17 de agosto de 2008

Desenho de Vasco Vieira da Costa / Quitandeira


Publicado na Revista de Natal de 1936 da "Província de Angola"
Importa referir que foi o Vasco Vieira da Costa, o arquitecto que desenhou o mercado do Kinaxixe de boa memória!
Prestando um tributo a uma pessoa extraordinária que conheci, aqui fica este desenho de quem amou sempre muito Angola!

Anuncio do Hotel Terminus no Lobito!


Publicado pelo Jornal "O Lobito", em 1932, uns tempos depois da sua inauguração!

16 de agosto de 2008

Vírgula (,)



Hoje vou falar a vocês sobre um assunto que tem preocupado alguns comentadores da imprensa escrita na capital de Angola porque a bem dizer só mesmo em Luanda é que há jornais e toda a gente do País reclama porque só se discute questões da imprensa e outra na cidade de Luanda onde levam a sério algumas coisas relacionadas com questões onde o papel entre o continuo e o continuado voltou outra vez à ordem do dia provavelmente por alguém bem mais ligado á noite que ao dia pois não foi o nosso continuo quiçá talvez o continuado que andou nos copos com o Joãozinho das garotas ali para os lados em que a ilha ainda não tinha a Kinanga num sítio desprofusamente iluminado onde um amigo meu dizia que havia um buraco num balcão de um bar tantas foram as noites em anos a fio que ele lá ia nos tempos do antanho enquanto o pobre do contínuo se esforçava por ir aprendendo a talvez um dia poder ser alguém mas que em circunstancia alguma pudesse ser como o continuado que depois da independência continuou mesmo a desancar em contínuos apesar de colocar primeiras páginas em livros e jornais que o fazem longe do Mukandano do China que foi republico no Kimbo dos Sobas e também longe do Kapitupitu dum tempo de outros azedumes mas que eram respeitadores pelos contínuos e que eram motivo de orgulho de todos que chegassem a directores de alguma coisa por mérito e que depois irritassem o desbocado continuado que decidiu atirar farpas para todo o lado evitando lembrar-se que muita gente cresceu com o continuo e que ele habituou a respeitar e a ser respeitado todos os que com ele colaboraram ali naquele lugar em frente à Biker onde em tempos se garfavam uns bifes entre garrafas longe dos engarrafamentos ideológicos dos que desceram da montanha 30 anos depois para descobrirem os contínuos que é quase o mesminho que muitos vieram na paz a buscar as coisas que a guerra por direito deu a alguns outros que não podem ver usurpados os seus direitos como as casinhas que ficaram fechadinhas com quase nada lá dentro e que eram saudades no Rossio e pelos vistos nalguma casa com nome de proboscídeo branquelas ali para os lados dum dos Condes da capital do Império o Redondo onde também andava o continuado a esconjurar os contínuos que na Luanda andavam numa azáfama na busca da virgula entre o predicado e o adjectivo para além de advérbios de maus modos porque a vida lhes tinha sido madrasta e toda a vida tinha de ser exactamente assim porque os iluminados queriam que assim fosse nem que se tivessem que revelar tardiamente a descoberto num jornal em que o continuo foi galgando os degraus até chegar a director geral por ter ido aprender coisas que o continuado teve de mão a beijar ou beijada nos tempos do antes de Novembro da independência quando o nosso continuado insultava muito boa gente onde também cabia alguma má que nestas coisas leva pela medida grossa e quando não gosta faz exactamente o mesmo trinta anos depois ao continuo que é director deste jornal depois de muitos anos a aguentar um jornal para hoje o continuado ir lá afiar setas contra todos num linguajar típico de locais pouco asseados de educação falada e até mesmo revelador de alguma arteriosclerose a merecer alguma consulta no centro de saúde de qualquer Boavista de qualquer cidade onde o continuado comece a ser recolhido para saber que o tempo e os espaços para a maledicência podem mesmo ficar-se pelos tempos do Ary Lopes e Glória Norton que era uma moça de carnes descaídas que dava shows ali num local onde a ilha acabava num paredão e num coqueiro no outra ponta da outra pontaria da ilha de Luanda(,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,)Aqui estão as vírgulas pelo que as ponham onde melhor vos aprouver!

Desculpem hoje não ter usado a vírgula, mas precisava de enviar um bom abraço de solidariedade ao Vítor Silva, pessoa que estimo e que sempre me convidou para participar nos projectos que liderava, sem me pedir nada em troca, já há quase trinta anos, e não merecia estes dislates, lastimavelmente publicados num jornal onde foi praticamente tudo que podia ser.
Já agora, informo que não voltarei ao tema!

