradoxal que quarenta anos depois do assassinato de Luther King, da repressão violenta aos negros nos Estados Unidos, que apenas lutavam por melhores condições de trabalho e direitos cívicos iguais aos dos brancos em todos os estados, surja em África uma questão xenófoba, num país, que há pouco menos de vinte anos, era o berço puro e duro do torpe racismo étnico no mundo.
Já se adiantaram pormenores múltiplos sobre as razões desta xenofobia, que se espera ver contida de imediato, embora ela tenha sempre como motivação primordial, o da economia que não consegue gerar emprego para todos.
Para além das circunstâncias já aduzidas por tanta gente, a convicção que paira é que a África do Sul, pouco mudou para a grande maioria da população com a subida do ANC ao poder.
As expectativas na mudança por parte da maioria sul-africana, não se cingiam apenas ao facto de começarem a haver autocarros, escolas e hospitais mistos, ou um governo maioritariamente sufragado pelos cidadãos dentro do princípio reitor da democracia um cidadão, um voto. Embora isso tenha sido apreciavelmente positivo, num território onde tudo funcionava fora do contexto normal da história no ocaso do século XX, chegou provavelmente a altura de começar a ter de se criarem regras para uma distribuição mais equitativa da riqueza.
Mandela, a quem provavelmente já não se podia exigir muito mais quando ascendeu ao poder, fez a transição pacífica num país, onde era expectante um banho de sangue por feridas de muitos anos de segregação inerente ao apartheid. Convenhamos que foi relevante devolver à África do Sul a respeitabilidade no seio das nações. Foi decisivo, mas o sistema económico não se alterou, e alguns históricos que o acompanharam na luta, na prisão ou no exterior estão velhos ou foram falecendo entretanto.
Do ANC que não esteve na cadeia, mas que esteve no exílio em Angola, Moçambique, Zimbabué, e noutros locais, emergiu uma elite de dirigentes, e também alguns que se “reformaram” da luta, e entraram nos negócios, sendo hoje as estrelas do “empreendorismo” e do novo riquismo sul-africano, esquecendo que as diferenças entre a concepção de Azania e África do Sul ainda não estão resolvidas, assim como quase todas as outras, porque nada disso se resolve por decreto!
Mbeki, foi um quase presidente estátua, pois foi vendo a situação a alterar-se internamente, e até mesmo em locais que a África do Sul tem responsabilidades objectivas, como é o caso do Zimbabué e nada fez, aparecendo sempre titubeante e com propostas pouco esclarecedoras e acima de tudo sem força acrescida, algo que as circunstancias exigem a um presidente que sabia que não devia deixar tudo como estava.
Houve um tímido crescimento de alguns novos empresários, mas a sensação que vai existindo é que está tudo na mesma, e era desejável, se ainda não for tarde, que se faça uma redistribuição de riqueza, que não aliene de forma aventureirista os fundamentos económicos, e naturalmente a dinâmica produtiva do País.
A xenofobia é facilmente explorada em momentos de pobreza, mas não deixa de ser cruel que sejam os moçambicanos e os zimbabueanos a serem as maiores vítimas do desmando e da violência que vimos irromper nos últimos tempos; Se havia povos que mereceriam a gratidão da quase generalidade dos sul-africanos, são precisamente os povos dos ex – Países da Linha da Frente, que foram os mais sacrificados na longa luta pela liberdade, contra o apartheid.
Este movimento não é isolado, e observa-se que a África do Sul obsta sistematicamente à tentativa de construir um mercado comum da África Austral, o que indicia que se herdaram tiques, que teria sido excelente que tivessem sido erradicados em tempo útil, para se evitarem o avolumar de desconfianças em todos os lados, e surgirem situações internas incontroláveis com o efeito bola de neve em todas as economias e com consequências graves quotidianos de vida das populações dos países à volta.
Há uma enorme esperança em Jacob Zuma por parte da grande maioria sul-africana, principalmente e recorrendo a um termo peronista, os “descamisados”. Teme-se que o evoluir da situação talvez não dê para muita espera, e a realidade que se começa a viver é preocupante, principalmente quando os primeiros visados são as populações mais vulneráveis e curiosamente os vizinhos próximos, que guardarão sempre sentimentos confusos e desencontrados.
O que se passa na África do Sul, pode ter as razões do que se passa no Kozovo, no Ruanda, e em tanto lugar, por isso não se deve olhar apenas com comiseração, mas acima de tudo com a necessidade óbvia de se prepararem cenários, para eventuais dias que se esperam sombrios, reafirmando que a culpa vai inteirinha para um ANC que se deslumbrou com o poder, e esqueceu-se do muito que lutou e fundamentalmente dos muitos que com ele lutaram e que muito sofreram, como foi por exemplo o caso do nosso País.
Fernando Pereira
4/06/08
Publicado no suplemento da economia do Novo Jornal em 13/06/08
6 de junho de 2008
Esta edição foi feita por militantes do MPLA em Lisboa/75-76
1ºs Campeonatos Nacionais Universitários depois do 25 de Abril de 1974

Realizaram-se em Coimbra, ao tempo com 3 universidades e quinze modalidades.
A Comissão organizadora era pela Associação Académica de Coimbra representada por Fernando Pereira (o patrono deste BB..brilhante blog) e a Teresa Oliveira.A AAC coordenava a Comissão organizadora e a comissão desportiva dos jogos.Pelo Centro Desportivo Universitário de Lisboa, eram membros da comissão, Franklim Dias e Gonçalo Botelho e pelo Centro Desportivo Universitário do Porto o Costa Lima e o Luis Falcão.
Estes campeonatos retomaram uma tradição quebrada em 1971 com os Campeonatos Universitários organizados pela CNDU em Guimarães sob os auspícios do Dr. Armando Rocha, que foi quem leu o elogio a Salazar na inauguração do Estádio Nacional, envergando garbosamente um fato da MP (bufa)
Fernando Pereira...em cordação e recordação
Pythonesque/ Ágora / Novo Jornal /6-06-08/ Luanda


