28 de dezembro de 2012

Carta a Pedro Alexandrino da Cunha!/ Novo Jornal nº258/ Ágora / Luanda 28/12/2012




Uma das habituais partidas que se faziam aos que partiam para Luanda durante o ultimo quartel do seculo XIX e a primeira metade do seculo XX era a carta de recomendação para Pedro Alexandrino da Cunha.
Pedro Alexandrino da Cunha teve muito justificadamente direito à primeira estátua edificada nas colónias portuguesas, resultado de uma recolha de fundos entre os comerciantes de Luanda para homenagear o governador-geral de Angola entre 1845 e 1848. Entre outras coisas que marcaram indelevelmente a sua administração foi a regulamentação profícua de vários sectores da cidade, desde a recolha do lixo, á presença dos animais nas ruas, iluminação, horários do comércio e um sem número de posturas que tornaram a cidade com outra ordem e com um pouco mais de vida. Com a criação do “Boletim Official” passou a ser considerado o pioneiro da Imprensa Angolana.
Quando da deposição dos símbolos do colonialismo as estátuas foram justificadamente apeadas das suas peanhas, pois simbolizavam o fim de um tempo que se queria de mudança, levaram todas o mesmo destino exceção ao Monsenhor Alves Da Cunha, um misto de Rasputine, Calvino e Quirino de Jesus. Foram todas para a fortaleza, algumas sem justificação como a de Tomás Vieira Da Cruz, poeta nascido em Portugal que versejou a angolanidade como poucos e o caso do Pedro Alexandrino da Cunha que se elevava no meio de uns quiosques horríveis em frente ao renovado edifício da Estação Central dos Correios.
Nesse tempo todos os desembarcados de Portugal com os parcos haveres em malas de cartão andavam pelas portas do mar na busca incessante o Sr. Pedro Alexandrino da Cunha. As portas do mar eram precisamente no largo fronteiro aos CTT, onde uns gasolinas faziam o desembarque de pessoas e bens para os navios que ficavam fundeados no meio da baia de Luanda.
O luandense com a sua prosápia de gozação permanente ia dizendo aos “desembarcados” que “esperassem por ali que ele não demoraria”, que “devia ter ido lá cima tratar de alguma coisa” apontando para a peanha, “Era um homem muito ocupado com as pombas”, “Gostava de ver os flamingos”, na realidade era um verdadeiro gozo o que faziam às gentes que vinham de Portugal no sonho de uma terra onde tudo sairia rico, chefes de qualquer coisa, e tudo o que os 18 dias de viagem ajudavam a alimentar ao muito que se ouvia nas aldeias do pobre interior de Portugal dominado pela padralhada e pelo caciquismo.
Era o primeiro contacto com a terra, e alguns ainda pagaram dos seus magros haveres a uns maduros para conseguirem chegar à fala com o Sr. Alexandrino, que objectivamente ninguém sabia o que fazia, mas pela forma como contaram e a forma como falavam em Luanda tinha que ser alguém poderosamente rico.
A alguns sortudos mostravam logo quem era o Pedro Alexandrino da Silva, e a deceção era a que se imagina, mas imaginem os requintes de malvadez que havia quando lhes diziam que só no dia seguinte podiam ser recebidos e ei-los a ser levados para tugúrios em pátios de comerciantes para passarem a noite. Esses espaços foram durante seculos lugares de “armazenamento” de escravos para depois serem enviados para S. Tomé, Brasil e América Central.
Quando se davam conta do logro, era o bom e o bonito, mas também quem chegava não lhe apetecia ser gozado e acabava por engolir em seco e esperar a oportunidade de fazer a outro o que lhe tinha sido feito.
Com a inauguração do cais acostável no início dos anos 50, a carta a Alexandrino caiu em desuso e ainda foi tentada uma carta a Diogo Cão, que tinha uma estátua de um mau gosto que rivaliza com algumas que os norte-coreanos “plantaram “ um pouco por toda a Angola, mas como era uma figura mais conhecida não permitiu as “patifarias” que durante anos encheram o anedotário da pacata urbe.
Havia ao tempo um comboio que fazia a ligação entre os cais das colunas e a estação de caminho-de-ferro do Bungo, e que corria quase toda a marginal. Também terá havido uma fracassada tentativa de copiar as praias europeias que tinham uns pequenos comboios para levarem os banhistas às praias, mas esse “comboio bébé” que fazia o percurso entre a ermida da Nazaré e a Igreja do Cabo, teve uma efémera existência, apesar da tentativa de o fazer chegar à Praia do Bispo, onde hoje está a ser construída uma imitadela mista de Yamoussoukro e aquela enormidade Ceausescada de Bucareste.
Se não nos virmos antes, um Bom 2013, e pede-se aos portugueses expatriados recentemente que façam chegar a carta ao Pedo Alrexandrino da Cunha, e não andarem a dizer em todo o lado que em Angola só há corruptos! Primeiro porque não é verdade e depois porque não é correto para quem lhes dá trabalhinho. Só isto!
Uma nota de rodapé: Já não é a primeira vez que peço que coloquem lá a estátua, repito o pedido em época festiva. Façam de conta que é uma homenagem ao Campeonato do Mundo de Hóquei em Patins!

Fernando Pereira
17/12/2012
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