Fernando Pereira

11 de agosto de 2008

Ensaboadela / Ágora / Novo Jornal / Luanda 9-8-08



Dessei porque razão o faço, mas hoje estou com um irreprimível desejo de passar uma esponja por muita coisa, porque a não o fazer corria o risco do “sapateiro ir além da chinela”.
Quando falo em esponja, sugeriu-se-me a ideia de falar do sabonete “Lifebuoy” , essa verdadeira instituição que a Lever lançou no mercado no dealbar do século XX, e que se assumiu como um dos símbolos perenes de uma globalização, que sobrevive com sucesso nos dias de hoje.
Foi o primeiro a definir-se contra qualquer tipo de CC, como se pode ver em inúmeros anúncios nas décadas de trinta e quarenta, do tempo em que quando alguém falava do Kinaxixe, era da sua lagoa e da sua enorme Mafumbeira, a título de exemplo. Convenhamos que CC nada tinha a ver com aquilo que vamos conhecendo com os inerentes contornos político-partidários, mas no caso do Lifebuoy era apenas o apelo ao fim do CC, que é nem mais nem menos que o “cheiro a corpo”.
No seu primeiro anúncio radiofónico, tinha uns verso cantado em brasileiro que dizia isto:”Quando chega o verão/ e aperta o calor, / transpira-se tanto/ que é mesmo um horror/Para então se manter/ o asseio corporal, / é preciso se usar/ um sabonete o asseio corporal, e batatal./ É mesmo o tal, não tem rival/ é um herói:/ Lifebuoy, Lifebuoy!”.Isto é coisa aí para os anos 30, nos tempos áureos da rádio.
Bem, o Lifebuoy marcou todas as gerações do século XX, e de facto no nosso País tem sido perpetuado ao longo de mutações económicas, políticas e sociais bem diferenciadas, apesar de circunstancialmente os protagonistas serem os mesmos, até mesmo na diversidade total, mas jamais na adversidade.
Como estamos a falar de sabonetes e correlativos, e de um especificamente cor de laranja, o que lhe dava algumas características muito peculiares de não-alinhamento a determinadas cores de modas, prefiro mesmo continuar a enaltecer as características do anti-CC Lifebuoy.
Este ousado sabonete que foi por mim usado no corpo e que em determinados momentos usei em tudo, desde roupa a louça ou chão, emergiu como um factor de enorme unidade, pois este sabão cor de laranja, de odor intensíssimo e inigualável, comprava-se em qualquer parte do mundo, pois a Lever não brincava em serviço e expandiu-o por todos os cantos e por alguns menores encantos.
Hoje em Angola, os indianos, não sei se já com tiques de cidadãos de potencia emergente, no quadro do BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China), decidiram vendê-lo também de azul e branco, o que de certa forma retira alguma “legitimidade” ao Lifebuoy, mas são os ditames do mercado a exigir novas dinâmicas, como agora é frequente dizer-se, mesmo que muitos nem nunca tenham ouvido falar em Keynes, Adam Smith e talvez em Marx (Deste alguns devem ter ouvido falar, ou a bem dizer falaram em tempos idos demais dele!!!)
Voltado ao sabonete, que passa a vida a saltar-nos da mão enquanto molhado, pelo que é conveniente ter alguns cuidados supletivos, posso afiançar que este Lifebuoy, para além do facto incomodativo de fazer arder nos olhos, é um excelente anti-séptico, e de excelente qualidade para limpar o corpo de transpiração e odores.
Talvez não seja o odor da moda, mas convenhamos que a sua embalagem exterior vai-se mantendo mais ou menos igual desde os tempos em que apareceu, em que logo foi um sucesso comercial.
Desculpem-me, eu hoje ter-vos dado esta ensaboadela, mas sinceramente preferi mesmo falar disto, pois acho que de quando em vez, temos mesmo que colocar algo, para que o resultado de passar a esponja sobre determinados conceitos de desenvolvimento tenha um resultado mais eficiente, nem que seja em benefício próprio.