Por humor de Deus, é uma adaptaçãozinha tímida, de uma frase recorrente no quotidiano linguajar das pessoas, CARs ou não CARs., excluindo obviamente os enquadrados ateus, ou no mínimo agnósticos.
Desvou falar de religião, mas fazer uma abordagem à mais lendária série de televisão, a BBC Monty Python’s Flying Circus, isto para alterar o texto no contexto deste espaço.
Há trinta anos a esta parte, que acompanho este grupo, e tenho a clara convicção que se alterou humor televisivo em todo o mundo, desde que John Cleese,Eric Ilde, Terry Gilliam, Terry Jones, Michael Pali e Chapman, nos começaram a presentear com as suas aparições regulares em várias TVs a nível global.
O humor dos Phytons, como também são chamados, é realmente o verdadeiro humor britânico, o herdeiro da tradição da poesia nonsense, e é corrosivo e não poupa alvos, escolhendo a maior parte das vezes pessoas e instituições, que antes do seu aparecimento nem se julgavam passíveis de meros dichotes, quanto mais terem que se confrontar com séries inteiras deste grupo do fazer rir inteligente.
Quando vemos os Phytons, podemos quase fazer uma catarse a nós próprios, pois eles conseguem ridicularizar o que durante tantos anos foi imaculadamente e também ridiculamente sério.
Aparentemente os Monty Phytons não tem regras muito rígidas, e assim se mantém desde o seu aparecimento em 1969, ao tempo num genérico, com um grafismo muito parecido com o Yellow submarine dos Beatles, que tinha sido um êxito um ano antes em todo o mundo. Os seus papeis ridicularizam tudo e todos, e no “Sentido da vida”, eles próprios se expõem ao ridículo, num sketch inigualável..
Não sei se é influencia, mas em determinados momentos, consigo num quotidiano e com as pessoas aparentemente mais normais do mundo, faço exercícios que mais não são que tentativas ainda que demasiado pueris de os imitar. Na hermenêutica do texto político e no comportamento dos dignitários dos regimes, encontramos então um terreno, que é um verdadeiro manancial de recolha para sketchs dos Phyton.
Na míriade dos políticos, algum empresariado angolano, acolitados por uns quantos emergentes “imigrantes”, tenho a sensação que nem seriam precisos os Python, para cobrir de ridículo situações que fazem parte do quotidiano da Angola das “oportunidades”.
Depois deste “quase devaneio”, só posso dizer que ninguém devia morrer, sem pelo menos, ver os Monty Python uma vez na vida, porque julgando-se inteligente nunca deixará de querer ver tudo.
. Está muito do seu trabalho editado em DVD, principalmente o melhor dos “ BBC Flying Circus” (21 DVDs), o “Sentido da Vida”, a “Vida de Brian”, o “Cálice Sagrado”, “E agora algo completamente diferente”, e ainda um conjunto que tem os “Melhores momentos dos Monty Python” num total de 6 DVDs. Acresce a tudo isto os sketchs de teatro, livros onde se recomenda, entre outros, “Os Monty Phython por si próprios”, programas de rádio e participações em entrevistas.
É óbvio que era inevitável que do léxico comum, ao vocabulário inglês se tenha enraizado o termo pythonesque , que é nem mais nem menos que muitas expressões do quotidiano do trabalho dos Pythons colocados no viver diário dos ingleses.
Já agora e para finalizar CAR, quer dizer Católico Apostólico Romano.
Fernando Pereira 29/05/08
2 de junho de 2008
Este disco tem história!


António Beja, fez este disco em 1970, em que metade dos fundos conseguidos com a venda deste disco editado pelo Angola Comité (com sede em Amesterdão)seriam para o MPLA, FRELIMO E PAIGC. A outra metade será enviada para a CSPPP (Comissão de Solidariedade aos Presos Políticos Portugueses, sedeado em Paris.
A Face A
O adeus de guerrilheiro
MPLA
A ti inválido
A face B
Portugal está governado por assassinos
O padre capelão
As crianças não sorriem
Fernando Pereira
31 de maio de 2008
"SEJAMOS REALISTAS; EXIJAMOS O IMPOSSÍVEL” (Maio1968) / Ágora/ Novo Jornal / Luanda


“SEJAMOS REALISTAS; EXIJAMOS O IMPOSSÍVEL”
PARIS,MAIO 1968 (III)
De Gaulle era o presidente da França em Maio de 1968, e foi o principal visado pelos milhares de pessoas que se movimentavam em Nanterre (subúrbio de Paris, onde foi o “berço” da rebelião, mais propriamente na sua recém inaugurada universidade), na Sorbonne, no Quartier Latin, nas Tullerias ou nas fábricas da Renault, ou da Citroen, ou nos plenários nos Correios ou mesmo nas centrais de produção de electricidade.
O proeminente nariz do presidente francês, as pichagens nas paredes, as lojas fechadas, as barricadas com carros, as correrias constantes de polícias e manifestantes, a incessante actividade cultural que se desenrolava na rua, a incredulidade do cidadão parisiense e o fingir que nada se passa pelos milhares de imigrantes que viviam em Paris, “pintaram” um quadro algo absurdo. A sociedade luta entre o desmoronar e a reerguer-se num quadro de novos valores, novas opções sociais e uma maior contestação ao status quo prevalecente
O acesso aos bens de consumo, à educação e à cultura tinha sido democratizado. Os anos 60 foram os anos curiosos, contestatários e burgueses
O Maio de 1968 foi um movimento colectivo de contestação sistemática a tudo, como é revelador neste diálogo que vem nos “les tubes de Mai 68”, na faixa do disco “Sous les Pavés…la Plage”(Sob a calçada a praia), edição de L’ Observateur: “Contestez! Il faut toujours contester tout”, bradava alguém no pátio da Sorbonne. A este brado, um francês perguntou:”Mas não há nada que vocês não contestem?” “Há”, respondeu alguém:”O direito que todo o homem tem a viver dignamente”. Numa Paris em ebulição naquela Primavera de 68, viam-se bandeiras no Théatre de France, vermelha e negra, que diziam:” A libertação total do homem está para além da libertação económica, está na sua afirmação plena na vida”. Nos jornais de parede os títulos eram invariavelmente do tipo “Não é homem, mas sim o mundo que se tornou anormal”. Nos cartazes lia-se:”Eu participo, tu participas, ele participa, nós participamos, vós participais, eles lucram”. Os graffitis que enchiam as paredes da cidade clamavam por: “Enragez-vous” (Enfureçam-se).
Daniel Cohn-Bendit, aparece como uma das “figuras”, o que não deixa de ser paradoxal num movimento com as características colectivas do Maio de 1968, mas muito do seu protagonismo é-lhe conferido, pela obstinada perseguição xenófoba e racista, que as autoridades francesas lhe fizeram, apodando-o como “Judeu-alemão”, acompanhado pela posição do PCF, que o chamava de “anarquista alemão”.
Todos somos hoje herdeiros daqueles dias do viver colectivo de uma utopia, onde a contestação, a arte, a cultura, a musica, as relações humanas, as relações sociais, o enquadramento económico dos cidadãos, foi tudo motivo de contestação e de discussão.
Na Angola colonial, nada transpirava, e a guerra ia continuando e nada se ia alterando de significativo, apesar da cadeira de lona ter acabado com a vida política de António Salazar também nesse ano de 1968. A Universidade em Angola dava ainda os primeiros passos, e apesar de já haver um cine-clube com propostas interessantes ao nível da divulgação de determinado tipo de filmes, um Orfeon ainda embrionário, pouco mais havia ao nível do associativismo, e a bem dizer nada era contestado. Umas calças à boca de sino, uns cabelos compridos, umas cores garridas nas camisas, umas saias à Twiggy , e era o que mais se aproximava do movimento hippye, o sucedâneo americano do movimento parisiense de 1968. Em poucos grupos começou-se a ouvir Regianni, Brell, Brassens, Ferrat, Leo Férre, e tantos outros que marcaram com letras e musicas o nosso imaginário de um 1968 que fisicamente não vivemos.
Em Paris, a causa da liberdade dos povos das colónias sob dominação portuguesa foi motivo de discussão, nomeadamente entre os exilados portugueses, os cidadãos africanos e ainda bolseiros portugueses que ocuparam a Casa Gulbenkien, local onde alguns bolseiros da fundação viviam na capital francesa.
No quadragésimo aniversário da maior movimentação de utopia, gostávamos de poder dizer que estávamos à beira de outra do tipo, mas parece que o futuro próximo não nos vai fazer a vontade.
Resta-nos revisitar o passado!
Fernando Pereira
6/5/08
28 de maio de 2008
Equipa de nem velhas nem novas Guardas num jogo no Pavilhão do Rio Seco/1982
23 de maio de 2008
TODO O PODER ABUSA, O PODER ABSOLUTO ABUSA ABSOLUTAMENTE/ Ágora/ Novo Jornal/Maio1968 (II)


