9 de maio de 2007

Este texto não é meu...É da Isabela (clique em cima )


As beatas da minha rua




Ouço sem querer as conversas das beatas que passam por mim a caminho da missa das onze, sozinhas ou em grupo, ruminando, enojando-se das cadelas, tendo muito medo que lhes esfacelem a cara e uma orelha; "os cães que se caguem" ou "merda para os cães" dizem, comentam com as outras, muito indignadas, todas enfarpeladas com fato de saia e casaco, e sapato de bico; e continuam devassando a vida da Almerinda, que é uma porca, e a da Angelina, por quem fizeram tudo e nada receberam, e o Eduardo, que não larga o vício, e os filhos já vão pelo mesmo caminho; os costumes das próprias famílias, uma chusma de mal agradecidos. Tudo está mal, tudo é mau e sujo e vicioso excepto o senhor padre, tão lavadinho, e o corpo de Cristo que se regalam de receber no seu.
Dou comigo a pensar que Deus Nosso Senhor havia de preferir que as beatas não frequentassem à missa, e que fossem umas reais porcas, umas incorrigíveis ingratas, umas viciadas e viciosas sem remissão, enfim, umas perdidas, como aquelas em cuja casaca vão tesourando a caminho da missa. Deus haveria de preferir que fossem cadelas como as minhas, que tanto as enojam. Se fossem cadelas, Deus abençoá-las-ia mesmo sem oração, por não haver nelas mancha de pecado. Haviam de roubar uns ossos do caixote do lixo, mijar no tapete de vez em quando, havia de ser uma luta para as meter na banheira, tirando isso, umas santas!
Mas o pior seria o senhor padre, que não aceitaria abençoar cães, nem pregar para eles nem dar-lhes a comunhão, por não estar habituado a pastorear rebanho tão puro. Contudo, se o senhor padre pregasse para os cães, oh, haveria de pregar muito mais certo!


Publicada por Isabela

8 de maio de 2007

Entre em Sena quem é de Jorge de Sena




A talhe de foice...
Jorge de Sena observou um dia: "O nosso mal, entre nós, não é sabermos pouco; é estarmos todos convencidos de que sabemos muito. Não é sermos pouco inteligentes; é andarmos convencidos que o somos muito".



Engenheiro civil e escritor de fim-de-semana, primeiro, depois no exílio voluntário, professor na área das humanidades e escritor a tempo inteiro. Como tantos outros, recusou viver numa sacristia de 92.391 Km2. Abdicou de viver numa pátria povoada de sombrios contentinhos suficientemente «reaccionários» e suficientemente «dos nossos». Partiu com apoquentação de não poder pensar e dizer livremente. Leccionou, escreveu muito, imenso e fabulosamente. Viveu nos Estados Unidos até ao epilogo de 1978.
Homem atento, conheceu e pensou maduramente os americanos. A talhe de foice roubo-lhe um poema lucidamente recidivo.

Ray Charles

Cego e negro, quem mais americano?
Com drogas, mulheres e pederastas,
a esposa e os filhos, rouco e gutural,
canta em grasnidos suaves pelo mundo
a doce escravidão do dólar e da vida.

Na voz, há sangue de presidentes assassinados,
as bofetadas e o chicote, os desembarques
de «marines» na China ou no Caribe, a Aliança
para o Progresso da Coreia e do Viet-Nam,
e o plasma sanguíneo com etiquetas de blak e white
por causa das confusões.
E há as Filhas da Liberdade, todas virgens e córneas,
de lunetas. E o assalto ao México e às Filipinas,
e a mística do povo eleito por Jeová e por Calvino
para instituir o Fundo Monetário dos brancos e dos louros,
a cadeira eléctrica, e a câmara de gás. Será que ele sabe?

Os corais melosos e castrados titirilam contracantos
ao canto que ele canta em sábias agonias
aprendidas pelos avós ao peso do algodão.
É cego como todos os que cegaram nas notícias da United Press,
nos programas de televisão, nos filmes de Holywood,
nos discursos dos políticos cheirando a Aqua Velva e a petróleo,
nos relatórios das comissões parlamentares de inquérito,
e da CIA, do FBI, ou da polícia de Dallas.
E é negro por fora como isso por dentro.

Cego e negro, uivando ricamente
(enquanto as cidades ardem e os «snipers» crepitam»
sob a chuva de dólares e drogas
as dores da vida ao som da bateria,
quem mais americano?

