DESPORTO EM TRANSE
O recente afastamento da seleção
angolana de basquetebol dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em Agosto,
evidencia o estado caótico que o desporto de alta competição chegou, e a quase
letargia que se apoderou do desporto do País em geral.
Não há
propriamente uma falência da política desportiva, o que há é a situação absurda
de não haver politica desportiva visível por parte dos órgãos estatais
competentes, e todo o quadro federativo e associativo se depara com uma realidade pungente de falta
de perspetivas num futuro próximo.
O
futebol, modalidade de tomo, apesar do estapafúrdio investimento que se fez,
está num lugar perfeitamente ridículo (137ºlugar), contudo melhor que o ranking
da mortalidade infantil por mil habitantes onde ocupamos um “honroso” ultimo
lugar!
Malbaratado
que foi o edifício pacientemente construído há mais de trinta e cinco anos,
encontramos hoje na seleção feminina de andebol o único esteio de que nos
podemos orgulhar, nos areópagos internacionais do desporto de alta competição!
Escusamos
de buscar culpas externas, ou arranjar bodes expiatórios internos para
conseguirmos expiar as nossas debilidades e fraquezas postas sistematicamente a
nú.
A
educação física e o desporto são reflexo de um contexto politica, e o seu
quadro institucional e organizativo é suportado pela afirmação de uma linha
ideológica que se desejaria coerente. Infelizmente não é isso que acontece no
País onde se mistura um arremedo de socialismo com o capitalismo selvagem
acrescido de laivos de justicialismo, onde o cidadão deixou de ser o
destinatário das decisões políticas, passando a ser um mero instrumento em que
a sua vida piora entre o muito ou o menos que muito em função do preço do
barril de petróleo no mercado internacional.
Não podem
os responsáveis continuar a fazer declarações cheias de lugares comuns, que
eternizam situações de continuada falta de soluções, e que empurram o que resta
da educação física e desporto de Angola para um lodaçal, de onde dificilmente
se sairá nos próximos anos.
A
educação física escolar e a formação desportiva das crianças, adolescentes e
jovens são cada vez mais cerceadas pelas contingências da sociedade angolana
atual, acrescida à falta de instalações adequadas. Neste quadro o futuro do
desporto em Angola deixa de ter base de recrutamento e naturalmente é cada vez
mais difícil encontrar a qualidade que se consegue encontrar na quantidade
praticante.
Os
clubes, outrora lugares de eleição do associativismo, tornaram-se em espaços de
vaidades pessoais, que servem para a promoção de certas figuras num espaço
político onde a ascensão é cada vez menos por mérito e cada vez mais por
visibilidade determinada só por populismo!
Não vale
a pena a continuarmos a” bater” sempre no ministro ou nos vice-ministros do
Ministério da Juventude e Desportos, porque sendo os mais responsáveis não
estão sozinhos neste estado de putrefação a que chegou o desporto angolano. Há
mais gente responsável, entre dirigentes federativos, membros diretivos de
clubes, jornalistas, e cidadãos, que como eu, acompanham de perto a evolução do
desporto angolano desde o dealbar da independência.
Faltam
referências no desporto angolano, ou melhor falta dar visibilidade a pessoas
que foram referencia no desporto angolano, e que hoje se limitam a emitirem
opiniões em círculos privados, e a manifestarem profunda tristeza pelo rumo que
as coisas tomaram. Essa gente tem que ser recuperada, pois foram pessoas que
fizeram que Angola passasse a ser reconhecida com respeito na comunidade
desportiva internacional, e beneficiasse de uma visibilidade que noutros
setores dificilmente conseguiria.
Angola
tinha excelentes condições para ter pessoas a praticar desporto
continuadamente, porque tem uma população jovem, um clima propício a atividades
de ar livre e um passado de tradição na prática desportiva.
Há
necessidade de se fazerem novos enquadramentos, tomarem-se iniciativas e
apoiarem-se projetos que promovam a prática da educação física no âmbito da
recreação e do desporto federado. São necessários investimentos vultuosos, em
áreas tão díspares como a formação de quadros, e planos coerentes de educação
física nas escolas, onde terão de ser construídas infraestruturas adequadas a
uma participação significativa de alunos.
Os
clubes necessitarão de algum apoio, que não seja para responder ao imediatismo
dos resultados no plano da competição, para implementarem a formação, fazerem
captação, e promoverem a sua participação numa atividade federada ao nível de
todo o território.
Este
“edifício” exigirá organização e um esforço supletivo dos agentes políticos e
uma das primeiras exigências é que no executivo o desporto passe a ter um
estatuto de igualdade com os outros, e que não se fique apenas como necessidade
de preencherem lugares para estabelecer equilíbrios de “grupos de status”, ou
dar resposta às propostas comicieiras de alguns setores da estrutura
partidária.
A
educação física e o desporto não estão isolados na sociedade, e a sua evolução
ou a sua letargia dependem de um conjunto de fatores que tem a ver com a
situação dos cidadãos, já que dificilmente se conseguirá implementar o que quer
que seja, quando a míngua de produtos básicos se instala na generalidade da
população.
Tem que se começar a prospetivar
o futuro depois da falsa abastança que se viveu nestes últimos anos, e às vezes
até nem será mau montar-se um modelo organizativo num quadro de dificuldades, e
encontrarem-se recursos locais que contrariem a xenofilia dos tempos que
acabámos de percorrer.
O debate fica aberto e todos os
contributos serão recebidos com entusiasmo para que possamos mais cedo que
tarde voltar à senda de vitórias no desporto angolano.
Fernando Pereira
16/07/2016