ABRIL SEMPRE DENTRO
DE NÓS
Grândola, vila morena
Terra da fraternidade
O povo é quem mais ordena
Dentro de ti, ó cidade
José Afonso
Foi esta
a senha que deu início às movimentações militares que mudaram tudo, que há
muito esperava uma sapatada definitiva.
Atolado
em três frentes de combate, com os empresários a exigirem a integração europeia
em detrimento do atávico mercado colonial, assoberbado pela fuga desenfreada de
trabalhadores para uma Europa onde se lidava com a reconstrução dos Países devastados
da 2ª Guerra mundial, a braços com uma
crescente multiplicação de greves, lutas estudantis e com a oposição ao regime
a florescer nas classes sociais que o tinham apoiado até então , era por demais
evidente que se esperava o rápido estertor do regime que há 48 anos governava
Portugal e colónias.
O 25 de
Abril de 1974 foi a vontade de uns valorosos, ajudados pelas circunstâncias e encontraram
o modelo corporativista-colonial em estado de prostração final.
Há
quarenta e dois anos vivia em Coimbra e preparava-me para ingressar na Universidade,
e naturalmente avultava o receio de mais cedo que tarde ser mobilizado para a
guerra colonial. A minha posição era partilhada por muitos colegas portugueses,
que à surdina iam dizendo que quando chegasse a altura “davam o salto”! Poucos
dos que iriam à “inspeção” esse ano estavam dispostos a defender “a fé e o
Império”, que mais não eram que os Espírito Santo, Fonsecas e Burnay, Mellos,
Champalimaud, Quina, Feiteira-Bordalo, Vinhas, Abecassis, Sousa Lara e as suas
componentes locais Mota Veiga, Mota & Irmão, Herdeiros de Mário Cunha e
outros. Como diria muitos anos antes Alexandre O’Neill: “Portugal, o meu
remorso de todos nós”!
O”
Império Português” que como dizia C. R. Boxer era “essencialmente, uma talassocracia,
um império marítimo e comercial (…) vazado em molde militar e eclesiástico”,
estava-se a preparar para restar encaixotado, por ironia do destino, no mesmo
local onde os achadores portugueses partiam “navegando desenhavam os mapas que
não tinham”, como dizia Sophia de Mello Breyner Anderson.
Durante
muitos anos fui discutindo com compatriotas angolanos a importância do 25 de
Abril de 1974 em Angola. Talvez pelo facto de o ter vivido a cada minuto com
grande entusiamo, nos locais onde “se construiu a democracia”, tenha uma
relação militantemente afetiva com o Movimento das Forças Armadas, e confesso
que me custa aceitar que haja pessoas angolanas com responsabilidade e já
homens feitos ao tempo queminimizem a importância do golpe de estado de Abril em
Portugal e os reflexos que isso teve na libertação dos povos sob dominação
colonial.
O 25 de
Abril de 1974 foi sempre olhado em Angola como uma data estranha no contexto
das efemérides externas que os angolanos vão dando enfase! “Isso é uma data dos
portugueses”, “Se não fossem os movimentos de libertação o 25 de Abril nunca
teria acontecido”, “Que ganharam os angolanos com o 25 de Abril?”, e outros
dislates que normalmente surgem quando se fala do Movimento das Forças Armadas.
O 25 de
Abril de 1974 não surgiu da vontade de um punhado de militares, apareceu num
contexto, e naturalmente que quando eles corporizaram o golpe o fim da guerra
colonial era um dos objetivos principais. Foi depois um corolário de
movimentações, de gente das mais variadas profissões, de um amplo espectro
político que obrigaram a tomarem-se certas decisões em relação às colónias,
diferentes das que alguns se propunham perpetuar de outras formas.
Nós
enquanto angolanos devemos ter orgulho no 25 de Abril, porque foi uma luta
comum, que afinal surtiu em objetivos comuns nomeadamente a Independência de
Angola em Novembro de 1975.
Posso
entender que o meu entusiasmo pelo 25 de Abril de 1974 seja olhado de forma
indiferente pelas gerações mais novas, por exemplo a da minha filha, visto da
mesma forma como eu olhava atónito o entusiasmo do meu avô a falar da Republica
ou até do meu pai na sua participação na campanha presidencial de Norton de
Matos, que lhe valeu o despedimento da Sociedade Agrícola do Cassequel na vila da Catumbela!
Mas
tenha-se em atenção que este esquecimento, justificado, das gerações do 25 de
Abril de 1974, é o mesmo que gerações tem da luta de libertação e da batalha do
Kuito-Kanavale. Estou a falar de gente jovem mas já politicamente enquadrada, e
inseridas no atual tecido económico e social angolano Deixemo-nos de
romantismos serôdios, porque Savimbi já morreu há doze anos, e pelos números do
censo recentemente divulgado 46% da população tinha entre 10 a 12 anos, quando
isso aconteceu, por isso já nada lhe começam a dizer essas “batalhas do
antanho”!
Hoje
como ontem e como amanhã espero comemorar o 25 de Abril de 1974, talvez com
cada vez menos gente que esteve comigo por razões de desaparecimento físico de
gerações.
Como
diria José Gomes Ferreira, esse tão esquecido poeta português: Tenho “saudades
de não poder inventar o futuro”.
Fernando Pereira
20/4/2015
3 comentários:
As pessoas não menosprezam o 25 de Abril, menosprezam o 26 do mesmo mês e ano.
Claro os Espíritos Santos e os Melos, e os dos Santos angolanos, estão todos na maior.
Realmente escrever sobre as coisas boas do 25 de Abril ai tem muito que se lhe diga. Devia estar era aqui a usufruir dessas conquistas, o estado lastimável em que o pais está viva!!! Venha cá viva cá!!!
O 25 de Abril de 1974 é o culpado da situação em Angola??? Já agora, quando fala da China ou dos EUA deixa de se ter legitimidade por não se viver lá.Eu ainda posso viver onde me apetecer apesar de ser cidadão angolano!
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