Fernando Pereira 1/08/08

2 de agosto de 2008

Viva o povo brasileiro /Ágora/ Novo Jornal/ 1/8/08




Aproveitadamente, utilizo este título para homenagear João Ubaldo Ribeiro, que merecidamente, recebeu o prémio Camões, e apenas posso dizer que “Viva o Povo Brasileiro”, é um dos poucos livros que todos devíamos ler, antes de ir para o repouso, que muitos julgam etéreo.
Desvou perder muito tempo a falar do João Ubaldo Ribeiro, porque a partir do momento em que é premiado, toda a gente tenta vasculhar, para saber quem é o escritor.
Para que conste, devorei muitas crónicas suas em jornais, digo-o sem pruridos, plagiei uma parte do seu livro sobre futebol, que era uma colectânea de artigos feitos para a Globo. Sinceramente, não gostei de ler o seu livro mais controverso, “A casa dos budas ditosos”.
Ainda sobre Ubaldo Ribeiro, vem a talhe de foice, uma resposta sua sobre o facto do “Viva o Povo Brasileiro”, ser um livro “obeso” em termos de apresentação, algo que era inabitual em si, ao que ele diz com o humor que o caracteriza, que “Um bom livro tem de se manter sozinho em pé”, e em setecentas páginas, a história do Brasil mescla-se com a nossa e com a portuguesa, duma forma alegre, numa síntese perfeita:” O segredo da Verdade é o seguinte: não existem fatos só existem histórias”.
Já que o assunto, é um circunstancial devaneio sobre as letras brasileiras, não gostava de deixar de mencionar o meu eleito, Graciliano Ramos, que numa resposta em 1948, definiu a escrita apenas nisto: "Deve-se escrever da mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas fazem seu ofício. Elas começam com uma primeira lavada, molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem o pano, molham-no novamente, voltam a torcer. Colocam o anil, ensaboam e torcem uma, duas vezes. Depois enxaguam, dão mais uma molhada, agora jogando a água com a mão. Batem o pano na laje ou na pedra limpa, e dão mais uma torcida e mais outra, torcem até não pingar do pano uma só gota. Somente depois de feito tudo isso é que elas dependuram a roupa lavada na corda ou no varal, para secar. Pois quem se mete a escrever devia fazer a mesma coisa. A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer.".
Graciliano Ramos, numa determinada classe de mestres de literatura anglo-saxónicos liberais, era “um pouco o William Faulkner brasileiro”, numa xenofobia involuntária, mas a realidade, é que ambos trilharam caminhos iguais talvez sabendo pouco um do outro, e ambos foram proscritos por intolerância política nos seus países. Importa salientar que Faulkner foi nas décadas de cinquenta e sessenta, uma referencia de tomo na literatura latino-americana, o que foi excelente, embora isso seja mais evidente na escrita de expressão castelhana do que na portuguesa.
Neste deambular rápido pela escrita, não posso omitir que Jorge Amado foi referente, na minha afirmação ideológica e política, numa fase algo debutante, o que me fez ler com enorme sofreguidão a sua obra completa, e ter relido os seus “Subterrâneos da Liberdade”, obra marcadamente panfletária, e onde o arquitecto Óscar Niemeyer é uma personagem relevante. Penso que a fase final da escrita de Jorge Amado foi deprimente, e sinceramente podia-nos ter poupado, a que tivéssemos que ler Zélia Gatai, essa sim uma poeta menor, não “medíocre”, porque detestaria ser acusado de sobranceria no uso da palavra.
Tendo em conta que se falou de “um livro que se mantenha de pé sozinho”, vou recomendando a leitura de um “com obesidade mórbida”, que tem 900 páginas, mas que foi nos últimos tempos a coisa que mais sono me tirou, tal a “voracidade” com que o li: “As Benevolentes” de Jonathan Littel, que é uma descrição pungente, sem cinismos, da ascensão e queda do nazismo na Europa, descrito por um oficial nazi, que assume tudo sem que no livro se veja qualquer remorso, ou qualquer tentativa ainda que pueril de expiação, por tudo o que fez, assistiu e consentiu e acreditou (Editado em português pela D. Quixote).

Fernando Pereira
28/07/08

27 de julho de 2008

Um poema de David Mestre num postal da UNAP

Cartazes da Republica Popular de Angola (III)

Cartazes da Republica Popular de Angola (II)

Cartazes da República Popular de Angola

O.M.A.

