“O
Novembro que Abril não merecia”
O título
deste artigo é de um livro recente do pinhelense António Avelãs Nunes,
professor catedrático da faculdade de direito da Universidade de Coimbra, homem
de grande probidade intelectual e cívica, resistente antifascista, perseguido e
preso pela PIDE que viu cerceado o seu percurso académico. Um livro
encomendável, porque não existe no restrito meio livreiro, e recomendável pela
excelência da reflexão, e da clareza da irrefutabilidade dos factos.
Há já uns
tempos que vão aparecendo referências a comemorar o 25 de Novembro de 1975,
desde dar nome a ruas, até fazerem-se homenagens a alguns dos que terão estado
na tal “golpaça” , com que muitos sonharam ser um novo 28 de Maio de 1926.
O presidente
da Camara de Lisboa no seu percurso para chegar a primeiro ministro nas
próximas legislativas, depois de varrer Montenegro para debaixo da carpete,
resolve de vez em quando fazer declarações que permitam a discussão publicada,
que imediatamente passa a pública, e que façam esquecer os problemas que ele
não resolve na cidade capital.
Vamos por
partes. Na comemoração do 5 de Outubro de 1910 o Carlos Moedas, resolveu dizer
que Lisboa vai comemorar o 25 de Novembro de 1975. Já há muito que gente que
nunca percebeu muito bem o que foi o 25 do 11, que rejubilou quando ele afirmou
determinado o que iria fazer este ano, 48 anos depois. Será que 48 anos é um
número fétiche para o senhor Moedas?
O general
Ramalho Eanes, homem sério, e esse sim figura proeminente no 25 de Novembro tem
reafirmado que é completamente desnecessário comemorar essa data que o
importante é o 25 de Abril de 1974, essa sim a data de todas as comemorações. O
25-11-1975 foi mais uma igual ao 28 de Setembro de 1974, 11 de Março de 1975,
sem relevância maior no essencial do espírito de Abril.
No Público
de 26 de Novembro de 2000, Adelino Gomes perguntava: Quem desencadeou o 25 de
Novembro? Quem deu ordem aos páras para ocuparem quatro bases aéreas? Otelo traiu
os seus homens ou evitou a Guerra Civil? O PCP de que lado(s) esteve? Até onde
chegavam as ligações aos MDLP? Quantos grupos funcionaram dentro do Grupo dos
Nove? Qual foi a mais decisiva: a Região Militar do Norte (MN) ou a Região
Militar de Lisboa (RML)?; o Posto Avançado da Amadora, comandado pelo então
tenente-coronel Ramalho Eanes, ou o Posto de Comando Principal, montado em
Belém, e onde ficaram o Presidente Costa Gomes e o comandante da RML e Conselheiro
da Revolução, Vasco Lourenço? Quantos 25 de Novembro houve naquele dia? O 25 de
Novembro existiu?
Talvez
esta comemoração seja boa para homenagear o General Costa Gomes, que como
Presidente da República, que fruto de paciência, ponderação e habilidade, que
muitos chamavam de indecisão, evitou que a guerra civil se iniciasse com as
nefastas consequências. Era um tempo em que o Presidente da República não
falava de tamanhos de decotes, subia a coqueiros ou andava montado em
tartarugas gigantes. Um homem que foi quase defenestrado da história política
portuguesa, e que na realidade foi decisivo quando foi necessário sê-lo. Talvez
o Moedas queira homenagear o Almirante Rosa Coutinho e Almada Contreiras, entre
outros valorosos homens de Abril que foram ao Alfeite evitar a saída dos
fuzileiros, para evitar uma escalada de violência de contornos ainda hoje
impossíveis de imaginar. Será bom homenagear o Major Melo Antunes, que no dia
seguinte ao 25 de Novembro de 1975 veio à RTP serenar as pessoas e dizer que a
democracia constrói-se com todos. Talvez seja altura de fazer uma evocação aos
capitães de Abril de 1974 que já
faleceram e homenagear os que estão entre nós. E que se evite que a comemoração
do 25 de Novembro de 1975 seja o revanchismo, não contra os poucos perdedores
nesse dia, mas contra muitos dos vencedores dessa data tão pouco explicada!
Na
“Casa do Moedas” a 5 de Outubro de 2023 pedia-se um pouco mais a um Presidente
da Camara de Lisboa que ainda deve andar com sabores trocados depois de tanto anel cardinalício beijado numas
Jornadas Mundiais da Juventude, de que não temos contas nem resultados! O
habitual!
Albert
Camus no Mito de Sísifo: “Um homem é mais homem pelas coisas que cala do que
pelas coisas que diz”!
Fernando Pereira
8/10/2023