1968 foi um ano em que as coisas foram acontecendo um pouco por todas as latitudes, e a mudança foi sendo sentida nalguns lugares .
Milão, Dakar, Tóquio, Nova York e tantas cidades pelo mundo inteiro viram os estudantes ocupar escolas, barricarem-se nas ruas, manifestarem-se e desafiarem os poderes instituídos e as suas forças da ordem. Era um afã de liberdade, e de afirmação do querer valores novos, contra a ancilosada sociedade que os impedia de participarem num mundo, onde se recusavam a ser apenas observadores passivos.
No México, onde se realizaram os mais polémicos Jogos Olímpicos da história, precisamente em 1968, os estudantes tiveram por parte da polícia o mesmo tratamento desbragado que os seus colegas de Cracóvia e São Paulo.
A contestação generalizou-se, e ainda hoje subsistem interrogações à forma como tudo se iniciou, já que tudo foi irrompendo um pouco de forma espontânea, e de certa forma algo desorganizada segundo o que era padronizado pelas organizações políticas.
Os estudantes, na sua esmagadora maioria filhos da burguesia, numa antecâmara para o mundo do trabalho, foram os “catalisadores” de uma irrupção que nenhum manual político de Marx, Lenine, Gramsci, Togliatti, Max Weber, Bernestein, e tantos outros se atreveram a prognosticar. Emerge em todo este movimento o filósofo alemão Herbert Marcuse, um seguidor de Feud, com algumas ligações a Heidegger e Husserl, e que defende o primado de uma sociedade não repressiva, fundada sobre o princípio do prazer.
O existencialismo( Sartre aparece numa foto sentado num bidon, numa barricada no Quartier Latin) é uma corrente do pensamento muito acolhida pelos estudantes. A penetração do trotsquismo numa determinada fase das movimentações, com a participação já de multidões de trabalhadores, começam a preocupar alguns partidos mais à esquerda no espectro político francês institucional, nomeadamente o PCF, e o seu secretário geral Duclos, que assume uma posição algo dúbia o que enfurece o radicalismo dos estudantes. Era frequente ver-se Alain Krivine, o homem da 4ª Internacional (trotsquista) nas “sessões contínuas “ de discussão na Sorbonne, universidade que foi o centro nevrálgico de todos essa primavera onde tudo se discutia e onde tudo tinha de ser possível, até mesmo dar importâncias a frases tão simples como esta: “Tenho algo a dizer, mas não sei o quê”!
Ainda sobre Sartre, é curioso recordar uma cena que demonstra cabalmente o que foram aqueles tempos, em que ele pede para falar num plenário e uma rapariga de vinte anos diz-lhe: “Sê rápido”!
O Maio de 1968, para além das vicissitudes que hoje são recordações distantes, foi um factor de ruptura determinante, uma recusa de valores encardidos, e a assunção de uma nova forma de pensar e agir, mormente ao nível dos costumes, e na busca de valores diferentes que o código moral da tradição judaico-cristã impunha nas relações pessoais, de trabalho, sociais, políticas e de cidadania. Foi a rotura com um contemporâneo “Ancien Régime”.
16 de maio de 2008
INTERDIT D’INTERDIRE /Ágora / Novo Jornal Luanda



INTERDIT D’INTERDIRE
(Proibido proibir)
Paris, Maio 1968 (I)
Olhando a uma distancia de quarenta anos, é minha convicção que 1968 foi provavelmente o ano mais decisivo do século XX!
Foi o ano marcado pela contestação e pelo radicalismo, em que nada a partir daí ficou como dantes, e veja-se a título de exemplo uma estultice de Sarkosy, que diz alto e bom som que é preciso acabar com o que o Maio de 1968 trouxe à França, embora a sua recente ligação com a modelo Carla Bruni prove que o que ele disse se ficou pelas palavras.
1968 marca o início da contestação de rua à guerra do Vietname, o recrudescimento das actividades do Black Power e as consequentes irrupções de violência racial nos EUA, onde são assassinados Luther King e Bob Kennedy, inusitadas manifestações estudantis na Alemanha lideradas por Rudi Dutschke e a surpresa da crescente importância da Internacional Situacionista de Guy Debord, na França, foram alguns factores que surgiram num quadro muito generalizado de apelo à mudança, em que o ênfase maior é sem dúvida o Maio em Paris.
Num leste europeu, aparentemente “imune” a estas movimentações da “esquerda folcolórica” assiste-se no Abril, em Praga, o primeiro movimento tendente a reformar o regime socialista por dentro, no que vulgarmente ficou conhecido pela “Revolução de Veludo”. Dubcek tenta promover algumas alterações na Tchecoslováquia, no domínio das liberdades individuais. O movimento que ficou conhecido pela “Primavera de Praga”, foi reprimido em Agosto pelo exército soviético, o que trouxe clivagens profundas no movimento comunista internacional, admitindo-se mesmo que terá este incidente marcado o princípio do fim do leste europeu, enquanto espaço geopolítico.
No Vietname, em 1968 começou a ofensiva de Tet, decisiva na reviravolta na guerra, epílogo do domínio europeu e americano no sueste asiático. Richard Nixon, é empossado como presidente dos EUA, mantendo-se até que Watergate o obrigue a demitir-se passando por um vexame sem precedentes na história dos Estados Unidos.
Voltando a Paris, onde em 1789 eclodiu a rebelião que consagra os pilares fundamentais dos direitos do homem e do cidadão como “Igualdade, Liberdade, e Fraternidade” e vitória da primeira revolução burguesa na Europa. A Revolução Francesa é também o triunfo do iluminismo, enquanto filosofia, consagrada politicamente na “Magna Carta”saída da independência dos EUA em 1776.
Foi nessa mesma cidade que num outro Maio, mas em 1871, os trabalhadores tomaram o poder, no que se chamou a “Comuna de Paris”, que soçobrou às armas de MacMahon que chacinou 30.000 pessoas.
Paris é também a cidade emblemática na resistência ao ocupante nazi no dealbar dos anos 40 do século passado.
Alguem sabe que tuna é esta?
15 de maio de 2008
Dias,Semanas, Anos...