Jorge de Sena
1964

Portugal foi governado pela demência durante quase quarenta anos...Um rato de sacristia,com uma governanta e com galinheiro no quintal, marcou a mentalidade de gerações,que de certa forma se perpetuam no tempo...Em Angola e em Portugal temos os resquícios mentais e materiais do que foi a insanidade de tanta letargia e água benta na resolução dos problemas políticos...Num século, quarenta anos de governo intolerante, num que já era atrasado em relação à Europa, deixou marcas profundas na sociedade e nas pessoas...Ainda hoje o recurso ao padre para inaugurar o que quer que seja em estados laicos, surpreende...é essa uma herança a todos os títulos má...Mas isso sucede em Portugal e em Angola...Vou dar um pequeno exemplo!!
Em 2000 inaugurou-se em Benguela a clínica de S. Filipe,a 1ª unidade privada da província, construída de raiz,bem equipada, etc.,etc. Eu era um dos proprietários e um dos animadores do projecto, e aquando da inauguração os meus sócios quase que me "exigiram" que o bispo fosse a figura quase central da inauguração...
Eu barafustei, mas fui vencido na discussão, e no dia da inauguração lá veio o bispo de Benguela e o acólito fazer as suas récitas e a aspergir o báculo sobre todas as divisões da clínica...eu só recomendei que ele deitasse a água benta ... (impublicável)
Como se vê esta velha prática fica perpetuada no tempo..e mantemos a política da ratice de sacristia nas práticas...em Estados laicos e de tolerância religiosa
Fernando Pereira

Ainda diziam que o tipo não gostava de mulheres! Coitadas delas!





Poesia satírica de Fernando Pessoa
sobre Salazar

António de Oliveira Salazar
Três nomes em sequência regular...
António é António.
Oliveira é uma árvore.
Salazar é só apelido.
Até aí está bem.
O que não faz sentido
É o sentido que tudo isto tem.

.......................

Este senhor Salazar
É feito de sal e azar.
Se um dia chove,
A água dissolve
O sal,
E sob o céu
Fica só azar, é natural.
Oh, c'os diabos!
Parece que já choveu...

........................

Coitadinho
Do tiraninho!
Não bebe vinho.
Nem sequer sozinho...

Bebe a verdade
E a liberdade.
E com tal agrado
Que já começam
A escassear no mercado.

Coitadinho
Do tiraninho!
O meu vizinho
Está na Guiné
E o meu padrinho
No Limoeiro
Aqui ao pé.
Mas ninguém sabe porquê.

Mas enfim é
Certo e certeiro
Que isto consola
E nos dá fé.
Que o coitadinho
Do tiraninho
Não bebe vinho,
Nem até
Café.

1935

Atrás de tempos vem tempos e outros tempos hão-de vir!



Recordo hoje, aqui e agora os tempos em que a então jovem Republica Popular de Angola não tinha em Portugal uma embaixada, fruto das "mixordices" de Soares e apaniguados, muito dedicados aos valores democráticos da musculada democracia da Jamba.
Nesses tempos um punhado de gente, ia mantendo a trabalhar um "Comité Coordenador do MPLA para a Europa", ali num andarzinho na Luciano Cordeiro, por cima do "Clube das Donas de Casa" e do famigerado "Elefante Branco"...e ironicamente em frente ao jornal "O Retornado". Foi aí que ainda conseguimos recolher algumas coisas subtraídas à CODECO (uma bosta que queria dizer: Comités de Defesa da Civilização Ocidental)destruiu num acto vil, as instalações da Casa de Angola, e que fez explodir uma bomba na Embaixada de Cuba (ao tempo num prédio na Fontes Pereira de Melo), onde morreram dois diplomatas, e que nunca foram julgados por ninguém.
Desse grupo de gente do "Comité Coordenador do MPLA para a Europa", recordo com saudade o Dr. Arménio Ferreira, o Adriano Correia de Oliveira, o Pitra, a Lili, o Pombeiro (que ainda vou vendo pela TAAG), o Artur Queiroz, o Mário e tantos outros que fomos resistindo quanto se podia à sanha revanchista dos colonialistas que iam pululando nas imediações.
Aqui fica este testemunho, com um conjunto de autocolantes que foram desse tempo em que a palavra Luta, Militância e Solidariedade tinham um valor enormérrimamente elevado e compartilhado
Fernando Pereira
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