9 de maio de 2008

125 anos de José de Cluny /Novo Jornal/ 9 de Maio de 2008




Em Janeiro de 1883, aportaram a Landana, as primeiras religiosas das irmãs da Congregação das Irmãs de S. José de Cluny.
Foi o princípio de uma presença continuada de 125 anos de uma Congregação, iniciada em França, mais propriamente em 11 de Novembro de 1789, na esteira da vitória dos republicanos e jacobinos na revolução francesa.
A história da fundação desta Ordem, tem origem precisamente num episódio, relacionado com uma pretensa perseguição a membros do clero por parte dos republicanos franceses, o que leva a que a bretã Ana Maria Javouey, tenha feito voto para se dedicar ao missionarismo, tendo sido a sua primeira Madre Superiora.
Segundo o professor Martins dos Santos no seu excelente trabalho “Cultura, Educação e Ensino em Angola” diz a páginas tantas “No dia 15 de Maio de 1885, embarcaram em Lisboa, com destino a Angola, a bordo do vapor África, três religiosas de S. José de Cluny, que nos aparecem no documentos da época sob a designação de Irmãs Educadoras, por se dedicarem especialmente à obra educativa e às actividades escolares. Destinavam-se às colónias do planalto sul. O governador do distrito de Moçâmedes, Sebastião Nunes da Mata, empregou toda a sua influência para as reter na cidade, demovendo-as de se transferirem para o interior. Conseguiu os seus intentos e as religiosas estabeleceram-se ali, abrindo pouco depois a sua primeira escola. Segundo certas indicações que conseguimos obter, foi no dia 8 de Julho desse ano de 1885 que se fixaram em Moçâmedes. Foi a primeira povoação angolana a aproveitar-se da meritória acção das Irmãs Educadoras, se exceptuarmos a missão de Lândana, onde se estabeleceram em 1883, portanto dois anos mais cedo.”
Ainda se podia ler mais: “ No decorrer de 1897, chegaram a Angola algumas religiosas de S. José de Cluny, que se destinavam a Moçâmedes. O governador-geral António Duarte Ramada Curto, com o apoio de outros elementos de influência na cidade, instou com elas para se fixarem em Luanda. Desejava que abrissem uma escola, o que efectivamente fizeram; começou a funcionar no dia 1 de Dezembro desse ano, na Rua da Misericórdia.”
“Ainda a propósito dos referidos exames, o governador-geral Ramada Curto louvou, por portaria de 16 de Maio de 1900, as Irmãs Educadoras, nos termos seguintes: "Tendo eu confiado, em Dezembro de 1897, às Irmãs Educadoras, da Congregação de S. José de Cluny, a regência da cadeira de ensino primário, do sexo feminino, da cidade de Luanda, fechada por falta de alunas, e tendo presenciado o aumento sempre crescente do número de crianças matriculadas, vistas as informações prestadas com respeito à competência das professoras e aproveitamento das alunas, hei por conveniente louvar as Irmãs Educadoras, da referida congregação, que têm regido a escola, e em especial a superiora, Ir. Antónia Maria George, pelo zelo, competência e inteligência que têm demonstrado na regência da escola que lhes confiei". As Irmãs Educadoras agrupavam os seus alunos em cinco classes, conforme o seu adiantamento escolar. Por curiosidade, inserimos aqui o esquema do estudo ministrado: —Leitura, escrita e rudimentos de doutrina cristã; —Prática de ler, escrever e contar, e doutrina cristã; —Ler, escrever e contar, doutrina cristã e trabalhos manuais; —Gramática portuguesa, tabuada, aritmética, doutrina cristã e trabalhos manuais.”
Esta foi de uma forma sintética a relação das “madres” com a educação em Angola até à assinatura da Concordata de 10 de Julho de 1940, entre Portugal e a Santa Sé, onde se anexava o Acordo Missionário, que deu à Igreja Católica todas as facilidades e mordomias várias no ensino nas colónias, em detrimento de muitas outras confissões religiosas que ao tempo já trabalhavam na colónia, com algum empenho, tendo algumas sido perseguidas e os seus pastores e missionários presos ou expulsos dos territórios.
No fim dos anos 40, tendo em conta a exiguidade das instalações na Misericórdia, e com grande empenhamento do Monsenhor Alves da Cunha (aproveito para lembrar que parte das letras da peanha da sua estátua caíram, pelo que não seria mau que fossem lá colocadas de novo), foi-lhes dado um terreno na Rua do Kafako, que é nem mais nem menos que o nome muito antigo da rua que desemboca na Rua da Missão.
Ali se construiu um edifício de gosto revivalista-classizante, exemplar de “Arquitectura do Estado Novo”, vulgarmente conhecida pelo gosto “Português Suave”, que dada a sua volumetria, os seus portais, arcadas, frontões, torreões e pináculos é um edifício marcadamente matizado na paisagem urbana.
Desde 1953 até 1975, no colégio de S. José de Cluny em Luanda leccionou-se a raparigas desde a instrução primária até ao 5º ano do liceu, como era costume dizer-se ao tempo, em regime de externato, havendo também algumas alunas internas.
Esse edifício, que foi a seguir à Independência do País o Instituto Pré-Universitário de Luanda, foi entregue à Igreja Católica, aquando dos acordos entre o governo e o Papa Woityla, na sua passagem por Luanda no início dos anos 90.
Desse acordo, surgiu a possibilidade da instalação da Universidade Católica no edifício que sofreu para o efeito inúmeras obras de reparação e beneficiação.
No Huambo também foi criado no fim dos anos 50 um colégio com as características do de Luanda, também orientado pelas” irmãs de Cluny”, que para além destes colégios mais emblemáticos, tinham outros espalhados pelo território de Angola, como por exemplo em Cabinda, Namibe e Malange.
Muitas alunas passaram pelos colégios e internatos da “Congregação das Irmãs de S. José de Cluny”, o que não deixa de ser relevante em trabalhos futuros que se façam sobre o ensino em Angola, pois a sua presença durante 125 anos, perpetuou uma obra que merece cuidado respeito.