Durante anos esta era a vista de Coimbra do meu quarto, fizesse chuva ou sol.Quando chegava à janela era esta a minha visão de Coimbra desde o dealbar dos 70...Já há muito que infelizmente larguei aquela janela virada para a torre, onde toca a velha cabra (ao fim da tarde) e o cabrão (logo de manhã).
Ó Coimbra do Mondego
e dos amores que eu lá tive
quem te não viu anda cego
quem te não ama não vive
Fernando Pereira
Fotografias dos II Jogos da África Central/ Luanda/1981

Talvez por ter mencionado o trabalho da Sandra Roque no post anterior lembrei-me de começar a colocar fotos dos II Jogos da África Central realizados em Luanda...Começo por colocar a equipa de basquetebol representativa de Angola, com a Sandra, a Didi,a Guimarães,a Isabel Major,a Perpétua, e mais umas quantas que não me vem à lembradura.O Tonecas,o Sousa, o Barbosinha, o Miguel são outros de que me lembro!
Pode ser que com a ajuda de alguém eu lá vá e me lembre de todas!
Fernando Pereira
14 de maio de 2008
Recomendável e encomendável!
Sandra Roque and Alex Shankland, "Participation, mutation and political transition: new democratic spaces in peri-urban Angola," in _Spaces for change?: the politics of citizen participation in new democratic arenas_, ed. Andrea Cornwall and Vera Schattan P. Coelho (London: Zed Books, 2007)
P'ra não dizer que não falei de flores!


Este tema de Geraldo Vandré...cantado no Maio de 1968 no Canecão!
Prá não dizer que não falei de flores
Geraldo Vandré
Composição: Geraldo Vandré
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Caminhando e cantando
E seguindo a canção...
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(2x)
Pelos campos há fome
Em grandes plantações
Pelas ruas marchando
Indecisos cordões
Ainda fazem da flor
Seu mais forte refrão
E acreditam nas flores
Vencendo o canhão...
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(2x)
Há soldados armados
Amados ou não
Quase todos perdidos
De armas na mão
Nos quartéis lhes ensinam
Uma antiga lição:
De morrer pela pátria
E viver sem razão...
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(2x)
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Somos todos soldados
Armados ou não
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não...
Os amores na mente
As flores no chão
A certeza na frente
A história na mão
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Aprendendo e ensinando
Uma nova lição...
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer...(4x)
NOTÀVEL
Fernando Pereira
40 anos do Maio de 1968

Mas quero lá saber que o Sarkozy diga que tem de se enterrar o Maio de 1968! Continuo a gostar do movimento de rotura que foram esses dias de esperança naquela linda primavera das ruas de Paris!
Há pelo menos uma coisa que sei:Até há pouco tempo era-me indiferente que existisse o Senhor Bruni, mas sinceramente hoje acho que comecei a dar alguma importancia às idiotices que vai debitando...Porque há gente que até chegou a presidente da França.
Karipande
11 de maio de 2008
9 de maio de 2008
125 anos de José de Cluny /Novo Jornal/ 9 de Maio de 2008


Em Janeiro de 1883, aportaram a Landana, as primeiras religiosas das irmãs da Congregação das Irmãs de S. José de Cluny.
Foi o princípio de uma presença continuada de 125 anos de uma Congregação, iniciada em França, mais propriamente em 11 de Novembro de 1789, na esteira da vitória dos republicanos e jacobinos na revolução francesa.
A história da fundação desta Ordem, tem origem precisamente num episódio, relacionado com uma pretensa perseguição a membros do clero por parte dos republicanos franceses, o que leva a que a bretã Ana Maria Javouey, tenha feito voto para se dedicar ao missionarismo, tendo sido a sua primeira Madre Superiora.
Segundo o professor Martins dos Santos no seu excelente trabalho “Cultura, Educação e Ensino em Angola” diz a páginas tantas “No dia 15 de Maio de 1885, embarcaram em Lisboa, com destino a Angola, a bordo do vapor África, três religiosas de S. José de Cluny, que nos aparecem no documentos da época sob a designação de Irmãs Educadoras, por se dedicarem especialmente à obra educativa e às actividades escolares. Destinavam-se às colónias do planalto sul. O governador do distrito de Moçâmedes, Sebastião Nunes da Mata, empregou toda a sua influência para as reter na cidade, demovendo-as de se transferirem para o interior. Conseguiu os seus intentos e as religiosas estabeleceram-se ali, abrindo pouco depois a sua primeira escola. Segundo certas indicações que conseguimos obter, foi no dia 8 de Julho desse ano de 1885 que se fixaram em Moçâmedes. Foi a primeira povoação angolana a aproveitar-se da meritória acção das Irmãs Educadoras, se exceptuarmos a missão de Lândana, onde se estabeleceram em 1883, portanto dois anos mais cedo.”
Ainda se podia ler mais: “ No decorrer de 1897, chegaram a Angola algumas religiosas de S. José de Cluny, que se destinavam a Moçâmedes. O governador-geral António Duarte Ramada Curto, com o apoio de outros elementos de influência na cidade, instou com elas para se fixarem em Luanda. Desejava que abrissem uma escola, o que efectivamente fizeram; começou a funcionar no dia 1 de Dezembro desse ano, na Rua da Misericórdia.”
“Ainda a propósito dos referidos exames, o governador-geral Ramada Curto louvou, por portaria de 16 de Maio de 1900, as Irmãs Educadoras, nos termos seguintes: "Tendo eu confiado, em Dezembro de 1897, às Irmãs Educadoras, da Congregação de S. José de Cluny, a regência da cadeira de ensino primário, do sexo feminino, da cidade de Luanda, fechada por falta de alunas, e tendo presenciado o aumento sempre crescente do número de crianças matriculadas, vistas as informações prestadas com respeito à competência das professoras e aproveitamento das alunas, hei por conveniente louvar as Irmãs Educadoras, da referida congregação, que têm regido a escola, e em especial a superiora, Ir. Antónia Maria George, pelo zelo, competência e inteligência que têm demonstrado na regência da escola que lhes confiei". As Irmãs Educadoras agrupavam os seus alunos em cinco classes, conforme o seu adiantamento escolar. Por curiosidade, inserimos aqui o esquema do estudo ministrado: —Leitura, escrita e rudimentos de doutrina cristã; —Prática de ler, escrever e contar, e doutrina cristã; —Ler, escrever e contar, doutrina cristã e trabalhos manuais; —Gramática portuguesa, tabuada, aritmética, doutrina cristã e trabalhos manuais.”
Esta foi de uma forma sintética a relação das “madres” com a educação em Angola até à assinatura da Concordata de 10 de Julho de 1940, entre Portugal e a Santa Sé, onde se anexava o Acordo Missionário, que deu à Igreja Católica todas as facilidades e mordomias várias no ensino nas colónias, em detrimento de muitas outras confissões religiosas que ao tempo já trabalhavam na colónia, com algum empenho, tendo algumas sido perseguidas e os seus pastores e missionários presos ou expulsos dos territórios.
No fim dos anos 40, tendo em conta a exiguidade das instalações na Misericórdia, e com grande empenhamento do Monsenhor Alves da Cunha (aproveito para lembrar que parte das letras da peanha da sua estátua caíram, pelo que não seria mau que fossem lá colocadas de novo), foi-lhes dado um terreno na Rua do Kafako, que é nem mais nem menos que o nome muito antigo da rua que desemboca na Rua da Missão.
Ali se construiu um edifício de gosto revivalista-classizante, exemplar de “Arquitectura do Estado Novo”, vulgarmente conhecida pelo gosto “Português Suave”, que dada a sua volumetria, os seus portais, arcadas, frontões, torreões e pináculos é um edifício marcadamente matizado na paisagem urbana.
Desde 1953 até 1975, no colégio de S. José de Cluny em Luanda leccionou-se a raparigas desde a instrução primária até ao 5º ano do liceu, como era costume dizer-se ao tempo, em regime de externato, havendo também algumas alunas internas.
Esse edifício, que foi a seguir à Independência do País o Instituto Pré-Universitário de Luanda, foi entregue à Igreja Católica, aquando dos acordos entre o governo e o Papa Woityla, na sua passagem por Luanda no início dos anos 90.
Desse acordo, surgiu a possibilidade da instalação da Universidade Católica no edifício que sofreu para o efeito inúmeras obras de reparação e beneficiação.
No Huambo também foi criado no fim dos anos 50 um colégio com as características do de Luanda, também orientado pelas” irmãs de Cluny”, que para além destes colégios mais emblemáticos, tinham outros espalhados pelo território de Angola, como por exemplo em Cabinda, Namibe e Malange.
Muitas alunas passaram pelos colégios e internatos da “Congregação das Irmãs de S. José de Cluny”, o que não deixa de ser relevante em trabalhos futuros que se façam sobre o ensino em Angola, pois a sua presença durante 125 anos, perpetuou uma obra que merece cuidado respeito.
Fernando Pereira
7/05/07
Dar Asas à Memória IV/ Ágora/ Novo Jornal/ 9 de Maio 2008