Cartazes da Republica Popular de Angola (I)

Tempo de "Vitória é Certa"

26 de julho de 2008

O Nosso Decatlonista



O nosso decatlonista

Quando, a 6 de Abril de 1896 começavam na Grécia os jogos olímpicos da era moderna, o barão Pierre de Coubertin materializou um sonho, que embora embaciado, de um certo classismo aristocratizante, não deixou de se cobrir de espanto e glória, com a perenidade que já ultrapassou o centenário.
Aproveitando o ensejo de estarmos na antecâmara dos Jogos de Pequim, resolvi escrever um pouco sobre uma figura que foi o primeiro secretário geral do Comité Olímpico Angolano, e figura egrégia no contexto do desporto angolano durante décadas, como praticante, professor e dirigente. Refiro-me ao Fernando Matos Fernandes, com quem tive o privilégio de trabalhar na ex-SEEFD e na zona IV de Desenvolvimento Desportivo da Confederação Africana dos Desportos.
Recuando ao dealbar dos anos 40, vemos o Matos Fernandes como recordista português dos 110 barreiras, 400 barreiras, 400m planos, estafeta de 4x100m, 4x400, altura e no decatlo onde foi campeão por 8 vezes com 6458 pontos, uma marca impressionante para a época. Neste conjunto de disciplinas do atletismo convém salientar que entre 1940 e 1957, não havia quase espaço para a concorrência, pois o então jovem Matos Fernandes, ganhava quase tudo que havia para ganhar. Na disciplina de altura sucedeu no lugar de campeão a outro angolano, ainda vivo, o Guilherme Espírito Santo, que ainda correu e venceu, com Matos Fernandes, o campeonato português na estafeta de 4x100m no ano de 1942.
Por causa deste artigo, tentei recuperar uma caderneta de cromos dos “Ídolos do Desporto”, algo que desconsegui, onde aparecia o Matos Fernandes com a camisola pejada de medalhas, o que para mim com 8 anos era fascinante e permitia todos os sonhos.
Já na segunda metade da sua extensa e brilhante carreira, Matos Fernandes participou em 1952 nos J. O. de Helsínquia, nos 400 m barreiras, onde se ficou pelas eliminatórias e ficou em 16º na final do decatlo, com uns modestos 5604 pontos, muito longe do seu record português. O decatlo é um conjunto de dez provas de várias disciplinas do atletismo, que exige um virtuosismo e um ecletismo só disponíveis a poucos eleitos.
A estrutura física de Matos Fernandes, a sua dedicação ao treino, e outras condições de trabalho, tê-lo-iam guindado a resultados bem diferentes no atletismo internacional. Ao longo de vinte anos de carreira ao melhor nível como praticante, retira-se, e abraça a carreira de treinador, primeiro em Lisboa e depois no Benfica de Luanda.
Com o advento da independência de Angola, Matos Fernandes começa a alijar a sua componente de campo, para se dedicar ao dirigismo desportivo, no âmbito das estruturas oficiais do desporto angolano, nomeadamente no Comité Olímpico, onde trabalhou com os presidentes Augusto Lopes Teixeira (Tutu), e com o José Araújo, o popular “Ben Bareck”, ex-jogador da Académica de Coimbra, que com França (Ndalu), Chipenda e o moçambicano José Júlio, fizeram uma fuga de Portugal, com muitos outros estudantes das colónias portuguesas em 1962, para se juntarem à resistência contra o colonialismo português.
Sobre o Comité Olímpico não resisto a contar uma história curiosa; Perguntei ao Matos Fernandes onde estava um determinado documento, tudo em conversa telefónica, e ele manda-me à 3ª gaveta da sua secretária porque na primeira funcionava a “sede” do Comité Olímpico, na 2ª a “sede” da Zona 4 de Desenvolvimento Desportivo Africano e então na 3ª porque era a que pertencia ao gabinete de apoio do Secretário de Estado, de que na altura Matos Fernandes era chefe de gabinete.
Acho que o desporto angolano vai devendo um pouco a esta gente, que como o Fernando Matos Fernandes, foram cabouqueiros de uma prática desportiva que só se permitiu melhorada por esforços assim, aliado ao enorme investimento que o governo da Angola independente foi fazendo ao longo dos tempos e de excelentes resultados, diga-se em abono da verdade.
Lembro com particular saudade as suas memórias sobre o atletismo “dos anos ontem”, que para as pessoas hoje já são “dos anos antes de ontem”, pois Matos Fernandes já nos deixou há vinte anos. Foi numa dessas conversas que ele me disse que tinha sido o fundador da “filarmónica benfícólica”, que podia bem ser uma coisa do tipo claque organizada, com outros contornos também ligados ao filantropismo e ao apoio aos atletas de todas as modalidades do clube, ao nível da sua vida quotidiana, quando ainda vinha longe o profissionalismo.
Fazer esta crónica tem particular significado, já que tive oportunidade de lembrar o primeiro atleta olímpico angolano, uma pessoa de carácter, e um eterno apaixonado pela prática da cultura física.

Fernando Pereira
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