Fernando Pereira
7/05/07

Dar Asas à Memória IV/ Ágora/ Novo Jornal/ 9 de Maio 2008






Dar Asas à memória (IV)

É claro que no meio destes hotéis dos anos 50, ainda temos o “eterno” Hotel Globo, que convenhamos é um nome muito esquisito, e se bem me lembro do logótipo é a tromba de um elefante a pegar num globo, numa imitação afro-colonial do “Grande Ditador “ do Charlie Chaplin. O “Hotel Europa”, um nome muito adaptado à realidade(???), e que fica em frente ao Hotel Continental, e que era o hotel preferido das primeiras núpcias dos colonos que casavam por correspondência, e recebiam cada encomenda que alguém com comenda se queria livrar na “santa terrinha”; O bar no andar de baixo era o “arame farpado afiadíssimo” de tudo o que se passava na recepção, e convenhamos que as conversas não deviam ser sobre estética de poesia.
Havia ainda o Hotel Paris, que de hotel talvez tivesse apenas o nome e uma casa de banho privativa para o primeiro hóspede de dez quartos que a ocupasse, e que curiosamente é quase paredes meias com o Hotel Central, que rivalizava em qualidade. O Hotel Luso, que era uma casa cor de rosa engraçada , ali perto do Largo das Ingombotas, o Hotel Magestic, que era ali para os lados de S. Paulo e tinha muitas “limusines”de 15 toneladas à porta desde Pegasos, Bedfords, MANs,Fargos, Volvos, Mercedes, enfim muita “traseira” com encerado, e que tinha uma cervejaria anexa que era um local de grandes disputas de encanadores de “canhangulos”, uma medida de cerveja só disponível para os futuros “companheiros da cirrose”
Timidamente e com alguma “decência” lá foi aparecendo o Turismo e depois o Continental, mas isso já foi mais nos sessentas.
Este artigo é engraçado, começou com o aterrar no “Aeródromo Emílio de Carvalho” e no levantar no projecto do Keil do Amaral e do Simões de Carvalho do que foi o “Aeroporto Craveiro Lopes”, com um painel notável do Neves de Sousa no seu interior, e que é hoje o “Aeroporto 4 de Fevereiro”, com outro movimento, com outras gentes, com outros aviões, com outros pensares, mas às vezes com as mesmas ambições, o que é preocupante.
Como digo no início desta série de artigos, eu não conheci muitas destas coisas que falo com vida, mas ouvi e fui apreendendo. Quando passo nos locais, olho para as que ainda vão subsistindo, e lembro-me do que me foi contado sobre uma cidade, e vem-me à memória a saudade de um determinado futuro, que não passasse por deitar abaixo estruturas que foram poiso de outros ócios e outros negócios, mas que ainda fazem a alma da cidade a alguns.

Fernando Pereira 8/04/08
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