Dar Asas à memória (IV)
É claro que no meio destes hotéis dos anos 50, ainda temos o “eterno” Hotel Globo, que convenhamos é um nome muito esquisito, e se bem me lembro do logótipo é a tromba de um elefante a pegar num globo, numa imitação afro-colonial do “Grande Ditador “ do Charlie Chaplin. O “Hotel Europa”, um nome muito adaptado à realidade(???), e que fica em frente ao Hotel Continental, e que era o hotel preferido das primeiras núpcias dos colonos que casavam por correspondência, e recebiam cada encomenda que alguém com comenda se queria livrar na “santa terrinha”; O bar no andar de baixo era o “arame farpado afiadíssimo” de tudo o que se passava na recepção, e convenhamos que as conversas não deviam ser sobre estética de poesia.
Havia ainda o Hotel Paris, que de hotel talvez tivesse apenas o nome e uma casa de banho privativa para o primeiro hóspede de dez quartos que a ocupasse, e que curiosamente é quase paredes meias com o Hotel Central, que rivalizava em qualidade. O Hotel Luso, que era uma casa cor de rosa engraçada , ali perto do Largo das Ingombotas, o Hotel Magestic, que era ali para os lados de S. Paulo e tinha muitas “limusines”de 15 toneladas à porta desde Pegasos, Bedfords, MANs,Fargos, Volvos, Mercedes, enfim muita “traseira” com encerado, e que tinha uma cervejaria anexa que era um local de grandes disputas de encanadores de “canhangulos”, uma medida de cerveja só disponível para os futuros “companheiros da cirrose”
Timidamente e com alguma “decência” lá foi aparecendo o Turismo e depois o Continental, mas isso já foi mais nos sessentas.
Este artigo é engraçado, começou com o aterrar no “Aeródromo Emílio de Carvalho” e no levantar no projecto do Keil do Amaral e do Simões de Carvalho do que foi o “Aeroporto Craveiro Lopes”, com um painel notável do Neves de Sousa no seu interior, e que é hoje o “Aeroporto 4 de Fevereiro”, com outro movimento, com outras gentes, com outros aviões, com outros pensares, mas às vezes com as mesmas ambições, o que é preocupante.
Como digo no início desta série de artigos, eu não conheci muitas destas coisas que falo com vida, mas ouvi e fui apreendendo. Quando passo nos locais, olho para as que ainda vão subsistindo, e lembro-me do que me foi contado sobre uma cidade, e vem-me à memória a saudade de um determinado futuro, que não passasse por deitar abaixo estruturas que foram poiso de outros ócios e outros negócios, mas que ainda fazem a alma da cidade a alguns.
Fernando Pereira 8/04/08
2 de maio de 2008
Dar Asas à Memória III/ Ágora/ Novo Jornal/ 18 Abril 2008


Dar Asas à memória (III)
Já que se fala de hotéis de Luanda dos anos 40 e 50, que tal lembrar o Miradouro, onde hoje é a sede da DNEFA, e que foi nos tempos do colonialismo a delegação da PIDE-DGS, de má memória a tanto angolano; É o que se chama o edifício de concepção errada, no local certo, e teria sido tão fácil faze-lo um hotel de referencia em Luanda, se tivessem tentado copiar as características fundamentais das características arquitectónicas da embaixada britânica ali mesmo ao lado, aliás um excelente exemplar de casa colonial vitoriana.
Nos anos 50 começaram a despontar na Luanda que prosperava, com a subida do preço dos produtos angolanos no mercado internacional, nomeadamente o café, um conjunto de empresários da hotelaria, ou melhor uns arrivistas que apostavam no ramo. O sobredimensionado Trigo, um espanhol, que aparece em Luanda e abre o Hotel Universo, ali na Rua Cirilo Conceição e Silva, em frente ao Nogueira Lda. (uma firma que era um império na RDC, e que começou por ter um barco-loja que subia e descia o rio Zaire sempre a vender e a reabastecer-se). Conheci este hotel muito bem pois foi meu poiso em miúdo, até vir viver para Luanda em 1963, e conheci muito bem o Trigo, que era de uma simpatia extrema, e que em determinada altura criou nas traseiras do seu “Universo” uma casa de fados, o “Pateo”, um nome castelhano para um local onde se cantava uma canção tipicamente portuguesa. Para além da casa de fados, o Trigo, abriu um night-club, que foi um excelente complemento para os negociantes do café selarem bons contratos, em que a líbido e o álcool, tantas vezes marado, proporcionavam excelentes mais-valias a muitos e quiçá a muitas, com a utilização frequente à velha “táctica do peru”.
Abre no inicio dos anos 50, na Avenida do Hospital (Av. da Assembleia Nacional), o “Hotel Angola”, estabelecimento de “elevada classe”, propriedade do Sr. Cunha, conhecido em Luanda pelo Cunha dos Caixões, pois era proprietário de uma funerária, a primeira já com algum “know-how” na matéria, como hoje é frequente dizer-se. O slogan, e creio que isto é quase má língua, é que com o aparecimento da funerária Cunha houve frases “tranquilizantes” e “edificantes” do tipo: “Agora já se pode morrer em Luanda” ou “ O Cunha trata de si na horizontal”, ou ainda “Vivo ou morto, Cunha ao seu serviço!”. Sem querer entrar muito em detalhes acho que é mais um paradoxo do sistema colonial, que é o “Cunha ter tanta importância na vida como na morte” e a mais sarcástica de todas “Cunha sempre consigo”.
O Hotel Angola, vivia paredes meias com a Pensão Sirius, e tinha umas varandas aprazíveis no rés do chão, um bar onde havia fados e uns dedilhadores de violas e guitarras, que tinham o condão de incomodar os hóspedes do hotel até às tantas da noite, quando toda a gente sabe que em Luanda o cedo erguer é quase desde tempos imorredoiros uma instituição, e a verdade é que praticava preços altíssimos, pouco compatíveis com a qualidade dos serviços prestados, já que os a prestar julgo que eram dispensáveis por todos!!!
Como os “hóspedes” da funerária reclamavam menos que os do “Hotel Angola”, e davam mais rendimento, o Cunha resolveu alienar o edifício para as instalações da Polícia Judiciária, que depois se transformou em DINIC, que ao passar para o edifício recentemente “colapsado”, deixou no seu lugar à Procuradoria Militar, actual proprietária do edifício, por sinal interessante do ponto de vista arquitectónico.
26 de abril de 2008
Dar Asas à Memória II/ Ágora/ Novo Jornal/ 18 Abril 2008

Dar Asas à memória (II)
Voltando à Luanda dos primeiros 50 anos do sec.xx, vem à “lembradura” dos mais velhos, a “horta do Raposo”, a “Casa dos Contos”, onde funcionou a repartição de Fazenda, a “Casa dos Lencastres”, e o “Palácio dos Fantasmas”, o mercado do “Kaponte” e ainda o tiro de canhão da fortaleza para dar o meio dia à cidade. O bairro do “Zangado”, o “Braga”, as marchas do “Kazecuta” ou a “Caxa Corneta”, marchas carnavalescas dos antigos, já não são nostalgias, porque quem as viveu, já quase não está cá para contar. A estação da cidade Alta, onde depois funcionou uma feira popular muito fraquinha, mas que foi onde pela primeira vez na vida ganhei uma resma de panelas, algo que nunca mais sucedeu. Sorte de principiante!
Este “folhetim”começou com o “Aeródromo Emílio de Carvalho”, e daí começámos a lembrar divagando e “devagarando” a Luanda de outras eras.
Essa “Linha Imperial” ao tempo fazia Lisboa a Luanda quase 31h, uma vez por semana, patindo o avião numa rota esquisitíssima por Leopoldville (Kinshassa),Elizabethville (Kissangany), Salisbury (Harare) e Lourenço Marques (Maputo), onde a tripulação descansava um dia e ei-los de volta pelos mesmos lugares até Lisboa, com uma paragem em Luanda de um dia e duas noites.
Inicialmente as tripulações ficaram no Hotel Avenida, ali na baixa, na Rua Sequeira Lukoki, e que segundo se dizia era “ o melhor de Luanda”, e em que os hóspedes reafirmavam que era um “hotel que reunia todas as carências e todos os factores negativos indesejáveis para um hotel condigno”.
Passaram depois pelo “Grande Hotel de Luanda” ali para os lados da Rua dos Mercadores, que está hoje em adiantado estado de degradação, e aqui lembro-me duma sala de jantar notável, com uns desenhos lindíssimos na parede de uma sala avarandada, que dava para um magnífico quintal com umas mesas debaixo de um caramanchão de buganvílias cor de rosa. Era de facto um excelente edifício, exemplar de um tempo em que se revelava algum bom gosto por parte de certa burguesia na capital.
Nesse tempo, ar condicionado só havia em edifícios governamentais, a luz ia e vinha, coisa que não faziam os mosquitos que vinham e ficavam, e nem os mosquiteiros aguentavam os seus assaltos. Era o tempo dos Petromax e das velas, que com a humidade deixavam um cheiro característico que incomodavam quem visitava Luanda, pela primeira vez.
No deambular por hotéis, os protagonistas destas aventuras, referenciavam ainda o “Atlantic Palace Hotel”, que era um edifício marcante, e que já foi abaixo, e que era um dos mais bonitos exemplares de “Arte Nova” em Luanda, ali na Rua Direita de Luanda (Muito mal chamada de Major Kanhangulo, pois era chamada de Rua Direita, porque foi a primeira “avenida” da urbe. Era rua direita porque todas as outras eram tortas). Esse hotel tinha uma varanda lindíssima, onde debaixo de uma pérgula de uma linda trepadeira, frente a um jardim de palmeiras, se tomava o melhor café de Luanda, segundo rezam as crónicas, e onde se congeminavam independências de Angola quase mensalmente, tendo sempre como factor de unidade a base do cálice de um qualquer cognac francês ou português de Gaia.
22 de abril de 2008
19 de abril de 2008
Dar Asas à Memória I/ Ágora/ Novo Jornal/ 18 Abril 2008

Dar Asas à memória (I)
Este artigo vai ser por episódios, por limitações inerentes à paginação do jornal, e porque resolvi dar uma volta a uma Luanda de outros tempos, que eu não vivi, mas que tento reproduzir de conversas que fui ouvindo ao longo de anos, em muitos lugares onde se passei e fui retendo imagens e sons para “memória futura”, que aqui tento reproduzir.
Começo pelo primeiro “aeroporto” de Luanda .Foi o “Aeródromo Emílio de Carvalho”, que teve inicialmente uma pista de aterragem de 600 metros, em macdame, que segundo diziam os aviadores dos Dakotas do fim dos anos 40, era apenas um lugar de “talvez”, pois eram imprevisíveis os resultados do aterrar ou levantar das aeronaves com segurança. Para além de ser uma pista “liliputeana”, havia o acrescido perigo com os buracos, não porque estivesse permanentemente esburacada, mas porque a pista teria sido construída sobre um antigo cemitério, o que permitia que não raras vezes o avião, ficasse com rodas do trem de aterragem dentro dessas covas com quase 2 metros de profundidade, o que naturalmente levantava problemas gravíssimos para a substituição pronta de peças.
Na “Linha Imperial”, nome que o general Humberto Delgado hiperbolicamente designou a rota aérea, pelas então colónias portuguesas em África, a TAP teve necessidade de passar a operar com o avião Skymaster, e houve necessidade de construir paralelamente á pista existente, uma outra de 1000m, em que este tipo de aviões pudesse operar sem grandes problemas.
Este “Aeródromo”, tinha as suas instalações no local onde hoje está instalada a Unidade Operativa Central dos Bombeiros, onde ainda se pode ver o que resta do hangar. A pista ocupava o terreno onde hoje se encontram alguns edifícios governamentais, escolas, pelo que o espaço aeroportuário era entre a Avenida Comandante Gika e a“Tourada”.
Era a cidade do “Comboio-bébé”, que percorria lentamente a marginal até à Igreja do Cabo, os “maximbombos” do Crista, o “batelão”, a loja do “Simão”, a tresandar a fuba, o “Catonho-Tonho”, vendilhão de anzóis, os gasolinas da “Carolina” nas “portas do mar”, a “Ponta da Mãe Isabel”, hoje Porto de Luanda, o Largo da Mutamba, com o seu caramanchão de buganvílias lilazes, a secular mulembeira, que albergava os táxis do “Costa Leite”, enfim dos tempos de uma cidade de salubridade duvidosa, pequenina, maneirinha e maldizente.
O coreto da Portugália com o Sambo a tocar, a lagoa do Kinaxixe, e a sua mulembeira, onde o velho Carmona tinha a sua máquina “a la minute”, que era nem mais nem menos que um balde, umas molas, um banco, uma corda, bem um equipamento que anos mais tarde foi substituído pela Polaroid, e que a digitalização arrumou em jeito de desforra desses fotógrafos que até fato e gravata tinham para fazer “o boneco”. Era a cidade das barrocas da “Companhia Indígena”, os “poços da Maianga, onde melhor era representada a estratificação social, pois havia o poço do rei, e a Maianga do Povo, mas que em determinada altura ambos esgotaram as suas reservas, dado o crescimento populacional da cidade. Hoje restam as ruínas no meio do casario, uma ali na subida do Catambor e outra na subida do Prenda.
De forma marginal, e aqui nas minhas confabulações com quem me lê, não deixa de ser para mim uma questão que pretendo ver desenvolvida, que é o facto de Luanda ser das poucas cidades capitais em África que não tem um rio no seu perímetro urbano!!!
Este artigo vai ser por episódios, por limitações inerentes à paginação do jornal, e porque resolvi dar uma volta a uma Luanda de outros tempos, que eu não vivi, mas que tento reproduzir de conversas que fui ouvindo ao longo de anos, em muitos lugares onde se passei e fui retendo imagens e sons para “memória futura”, que aqui tento reproduzir.
Começo pelo primeiro “aeroporto” de Luanda .Foi o “Aeródromo Emílio de Carvalho”, que teve inicialmente uma pista de aterragem de 600 metros, em macdame, que segundo diziam os aviadores dos Dakotas do fim dos anos 40, era apenas um lugar de “talvez”, pois eram imprevisíveis os resultados do aterrar ou levantar das aeronaves com segurança. Para além de ser uma pista “liliputeana”, havia o acrescido perigo com os buracos, não porque estivesse permanentemente esburacada, mas porque a pista teria sido construída sobre um antigo cemitério, o que permitia que não raras vezes o avião, ficasse com rodas do trem de aterragem dentro dessas covas com quase 2 metros de profundidade, o que naturalmente levantava problemas gravíssimos para a substituição pronta de peças.
Na “Linha Imperial”, nome que o general Humberto Delgado hiperbolicamente designou a rota aérea, pelas então colónias portuguesas em África, a TAP teve necessidade de passar a operar com o avião Skymaster, e houve necessidade de construir paralelamente á pista existente, uma outra de 1000m, em que este tipo de aviões pudesse operar sem grandes problemas.
Este “Aeródromo”, tinha as suas instalações no local onde hoje está instalada a Unidade Operativa Central dos Bombeiros, onde ainda se pode ver o que resta do hangar. A pista ocupava o terreno onde hoje se encontram alguns edifícios governamentais, escolas, pelo que o espaço aeroportuário era entre a Avenida Comandante Gika e a“Tourada”.
Era a cidade do “Comboio-bébé”, que percorria lentamente a marginal até à Igreja do Cabo, os “maximbombos” do Crista, o “batelão”, a loja do “Simão”, a tresandar a fuba, o “Catonho-Tonho”, vendilhão de anzóis, os gasolinas da “Carolina” nas “portas do mar”, a “Ponta da Mãe Isabel”, hoje Porto de Luanda, o Largo da Mutamba, com o seu caramanchão de buganvílias lilazes, a secular mulembeira, que albergava os táxis do “Costa Leite”, enfim dos tempos de uma cidade de salubridade duvidosa, pequenina, maneirinha e maldizente.
O coreto da Portugália com o Sambo a tocar, a lagoa do Kinaxixe, e a sua mulembeira, onde o velho Carmona tinha a sua máquina “a la minute”, que era nem mais nem menos que um balde, umas molas, um banco, uma corda, bem um equipamento que anos mais tarde foi substituído pela Polaroid, e que a digitalização arrumou em jeito de desforra desses fotógrafos que até fato e gravata tinham para fazer “o boneco”. Era a cidade das barrocas da “Companhia Indígena”, os “poços da Maianga, onde melhor era representada a estratificação social, pois havia o poço do rei, e a Maianga do Povo, mas que em determinada altura ambos esgotaram as suas reservas, dado o crescimento populacional da cidade. Hoje restam as ruínas no meio do casario, uma ali na subida do Catambor e outra na subida do Prenda.
De forma marginal, e aqui nas minhas confabulações com quem me lê, não deixa de ser para mim uma questão que pretendo ver desenvolvida, que é o facto de Luanda ser das poucas cidades capitais em África que não tem um rio no seu perímetro urbano!!!
13 de abril de 2008
A JOTA DOS RETORNADOS/ÁGORA/NOVO JORNAL


A Jota dos retornados
De uma penada, assistiu-se no panorama literário da escrita lusófona ao aparecimento da escrita da geração dos filhos dos que abandonaram Angola, vulgarmente conhecidos em Portugal pelos “Retornados”.
Li em pouco tempo um conjunto de dois livros, que estão em lugares de relevo nos escaparates das livrarias portuguesas:”Ultimo ano em Luanda” do Tiago Rebelo e “Os Retornados” do Júlio Magalhães.
O Tiago Rebelo, em termos literários para mim não era um desconhecido pois já tinha lido um seu romance, interessante num contexto de neófito da escrita, “O Tempo dos Amores Perfeitos”, em que a acção se desenrola no fim do século XIX, entre Luanda, Malange e a Lunda. Posso adiantar que o livro é prazenteiro, mas em certos aspectos deixa-se assemelhar a algo do tipo”Emílio Salgari em África”, na sua versão entusiasmante de Sandokan. Em relação ao seu mais recente livro sobre Luanda de 1975, é só um romance, adornado aqui e ali com umas pinceladas à Reis Ventura, misturadas com Pompílio da Cruz, João dos Reis, Mello Machado ou Valdemiro de Sousa, entre tantos outros escrevinhadores que resolveram escrever a esmo sobre “os malfadados Abril de 1974 e Novembro de 1975”!
“O Ultimo Ano em Luanda”, é um romance que fica muito aquém do seu primeiro trabalho, quer no discurso, quer na verosimilhança da história, e o repisar constantemente, que “os movimentos de libertação praticamente já tinham desaparecido”, é uma afirmação que dá vacuidade à tentativa de alinhamento com a história.
Numa análise breve ao livro “ Os Retornados”, posso afirmar que é um livro de histórias ouvidas, caldeadas, e no fim o que se pode dizer é que é um romance light sobre “indas e vidas”, mas também com enormes imprecisões, nos sucessivos contextos onde decorre a história do livro. O Júlio Magalhães é um excelente jornalista de um canal de televisão português, é plausível que continue a escrever, e certamente fascinado pela vivência da sua meninice em Luanda e no Lubango, irá fazer trabalhos que certamente poderão merecer mais encómios que este.
Estes livros, são escritos por duas pessoas que deixaram Angola num contexto complicado, mas acima de tudo embarcaram para outras paragens na puberdade, pelo que tudo o que escreveram, foi fruto do que foram ouvindo repetidamente em suas casas, e também no contexto das suas relações pessoais de então, associado a imagens algo desfocadas da infância.
O fascínio por África, tão presente na sociedade portuguesa de hoje, é um terreno fértil para o aparecimento destes romances, um pouco na esteira do sucesso do “Equador” do Miguel Sousa Tavares.
Convenhamos que estes romances enquadram em Angola, um pouco a sociedade do “Out of Africa”(!985),misturado com o “Dark of Sun”, traduzido para português pelo “Ultimo Comboio do Katanga”(1968).
Sem ser o meu género de leitura, posso afirmar que li de forma agradada, o livro do Júlio Magalhães, que recomendo sem qualquer reserva.
No contexto temporal dos romances citados, julgo oportuno recomendar a leitura do Ryszard Kapuscinski, no seu 1975-Angola/ Mais um dia de vida, recentemente reeditado pelo Campo das Letras em Portugal, que é o melhor livro sobre esse período que antecedeu a independência de Angola, opinião naturalmente subjectiva, mas amplamente partilhada.
Fernando Pereira 1/4/2008
De uma penada, assistiu-se no panorama literário da escrita lusófona ao aparecimento da escrita da geração dos filhos dos que abandonaram Angola, vulgarmente conhecidos em Portugal pelos “Retornados”.
Li em pouco tempo um conjunto de dois livros, que estão em lugares de relevo nos escaparates das livrarias portuguesas:”Ultimo ano em Luanda” do Tiago Rebelo e “Os Retornados” do Júlio Magalhães.
O Tiago Rebelo, em termos literários para mim não era um desconhecido pois já tinha lido um seu romance, interessante num contexto de neófito da escrita, “O Tempo dos Amores Perfeitos”, em que a acção se desenrola no fim do século XIX, entre Luanda, Malange e a Lunda. Posso adiantar que o livro é prazenteiro, mas em certos aspectos deixa-se assemelhar a algo do tipo”Emílio Salgari em África”, na sua versão entusiasmante de Sandokan. Em relação ao seu mais recente livro sobre Luanda de 1975, é só um romance, adornado aqui e ali com umas pinceladas à Reis Ventura, misturadas com Pompílio da Cruz, João dos Reis, Mello Machado ou Valdemiro de Sousa, entre tantos outros escrevinhadores que resolveram escrever a esmo sobre “os malfadados Abril de 1974 e Novembro de 1975”!
“O Ultimo Ano em Luanda”, é um romance que fica muito aquém do seu primeiro trabalho, quer no discurso, quer na verosimilhança da história, e o repisar constantemente, que “os movimentos de libertação praticamente já tinham desaparecido”, é uma afirmação que dá vacuidade à tentativa de alinhamento com a história.
Numa análise breve ao livro “ Os Retornados”, posso afirmar que é um livro de histórias ouvidas, caldeadas, e no fim o que se pode dizer é que é um romance light sobre “indas e vidas”, mas também com enormes imprecisões, nos sucessivos contextos onde decorre a história do livro. O Júlio Magalhães é um excelente jornalista de um canal de televisão português, é plausível que continue a escrever, e certamente fascinado pela vivência da sua meninice em Luanda e no Lubango, irá fazer trabalhos que certamente poderão merecer mais encómios que este.
Estes livros, são escritos por duas pessoas que deixaram Angola num contexto complicado, mas acima de tudo embarcaram para outras paragens na puberdade, pelo que tudo o que escreveram, foi fruto do que foram ouvindo repetidamente em suas casas, e também no contexto das suas relações pessoais de então, associado a imagens algo desfocadas da infância.
O fascínio por África, tão presente na sociedade portuguesa de hoje, é um terreno fértil para o aparecimento destes romances, um pouco na esteira do sucesso do “Equador” do Miguel Sousa Tavares.
Convenhamos que estes romances enquadram em Angola, um pouco a sociedade do “Out of Africa”(!985),misturado com o “Dark of Sun”, traduzido para português pelo “Ultimo Comboio do Katanga”(1968).
Sem ser o meu género de leitura, posso afirmar que li de forma agradada, o livro do Júlio Magalhães, que recomendo sem qualquer reserva.
No contexto temporal dos romances citados, julgo oportuno recomendar a leitura do Ryszard Kapuscinski, no seu 1975-Angola/ Mais um dia de vida, recentemente reeditado pelo Campo das Letras em Portugal, que é o melhor livro sobre esse período que antecedeu a independência de Angola, opinião naturalmente subjectiva, mas amplamente partilhada.
Fernando Pereira 1/4/2008
9 de abril de 2008
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